Temer por um fio

A bomba, assinada pelo jornalista Lauro Jardim com apoio de seu adjunto, Guilherme Amado, foi publicada no site do diário carioca O Globo ontem, no fim da tarde. Joesley Batista, presidente do grupo JBS, gravou o presidente da República, Michel Temer, pedindo que mantivesse o pagamento de uma mesada para que o ex-deputado Eduardo Cunha ficasse em silêncio. Batista tinha um gravador ligado no bolso do paletó quando se encontrou com Temer, no Palácio do Jaburu. Ao presidente explicou que vinha pagando a Cunha e a seu braço direito, Lúcio Funaro. “Tem que manter isso, viu?”, respondeu-lhe Temer. A gravação faz parte da delação premiada da JBS. Tanto Ministério Público quanto o Supremo estavam avisados dos movimentos do empresário. Além da conversa sobre Cunha, Batista perguntou ao presidente com quem resolver uma pendência de sua holding com o governo. “Fale com o Rodrigo”, ouviu, numa referência ao deputado peemedebista Rodrigo Rocha Lourdes. “Posso falar tudo com ele?”, insistiu o interlocutor do presidente. “Tudo.” Posteriormente, o parlamentar foi filmado pela Polícia Federal, numa pizzaria da rua Pamplona, em São Paulo, recebendo uma mala de R$ 500 mil, referentes à primeira parcela semanal do suborno acordado. O valor combinado é de inacreditáveis R$ 480 milhões, divididos em 20 anos, em troca da resolução de um problema no Cade.

Um dos ministros que participaram de uma longa reunião com Temer, no Planalto, disse que a intenção do presidente é de “ir à luta”, informa Jorge Bastos Moreno. “Renúncia nem pensar.” Temer, diz o ministro, “quer ver a fita”. Em nota oficial, o Palácio nega tudo. “O presidente Michel Temer jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha. O encontro com o empresário Joesley Batista ocorreu no começo de março mas não houve no diálogo nada que comprometesse a conduta do presidente.”

Falta ouvir a fita. A partir daí, há três caminhos para que Temer deixe a presidência: renúncia, cassação pelo TSE ou, o mais lento, impeachment. Ontem mesmo, o deputado carioca Alessandro Molon (Rede) protocolou pedido de abertura do processo de impedimento. O primeiro na linha sucessória é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, seguido pelo do Senado, Eunício de Oliveira e, então, a do Supremo, Cármen Lúcia. Ocupariam o cargo temporariamente. Segundo a Constituição, segue-se uma eleição indireta, feita pelo Congresso, para definir alguém que presida o país até o fim do mandato, em 2018. Já há parlamentares, casos do senador Ronaldo Caiado e do deputado Miro Teixeira, que cobram a antecipação das eleições diretas. Ontem, havia sinais claros de ruptura na base do governo. Segundo o repórter Gerson Camarotti, pedidos de renúncia partindo de aliados do núcleo duro começaram a chegar ao Planalto durante a noite. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o peemedebista Rodrigo Pacheco, pode colocar esta semana em pauta a PEC para convocação de eleições diretas, diz o Estadão.

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Se Temer é econômico nas palavras ao tratar de propina, o senador tucano Aécio Neves fala abertamente. Ou, nas palavras do comentarista Merval Pereira no Jornal das Dez da GloboNews, “fala com linguajar de mafioso.” O presidente do PSDB também foi gravado em áudio por Joesley Batista. O empresário foi procurado pela irmã do ex-governador mineiro, Andréa Neves, via WhatsApp. Depois, encontrou-se pessoalmente com Aécio no Hotel Unique, em São Paulo. O senador pediu R$ 2 milhões para pagar seu advogado na Lava Jato. Aí combinaram como o dinheiro seria entregue. “Se for você a pegar em mãos, vou eu mesmo entregar. Mas, se você mandar alguém de sua confiança, mando alguém da minha confiança”, disse Joesley. “Tem que ser um que a gente mata ele antes de fazer delação. Vai ser o Fred com um cara seu. Vamos combinar o Fred com um cara seu porque ele sai de lá e vai no cara. E você vai me dar uma ajuda do caralho”, respondeu Aécio. Trata-se de seu primo, Frederico Pacheco de Medeiros. Um dos delatores da JBS, o executivo Ricardo Saud, levou o dinheiro a Medeiros em quatro remessas. Todas foram filmadas pela Polícia Federal. A Procuradoria Geral da República informou ao ministro Edson Fachin que o dinheiro não foi passado a nenhum advogado, e sim entregue a Mendherson Souza Lima, secretário do senador mineiro Zezé Perrella. (Globo)

