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Bolsonaro é populista, e Paulo Guedes ‘um liberal rendido’, diz cientista político

Conhecido por ser seu conservadorismo fiscal, o ministro da Economia, Paulo Guedes, um dos mais ortodoxos ultraliberais a ocupar a cadeira, surpreendeu o mercado ao aceitar a ruptura do teto de gastos para viabilizar o Auxílio Brasil, um substituto do Bolsa Família no valor de R$ 400. Mesmo defensores da destituição de renda acusaram o auxílio e a quebra da ortodoxia fiscal como uma manobra populista visando a reeleição de Jair Bolsonaro no ano que vem. Guedes não vestiu a carapuça e ainda defendeu: “O presidente não é populista. Ele é popular. É diferente”, afirmou, em entrevista. Não é o que pensa o cientista político Antônio Lavareda, mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco e doutor em Ciência Política pelo IUPERJ. Em entrevista ao Meio, Lavareda explica que Bolsonaro tem todas as características de um político populista e que Guedes, ao aceitar furar o teto de gastos, tornou-se um “liberal rendido”.

Qual é a diferença entre um político popular e um populista?

A fronteira entre popular e populista é tênue. Do ponto de vista de conceitos, um político popular é um político bem avaliado, que desfruta de simpatia em larga parcela da opinião pública. JK (o ex-presidente Juscelino Kubitschek, que governou o Brasil entre 1955 e 1960), por exemplo, foi um político popular. Já um político populista é, via de regra, polarizador, identifica inimigos contra os quais ele se arvora em mobilizar a maioria absoluta da sociedade, da qual ele seria, naturalmente, defensor e representante. O populista, em geral, é antissistema. Ser contrário às instituições faz parte da narrativa do populismo. Há populismo de esquerda e populismo de direita. O paradigma contemporâneo do populismo de esquerda é o Chavismo na Venezuela; já do populismo de direita é Victor Orban, na Hungria. Quais são as ações do político populista? Frequentemente o chamado populismo fiscal, por exemplo, o desrespeito aos limites fiscais em benefícios de ganhos políticos eleitorais que essas medidas possam trazer ao governante.

Bolsonaro é ‘populista’ ou ‘popular’, como disse o ministro da Economia, Paulo Guedes?

O presidente tem atributos de proximidade com a população, um estilo autêntico que o tornaria mais próximo da média de seus apoiadores. Ele, por exemplo, exercita isso frequentemente no chamado “cercadinho”, onde pessoas têm a oportunidade de se aproximar. Isso é característica de popularidade. Não o torna necessariamente um populista. Mas é populista essa iniciativa de desrespeitar o teto de gastos. Outra característica importante do presidente é a narrativa antissistema, que ele desenvolveu na clara invectiva contra os demais Poderes, sobretudo contra o Judiciário. É natural que, na narrativa eleitoral, durante a campanha, ele volte a resgatar uma parte importante desse posicionamento, pois foi isso que garantiu e consolidou a sua vitória em 2018. E ele, candidato à reeleição, partindo de uma situação de inferioridade em relação ao principal competidor, o ex-presidente Lula, vai naturalmente se ver tentado a utilizar os dois principais recursos de sua campanha de 2018. Foram exatamente esse posicionamento antissistema e a disseminação desse posicionamento nas redes sociais que o elegeram. Tanto que as fake news estão agora no foco do Tribunal Superior Eleitoral.

Qual é a importância das fake sews para a narrativa populista?

É muito difícil desenvolver um discurso populista sem recorrer às fake news. Porque elas alimentam um discurso simplificador, divisivo da sociedade, e o populista precisa identificar não “adversários”, mas “inimigos”. Então é muito difícil não apelar à deturpação de informações para fazer com que essa caracterização caiba nesse fim.

Ciro e Lula são populares ou populistas?

Como pedra de toque, a comprovação do populismo exige que o líder passe pelo governo e, nessa passagem, adote políticas populistas. Muita gente acusa Lula de populismo. Mas, durante seus oito anos de governo, mesmo sem autônima formal do Banco Central, o BC foi presidido por Henrique Meirelles, que não por acaso é o pai da legislação do teto de gastos. E Meirelles teve liberdade para adotar todas as medidas que foram necessárias para domar a inflação. Ou seja, é difícil nós identificarmos políticas populistas do ex-presidente Lula.

O Bolsa Família não se enquadraria?

O Bolsa Família, que muitos acusam de ser uma política distributiva, que poderia ser enquadrada nessa categoria, na verdade é a consolidação e ampliação de programas pré-existentes já do tempo do governo do tucano Fernando Henrique Cardoso.

E Ciro?

Quanto a Ciro Gomes, ele tem passagem por governos estaduais e foi ministro da Fazenda. Nesse cargo, Ciro ajudou, ao longo de alguns meses, em 1994, na etapa de consolidação do Plano Real. E, como governador do Ceará, não há nenhuma acusação de política irresponsável do governo, do ponto de vista fiscal, que possa ser caracterizada como política de cunho populista. Então, aos dois não se aplica o designativo, embora, os oponentes, com frequência, acusem a ambos dessa postura.

Candidatos populares têm mais chance de ganharem eleições, após o decorrer de uma campanha, do que desconhecidos?

Campanha eleitoral não é campeonato de popularidade. Você pode ter pessoas extremamente populares que concorrem em certos anos eleitorais e são derrotados. O Luciano Huck é uma pessoa bastante popular no Brasil. Tem programa de televisão e desfruta de ampla empatia com a população. Se ele fosse candidato, poderia perder as eleições. E deixaria de ser popular? Não. Ele continuaria sendo uma pessoa popular que foi derrotada numa campanha eleitoral.

O Pelé, por exemplo, é uma das figuras mais icônicas e populares da nossa cultura. Se ele fosse candidato a presidente, muito provavelmente perderia a eleição porque não tem os atributos que a população demanda a um político que se candidate ao cargo. Mas continuaria a ser popular. Essa derrota não significaria atestado de perda de popularidade do Pelé.

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