Brasília paralisada, ninguém sabe para onde ir

No fim de semana, Brasília se perdeu na imobilidade de seus líderes. PSDB e DEM tinham, marcada para a manhã de domingo, uma reunião que definiria se mantêm apoio ao governo Temer ou não. A expectativa era grande — o encontro foi cancelado. O presidente marcou, para às 19h30, um jantar no Alvorada para demonstração de apoio dos líderes da base aliada. Poucos confirmaram, muitos disseram que, tendo passado o fim de semana nos estados, não chegariam a tempo na capital. O jantar de apoio virou uma conversa para quem conseguisse chegar. Em Brasília, muito se conversou entre sábado e domingo, numa série frenética de reuniões. Nada se decidiu.

Tudo gira em torno da quarta-feira. O ministro Edson Fachin jogou para o plenário do Supremo a decisão de suspender ou não o inquérito que investiga Temer. Foi para quarta que a presidente Cármen Lúcia agendou a decisão.

Aliás... Cármen Lúcia tem dito que está indignada com Temer, informa Lauro Jardim. (Globo)

O Planalto espera que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, consiga votar duas medidas econômicas antes da reunião do STF. A ratificação dos acordos de benefícios fiscais que os estados deram a inúmeras empresas ao longo dos últimos anos. E o Refis da Crise, que permitirá aos governadores parcelar suas dívidas com INSS e União. Seria uma demonstração de força, de que Temer ainda consegue aglutinar a base que tem no Congresso.

Segundo Gerson Camarotti, PSDB, DEM, PPS e o braço governista do PSB vão esperar a decisão do Supremo para definir se ficam ou saem do governo.

Enquanto isso... A OAB vai entrar com um pedido de impeachment contra Temer.

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Temer concedeu entrevista à edição da Folha desta segunda. Pressionado pelos repórteres sobre a falta de apoio, rebateu. “Vou revelar força política precisamente ao longo dessas próximas semanas com a votação de matérias importantes. É que criou-se um clima que permeia a entrevista do senhor e das senhoras de que vai ser um desastre, de que o Temer está perdido. Eu não estou perdido”, disse. Os jornalistas também o questionaram sobre o fato de Rodrigo Rocha Loures ter sido flagrado recebendo malas de dinheiro. “O Rodrigo certamente foi induzido, foi seduzido por ofertas mirabolantes e irreais. Agora, a pergunta que se impõe é a seguinte: a questão do Cade foi resolvida? Não foi. A questão do BNDES foi resolvida? Não foi.” Mas o presidente negou se sentir traído pelo ex-assessor. “Ele é um homem, coitado, ele é de boa índole, de muito boa índole. Sempre tive a convicção de que ele tem muito boa índole. Agora, esse gesto não é aprovável.” Em outro momento, a equipe da Folha aponta que o presidente recebeu Joesley tarde da noite e que não registrou na agenda o encontro, o que é ilegal. “Muitas vezes marco cinco audiências e recebo 15 pessoas. Às vezes à noite, portanto inteiramente fora da agenda. Eu começo recebendo no café da manhã e vou para casa às 22h, tem alguém que quer conversar comigo. Até pode-se dizer, rigorosamente, deveria constar da agenda. Você tem razão. Não é ilegal porque não é da minha postura ao longo do tempo.” O jornal lembra que o registro na agenda é exigência da lei 12.813/13.

Fernando Henrique Cardoso ligou no sábado para seu ex-ministro, Nelson Jobim. Busca uma ponte com Lula, em cujo governo Jobim também serviu. A tese do ex-presidente, segundo O Globo, é que em 2018 todos poderão se enfrentar, mas agora o momento é de união. FH avalia que Temer não tem mais condição de sustento e quer articular um acordo para o nome do sucessor.

Aliás... Elio Gaspari listou os nomes mais badalados para a sucessão, no caso de eleição indireta. A lista tem, inclusive, o nome de Jobim. A ele, juntam-se Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Rodrigo Maia e Tasso Jereissati. (Folha ou Globo)

Há um embate entre Globo e Folha a respeito do perito Ricardo Caries dos Santos. Ao diário paulistano, ele afirmou em reportagem publicada no sábado que há “mais de 50 edições” na gravação entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista. O jornal o identifica como perito homologado pelo TJ-SP e a matéria foi utilizada pelo presidente em seu discurso de defesa como principal sustentação de que o registro da conversa fora manipulado.