Agora de manhã, a Polícia Federal iniciou uma operação de busca e apreensão nas casas de Aécio, no Rio, Belo Horizonte e Brasília. (Globo)

Mônica Bergamo informa que Aécio provavelmente reconhecerá ter feito o pedido. “Ele deve afirmar que solicitou os recursos para pagar dívidas e que se trata de um negócio privado, sem contrapartidas nem tentativa de obstrução da Justiça.” (Folha)

A delação premiada da JBS sobra até para o PT. Segundo Batista, neófito que era em política, teve em Antonio Palocci seu professor no período de governo Lula. E o ex-ministro Guido Mantega foi seu intermediário para discussão de propinas. (Globo)

Alan Gripp: “É inevitável pensar que, no mínimo, deu um nó no cérebro daqueles que casuisticamente insistem em atribuir à Lava Jato o papel de algoz do petismo. Ao completar o álbum de figurinhas da política, pode-se dizer com segurança que promoveu uma reforma ética que não estava na agenda brasileira. A Lava Jato não tem cor, não tem time, não tem controle possível. Alguém duvida ou precisa desenhar?” (Globo)

Bernardo Mello Franco: “Um dos líderes mais impopulares da história do Brasil, Temer se sustentou até aqui com apoio do mercado e do empresariado, que viram nele um aliado capaz de aprovar reformas igualmente impopulares. Se ficar claro que o presidente perdeu as condições de cumprir a tarefa, ele tende a ser abandonado com rapidez.” (Folha)

José Roberto de Toledo: Agora que foi dada a largada, Lula sai como principal nome na disputa presidencial e as delações da JBS o ajudam. Tem, de acordo com o Ibope, 19% de eleitores que votam nele e mais ninguém. Seu principal adversário pode ser João Doria, que abre espaço rapidamente entre os tucanos. Ainda assim, Jair Bolsonaro se mostra um nome relevante, com 7% de intenções de voto espontâneas, em geral partindo de jovens com “nostalgia idealizada da ditadura”. (Estadão)

Míriam Leitão: “O mercado hoje terá um dia de estresse agudo, porque tudo o que estava estabelecido no cenário, como a aprovação das reformas, cai em absoluta incerteza.” (Globo)

Lydia Medeiros: “O mercado financeiro estava morno ontem, com avaliações positivas sobre a aprovação das reformas. Mas, no fechamento, viu-se que a JBS comprou dólares em grandes quantidades. Agora sabe-se a razão.”

Enquanto isso, nos EUA... Robert Mueller, ex-diretor do FBI, foi indicado pelo Departamento de Justiça como promotor especial que investigará o envolvimento da campanha de Donald Trump com a Rússia. (NYT)

No Congresso, republicanos cansados das trapalhadas de seu presidente, já começam a pensar num governo de seu vice, Mike Pence.

Cultura

Cinema e streaming se encontraram no mais famoso festival do mundo. Foi o elegante cinema, dono da festa, aliás, quem convidou o streaming, o jovem bem-sucedido do momento. O clima cordial durou pouco: os “amigos” do cinema (distribuidores de filmes) quiseram botar o streaming para fora, o anfitrião botou panos quentes, mas aí a briga já tinha virado o assunto do momento. A Folha conta como Cannes lida com a crise em pleno festival e como a Netflix, dona de US$ 6 bilhões, vem causando por onde passa, desde o Oscar até as repartições públicas brasileiras.

A querela respingou até em Almodóvar, o delirante cineasta espanhol que, por presidente do júri de Cannes, teve de tomar partido - do cinema, claro: “Enquanto eu for vivo, lutarei pela capacidade de hipnose da tela grande”.

A briga boa: uma lista com os 19 filmes que disputam a Palma de Ouro em Cannes.

