Edição extra: Bolsonaro vai para prisão após violar tornozeleira

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Um ferro de solda e um vídeo nas redes sociais foram o estopim para que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) fosse levado por agentes da Polícia Federal na manhã deste sábado do condomínio de luxo em Brasília onde estava em prisão domiciliar para a detenção em uma sala na sede da corporação. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes atendeu ao pedido da PF e converteu a prisão de Bolsonaro em preventiva, decisão que será avaliada na segunda-feira pela Primeira Turma do Supremo. A decisão de Moraes (íntegra) foi baseada em dois incidentes: a violação nesta madrugada da tornozeleira eletrônica usada pelo ex-presidente e a convocação nas redes feita pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) de uma vigília na porta do condomínio. O ministro avaliou que os dois fatos apontavam para uma tentativa de fuga, lembrando que os deputados bolsonaristas Alexandre Ramagem (PL-RJ) e Carla Zambelli (PL-SP) deixaram o país após condenações judiciais. Segundo aliados, Bolsonaro questionou os agentes, reclamando que estava sendo preso “por causa de uma vigília”. (UOL e Meio)
Mas não foi somente pela vigília. Como conta Andreia Sadi, o alarme da tornozeleira eletrônica de Bolsonaro soou aos 7 minutos deste sábado, e uma hora depois os agentes que fazem a vigilância do ex-presidente constataram a violação e tiveram de trocar o aparelho. A tornozeleira vai passar por perícia, mas o próprio Bolsonaro admitiu ter usado um ferro de solda para tentar abrir o aparelho. Um relatório da Secretaria de Administração Penitenciária do DF, divulgado no início da tarde, confirmou que a tornozeleira tinha “sinais claros e importantes de avaria” e queimaduras. Aliados do ex-presidente, conta Julia Duailibi, negaram que a violação fizesse parte de uma tentativa de fuga e procuraram atribui-la à “privação de sono” a à ação de medicamentos. (g1)
Confira o vídeo em que Bolsonaro confessa ter tentado violar a tornozeleira com um ferro de solda. (g1)
Apesar da admissão de Bolsonaro e do relatório da secretaria, o advogado Paulo Amador da Cunha Bueno classificou a violação da tornozeleira como “uma narrativa que tenta justificar o injustificável”. Ele argumenta que o ex-presidente não teria como fugir porque sua casa era vigiada o tempo todo pela polícia. Já Moraes deu prazo de 24 horas para que a defesa explique a violação da tornozeleira. (UOL)
A Polícia Federal já estava em alerta desde a sexta-feira, quando Flávio Bolsonaro publicou um vídeo nas redes sociais convocando uma “vigília de oração” em frente ao condomínio do pai “pela saúde de Bolsonaro e pela liberdade no Brasil”. Ao decidir pela prisão preventiva, Alexandre de Moraes argumentou que Flávio usava “o mesmo modus operandi” da tentativa de golpe após as eleições de 2022 e que havia a possibilidade de a vigília se ganhar uma grande dimensão, estendendo-se por vários dias. Após a transferência do pai para a prisão, o senador reagiu fazendo uma live contra Moraes. “Se meu pai morrer lá dentro [da sede da PF], a culpa é sua”, afirmou. (Metrópoles)
A prisão de Bolsonaro pegou desprevenida a família do ex-presidente. A ex-primeira-dama Michelle estava em um evento do PL Mulher no Ceará quando recebeu a notícia e retornou a Brasília em um jatinho. A interlocutores, ela disse se preocupar com a alimentação do marido, que tem sofrido crises de vômito e soluços. Já o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), radicado nos Estados Unidos desde fevereiro, classificou a prisão como uma “tentativa de assassinato” por parte do ministro. “Moraes está tentando terminar o trabalho que Adélio Bispo [autor da facada contra Jair Bolsonaro em 2018] começou”, afirmou. A defesa do ex-presidente pediu que a mulher e os filhos possam visitá-lo na prisão, já que, de acordo com a decisão de Moraes, somente médicos e advogados podem ver Bolsonaro sem autorização prévia do STF. (CNN Brasil)