Uma equipe do carioca O Globo foi a Santos. O diário diz que ele não é perito homologado, apenas presta serviços eventuais para o tribunal. Ao jornal, ele mostrou-se reticente, afirmando que na verdade encontrou apenas “14 pontos de edição” e que “seu trabalho é apenas inicial”. Outros peritos ouvidos pelo Globo ainda pontuaram que os softwares usados na análise são amadores. Em resposta, a Folha voltou a ele. Afirma ter ouvido, no domingo a noite, que Santos sustenta, sim, a presença de “53 edições” e que ele é, sim, perito do TJ. Não entra no mérito dos programas de computador utilizados.

Ao sair de seu carro com o gravador ligado para a conversa com Temer, Joesley ouvia a CBN. Quando voltou ao carro, o rádio estava na mesma emissora. Os jornalistas da CBN tornaram à programação daquela noite de 7 de março para ouvir o que fora transmitido. Entre deixar seu automóvel e retornar, tinham se passado os mesmos 36 minutos do registro da gravação. Ao menos por este indício, não parece ter havido cortes.

O ministro Edson Fachin enviou a gravação ao Instituto Nacional de Criminalística para uma perícia profissional.

A Polícia Federal está cortando recursos da Lava Jato. Caiu de nove para quatro o número de delegados alocados. E reduziu para 44% o orçamento de custeio previsto em 2017. Durante o governo Dilma não houve qualquer intervenção parecida. (Estadão)

Sérgio Abranches: “Quando a crise atinge quase todo o sistema partidário, não há saída boa, ainda que seja constitucional. Caso Temer caia, por qualquer uma das vias, a saída constitucional seria a eleição indireta. Estar na Constituição, não assegura, porém, que seja um procedimento eficaz para superar a crise política e criar uma ponte segura para 2018. As regras para essa eleição não estão definidas. O que temos, é parte do entulho autoritário ainda não removido. A lei, de 1964, que regulamentava as eleições indiretas, escrita para assegurar o controle dos militares. O colégio eleitoral constituído pela Câmara e Senado não tem credibilidade junto à população e tem tão pouca legitimidade social quanto Temer. O único caminho para dar mais eficácia e legitimidade a essa escolha, seria um acordo suprapartidário de estabilidade nacional, em torno de um nome que possa atuar como magistrado, com equidistância em relação a todos os setores envolvidos nas investigações de corrupção. Um perfil que indicaria alguém sem mandato e sem associações estreitas com as facções que dominam nossa política por todos os lados do caleidoscópio ideológico. Difícil é achar quem se enquadre no perfil e ainda tenha as apitdões necessárias para liderar o país por esse labirinto de crimes e conspirações.”

Otávio Frias Filho: “Os alicerces do governo Temer, sempre frágeis, estão ainda mais abalados. Mas é cedo para dizer que esta administração acabou. A economia, que aos poucos sai do atoleiro, atua em seu favor. O relógio, que mostra as eleições gerais de 2018 cada vez mais perto, também. Enquanto isso, um governo cambaleante se encastela ao forcejar por reformas que preparam o ciclo de expansão econômica apto a consagrar, talvez, seu sucessor.” (Folha)

Boris Fausto: “Essa crise é a mais grave que já vivemos, não vejo nenhuma outra semelhante a ela. Mas uma conjuntura tão grave assim foi a dos anos que precederam o golpe militar. Hoje, as especulações não estão em torno do Exército. Não existe nenhuma conversa entre generais ou qualquer coisa que possa ser indício disso. Mas eu temo que a gente possa chegar a uma situação que mude esse quadro, que empurre militares para intervenção. Uma situação de caos social, de desentendimento completo, as manifestações de rua escaparem dos limites. E a polarização contribui para isso. Seria muito triste, mas pode ocorrer.”

Viver

Na manhã de ontem, 900 policiais cercaram a região da cracolândia, na área central de São Paulo. Deram início a uma megaoperação de combate ao tráfico de drogas, que vinha sendo planejada desde fevereiro. Segundo a Folha, 38 pessoas foram presas - entre elas, os oito principais traficantes da área.

Desmantelar a cracolândia, sabe-se, é projeto antigo de autoridades paulistanas. O atual prefeito (e provável candidato à presidência) João Doria tentou capitalizar a ação de ontem — anunciou o fim do programa da gestão anterior (do petista Fernando Haddad) e fez declarações como “A cracolândia aqui acabou” ou “A partir de hoje, isso é passado”. Depois da operação, no entanto, dependentes químicos que antes ocupavam a região se espalhavam por outras ruas do centro da cidade, como relatou a Folha.