Enquanto isso, nas livrarias… A vida continua dura. Segundo o Globo, o faturamento  do mercado editorial foi o menor desde 2006. A indústria do livro encolheu 5,2% no ano passado.

Jimmy Fallon era “o” cara da TV americana - até a eleição de Trump. As piadas autodepreciativas de seu The Tonight Show tiveram de ser mais politizadas e, ainda assim, o público trocou seu amor pelo de Stephen Colbert e seu The Late Show. Piorou quando Fallon entrevistou Trump e caiu na tentação (quem não?) de tocar o cabelo do presidente, dando à entrevista um tom relaxado (e inapropriado). O New York Times narra a história de Fallon e a de como a política invadiu os talk shows da TV americana.

Viver

A Anvisa aprovou o primeiro teste de farmácia para o HIV. O mecanismo é simples, semelhante ao dos testes que medem a glicose em diabéticos, por exemplo. Gotas de sangue são coletadas e postas em contato com reagente. O resultado sai em 20 minutos, conta o Estadão. A aprovação, claro, é só um primeiro passo, mas estima-se que, em três meses, o teste chegue às farmácias.

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É oficial: os sedentários são maioria no país. Segundo pesquisa do IBGE divulgada ontem, 76% dos brasileiros não praticaram esportes ao longo de 2015. São 100,5 milhões de pessoas. O principal motivo é a boa e velha falta de tempo, com 38,2% das respostas, seguido pelo sincero “não gosto ou não quero” (35%). (Globo)    

A maconha entrou para a lista de plantas medicinais no Brasil. É um feito importante, por se tratar de índice (da Anvisa) que baliza pacientes, médicos e a indústria farmacêutica. Exemplo: para elaborar um medicamento, uma empresa deve checar, nesta lista, se estão registradas lá as substâncias de que precisa. O reconhecimento, porém, não muda as regras para o uso medicinal da maconha no país, que ainda carece de autorização prévia, caso a caso. (Folha)

Galeria: Bairro do Brooklyn com praias e parque de diversões, Coney Island era uma festa - ao menos nos anos 1940 e 1950. O fotógrafo Harold Feinstein, à época, registrou a gente bonita e o clima de paquera que reinavam por lá. Seus cliques de pessoas e cenas comuns, aliás, contribuíram para o boom da chamada street photography nos EUA.

Cotidiano Digital

Um malware ainda mais virulento que o WannaCry, responsável pela infecção de dezenas de milhares de computadores na última sexta-feira, está se espalhando rapidamente. O vírus é chamado Adylkuzz, se aproveita da mesma vulnerabilidade do Windows, mas não tira acesso ao computador. Adylkuzz se instala e usa a capacidade de processamento da máquina hospedeira para ‘mineirar’ bitcoins, moedas digitais, na internet. O principal sintoma é de lentidão repentina no computador ou servidor.

Caso não tenha feito, faça o update de seu Windows.

A Google anunciou algumas novidades, ontem, na conferência para desenvolvedores. A mais relevante é que seu assistente digital, já presente nos celulares Android de ponta, agora é capaz de reconhecer pela câmera o ambiente em volta. Aponte para um restaurante, e ele busca a nota dada pelos usuários; aponte para uma flor, e ele identifica a espécie.

Aliás... Google Assistant já está disponível também para iPhone e iPad. É um concorrente peso pesado para o Siri.

Mark Cuban, entre os mais conhecidos investidores do Vale do Silício, é uma das pessoas debruçadas sobre a questão que mais aflige a nova economia. Tecnologias ligadas à  inteligência artificial, que vão de assistentes digitais a carros autômatos, devem dizimar com uma série de profissões nos próximos anos e décadas — motoristas, assistentes executivas, contadores etc. No Vale, a solução mais próxima da unanimidade é criar um imposto sobre o uso destes sistemas para financiar programas de renda mínima garantida. Cuban vê outros dois caminhos. Um está numa profissão nova, que ele chama de linha de montagem do futuro: taguear dados. E, dois, o tradicional método keynesiano: contratar estes trabalhadores para grandes projetos em escolas, hospitais e afins.

Em tempo: Cuban é o nome badalado, no Vale, para se tornar candidato à sucessão de Donald Trump. Mas, em sua opinião, o próximo pleito será para a sucessão de Mike Pence.

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