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Marília Mendonça, antimachista acima de tudo

Marília Mendonça (Spotify) começou em extremos, cantando na Igreja e em bares, e foi julgada por se apresentar na noite. Em entrevista a Tata Werneck, contou que a mãe foi traída pelo padrasto, o que também gerou comentários preconceituosos. Quando virou estrela, cantou sobre trair e ser traída, bebedeiras, sexo, dar a volta por cima, e empoderamento feminino. Claramente era uma mulher antimachista. Nascida em Cristianópolis (GO), a sertaneja começou o movimento do “feminejo” e teve uma rápida ascensão. Infelizmente o acidente aéreo, do dia 5 de novembro, interrompeu a vida e auge da carreira do fenômeno de 26 anos.

Cantora, compositora, instrumentista e com uma voz grave, potente e inconfundível, Marília Mendonça não marca apenas uma geração, mas um movimento de dar voz às mulheres que passam por relacionamentos abusivos e desigualdade de gênero. A própria Marília sofreu para emplacar suas canções e, antes de estourar no cenário musical, oferecia as letras para cantores homens, pois não havia espaço no mercado. Ela pavimentou o próprio caminho, que abriria portas para um novo nicho de mulheres na cena musical. Quase ao mesmo tempo surgiriam Simone e Simaria, Maiara e Maraísa, Naiara Azevedo e inúmeras mulheres, em dupla ou solo, que construíram um novo genero: o feminejo.

O feminejo vem com um movimento antimachista, mas não propriamente feminista. A intercambialidade de culturas entre “a roça” e a “metrópole” foi bem difundida com o sertanejo universitário desde duplas masculinas como Zé Neto e Cristiano, Luan Santana e Michel Teló. Até mesmo na moda de viola, aquele sertanejo de bota e fivela que foi amplamente divulgado com os famosos “rodeios” Brasil afora e se fortaleceu com Chitãozinho e Xororó, Zezé di Camargo e Luciano, Leandro e Leonardo, nos anos 1980 e 90.

Antimachista ou feminista

“Muitas vezes a mulher ‘não se encaixa no feminismo’ por causa de algum preconceito com militantes ou estereótipos. Eu mesma só passei a estudar feminismo depois de conhecer um pouco mais e entender que é uma luta por direitos. A visão que eu tinha antes – e é a que a maioria das pessoas ainda tem – é de ativistas que querem destruir o machismo interferindo na liberdade sexual, em questões estéticas (como depilação) e presumindo que homem é sempre um agressor (mesmo que seja um menino de cinco anos”, explica Cynthia Semíramis, Doutora em Direito (UFMG), professora e pesquisadora dos direitos da mulher em perspectiva jurídica não-ativista.

O sertanejo de Marília Mendonça vem carregado com instrumentos que já conhecemos do gênero “modão” como sanfona e viola, porém traz batidas de bateria bem marcadas que dão fôlego diferenciado para a ‘sofrência’, não deixando com que o ritmo seja comparado às músicas de “fossa” tradicionais de cantoras que também marcaram época cantando suas mágoas e tristezas como Maysa Monjardim Matarazzo, Dolores Duran e puxando para um internacional atual, Lana Del Rey e Olivia Rodrigo. Marília nos ensinou que possível chorar e sofrer pela dor de ser corno e ainda continuar dançando. É inegável que a música fica ainda melhor se acompanhada de uma cervejinha e um boteco com os amigos, mas até na pandemia Marília operou milagres na saúde mental dos brasileiros!

“Parte do sertanejo atual é no estilo Bachata – dança originada da República Dominicana na década de 1960 –, que é mais alegre. Um exemplo clássico de Bachata é Borbulhas de Amor do cantor e compositor Fagner. A gente separa tudo em compartimento, mas música é um grande compartilhamento de estilos e ideias”, diz a Cynthia.

A especialista lembra que a identificação profissional como feminista pode ser uma faca de dois gumes: “Uma pessoa famosa que se identifica como feminista atrai mais atenção e pode gerar bons resultados imediatos para as lutas das mulheres. Mas essa identificação pode restringir a fama, limitando a pessoa a um nicho temático-político. Isso é prejudicial tanto para a carreira (rotula, limita e não amplia o público) quanto para o feminismo (não expande as questões feministas para novos públicos). Por isso que considero que a mensagem é mais importante que o rótulo feminismo, antimachismo ou qualquer outro que apareça.”

Fenômeno comercial

O gênero que Marília Mendonça popularizou fez tanto sucesso, que a cantora teve a live mais vista da história do Youtube, em 2020, no começo da pandemia do coronavírus. Já em 2021, a Rainha da sofrência bateu outros recordes como o de cantora nacional mais ouvida do Youtube, Deezer e Spotify. Além de ter passado o número de seguidores de bandas internacionais como The Beatles e AC/DC e até mesmo Michel Jackson e Sia, no Spotify.

Em outubro, Marília se juntou à dupla Maiara e Maraísa para formar o trio As Patroas, que rendeu um álbum de inéditas, 35% (Spotify), com nove músicas, sendo Esqueça-Me Se For Capaz um hit instantâneo e com um clipe, no mínimo, premonitório. As Patroas se vestiram de pilotas de avião para cantar “esquece, aí, cê não é o bichão? Nunca esquecerão.”

No mesmo dia em que o bimotor que transportava Marília Mendonça, seu tio Abicieli Silveira Dias Filho, o produtor Henrique Ribeiro, o piloto Geraldo Martins de Medeiros Júnior e o copiloto Tarciso Pessoa Viana, caiu, a cantora lançou seu último trabalho, o videoclipe de Fã Clube, com as amigas feminejas.

Marília Mendonça mostrou que o seguimento “sertanejo” transformou os períodos de Rodeios em mais do que “temporadas de Rodeios”. O sertanejo avançou as porteiras de Barretos, Jaguariúna e Itapecerica da Serra e conquistou outros públicos, deu voz às mulheres, todas elas. Marília tem protagonismo à parte e deixa um legado na distribuição do que é hoje a música mais popular brasileira.

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