Não é apenas uma sensação de quem anda pelo Rio. A população de moradores de rua aumentou — e, segundo o Globo, quase 6 mil deles chegaram à condição há menos de um ano, vítimas principalmente da crise econômica no país. Eles são 41,29% de um total de 14.279 pessoas sem lar na capital fluminense. A reportagem ouve algumas delas e detalha levantamento feito pela Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos.

Aumentam os grupos contrários à vacinação no país. Alimentam-se sobretudo de informações de páginas do Facebook, sem base científica, de acordo com o Estadão. O movimento preocupa o Ministério da Saúde, que viu cair o índice de cobertura de algumas imunizações  em 2016. Esta queda, dizem especialistas, pode causar problemas de saúde pública. Na Europa, por exemplo, grupos contrários à vacinação são tidos como responsáveis por um recente surto de sarampo.   

Cotidiano Digital

O jornal britânico The Guardian teve acesso a mais de 100 documentos internos do Facebook, incluindo manuais, planilhas e listagens de procedimentos sobre como lidar com o que pode ou não ser publicado no sistema. Segundo um dos textos, os moderadores da rede avaliam 6,5 milhões de alertas sobre perfis falsos por semana. Estes moderadores são, segundo o jornal, a maior tropa de censores em operação no mundo.

Para o Facebook, uma afirmação como “Alguém atire em Trump” deve ser apagada. Mas “Para quebrar o pescoço de uma vagabunda, aplique pressão no meio da garganta” pode permanecer. O argumento é de que usuários utilizam-se de linguagem violenta com frequência e isto não deve ser encarado como uma ameaça de morte crível.

Vídeos de mortes violentas não devem ser apagados na maioria dos casos. Agressão não sexual de crianças, a não ser que tenham um elemento de sadismo, também não. Nudez “feita a mão” — desenhos, esculturas etc. — não devem ser apagados; nudez “produzida digitalmente” deve ser apagada. O intuito do código é censurar o menos possível e permitir que conteúdo que possa servir de alerta circule. Mas é inevitável que as revelações gerem polêmica.

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Diga-se... A Folha de domingo entrevistou Rose Leonel, fundadora da ONG Marias da Internet. Em 2006, um ex-namorado distribuiu pela rede uma série de imagens íntimas da jornalista, que era muito conhecida em Maringá. Destruiu sua vida. Rose foi obrigada a mandar o filho morar no exterior com o pai e demorou anos para conseguir algum resultado na Justiça. Sua ONG, hoje, dá apoio jurídico e psicológico para mulheres vítimas da pornografia de revanche.

Cultura

Até Roger Waters, ex-baixista do Pink Floyd, repercutiu a crise política do Brasil. Postou foto de Temer, sobre a qual aplicou marcas em preto e estampou a pergunta: “Essa é a vida que realmente queremos?”. Waters faz a linha politizado - num de seus shows, por exemplo, já “transformou” Trump num porco inflável. No caso de Temer, o post também soa como parte da divulgação de seu novo disco, cujo título é justamente a pergunta Is This The Life We Really Want?.

É hoje a aguardada estreia de Twin Peaks, ou melhor, da continuação de Twin Peaks na Netflix. Mais de 20 anos se passaram desde o lançamento da série original, criada por David Lynch. É o cineasta também quem comanda o retorno, diga-se, cercado de suspense. O Estadão conta que nem mesmo quem trabalhou na produção sabe muito sobre o roteiro. Os atores, por exemplo, só recebiam os textos de suas próprias cenas, e nada mais.

Ainda na onda nostálgica... a Netflix anunciou que prepara uma série a partir de O Cristal Encantado, clássico do gênero fantástico lançado em 1982. Começa a ser filmada no final deste ano e, bem como no original, tem o elenco composto por bonecos mecanizados.

Dois belos textos sobre Antonio Candido, na Folha: um delicado depoimento da neta do crítico literário, que faleceu na semana passada, e uma carta que o poeta Armando Freitas Filho havia escrito para enviar ao amigo em julho, mês de seu aniversário. Os dois se correspondiam havia 20 anos. 

Um mapa da poesia no Brasil. É o que pensou Marina Mara, poeta de Brasília, ao criar um app para identificar “pontos de poesia” no país — exemplos: bibliotecas, saraus, coletivos e, como explica a autora, outras "formas de expressão poética", como o grafite. Gratuito e colaborativo, o aplicativo, segundo ela, rapidamente passou de 10 mil pontos cadastrados. O app está disponível para Android, mas os pontos de poesia podem ser consultados também pelo site.

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