A defesa de Bolsonaro sofreu ainda um segundo revés. Após decretar a prisão preventiva, Moraes declarou “prejudicado” e descartou um pedido dos advogados para que o ex-presidente já começasse a cumprir a sentença pela tentativa de golpe em prisão domiciliar, por razões de saúde. O pedido citava uma decisão do próprio Moraes, que beneficiou o também ex-presidente Fernando Collor de Mello, condenado a oito anos e dez meses por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A forma como a pena de 27 anos e três meses será cumprida, entretanto, só vai ser determinada na próxima semana. A prisão preventiva deste sábado foi decretada no âmbito do processo em que seu filho Eduardo é réu por tentativa de coação da Justiça. (Folha)
Enquanto os advogados de Bolsonaro se declaram “perplexos” e negam haver base para a prisão preventiva, há um consenso entre juristas de que a ordem de Moraes foi bem fundamentada. Pierpaolo Bottini, professor da USP, diz que a violação da tornozeleira foi o ponto crucial, “em especial por ocorrer nas vésperas de um possível trânsito em julgado” da condenação por golpe. Já o criminalista Davi Tangerino, professor da UERJ, argumenta que a vigília ampliava o risco de um acampamento prolongado como os que antecederam os ataques às sedes dos poderem em 8 de janeiro de 2023. “É uma decisão correta, prudente, um tanto inusitada, um tanto rara do ponto de vista dos fundamentos, mas também é um condenado raro”, diz. (Estadão)
A notícia da prisão de Bolsonaro provocou, como seria de se esperar, uma explosão de memes, com destaque para o fato de ter acontecido no dia 22, mesmo número do PL na Justiça Eleitoral. (Poder360)
Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, teve uma reação comedida ao saber da prisão de Jair Bolsonaro. Questionado por jornalistas sobre a detenção, ele disse: “Não, eu não sei nada sobre isso. Eu não ouvi sobre isso. Foi isso que aconteceu? É uma pena, uma pena, eu só acho que é uma pena”. Pouco depois, em e-mail enviado para jornalistas, a Casa Branca acrescentou que “Trump pareceu dar a entender que conversou com o presidente Lula” na noite anterior. Segundo a Casa Branca, Trump disse aos jornalistas: “Eu falei ontem à noite com o cavalheiro ao qual você acabou de referir”, mas sem especificar quem seria o “cavalheiro” mencionado. Em um segundo e-mail, a Casa Branca informou que não foi possível compreender se Trump se referia a Lula ou a Bolsonaro. (CNN Brasil)
Já Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, publicou uma nota em suas redes sociais e disse que Bolsonaro é inocente e que seguirá firme ao lado dele. Ele afirmou ainda que “tirar um homem de 70 anos da sua casa, desconsiderando seu grave estado de saúde” é “irresponsável”. “Lutaremos para que essa injustiça seja reparada o quanto antes”, diz Tarcísio. (g1)
Ratinho Júnior (PSD), governador do Paraná e também potencial presidenciável, foi às redes para manifestar apoio a Bolsonaro. Ele disse que o ex-presidente tem problemas graves de saúde e que a prisão preventiva ocorreu mesmo após Bolsonaro ter “apresentado laudos que comprovam sua saúde em estado crítico”. “Ao ex-presidente e a seus familiares, minha solidariedade. Triste Brasil!”, diz o post. (Plural)
O governador de Minas (Novo), Romeu Zema, outro presidenciável que busca as bênçãos de Bolsonaro, chamou a prisão de “injustiça”. “Isso não é justiça. É revanchismo político. E o Brasil não precisa disso”, diz seu post nas redes sociais. (O Tempo)
Houve quem aumentasse o tom. O deputado federal Sóstenes Cavalcante (RJ), líder do PL na Câmara, usou o X para dizer que o ministro “Alexandre de Moraes é um psicopata de alto grau”. Ele apagou os posts. Mais tarde, divulgou uma nota oficial, em que afirma que “o dever do Parlamento é reagir sempre que um cidadão ou ex-presidente sofre violação de garantias fundamentais”. (Poder360)
Na esquerda, o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), disse que a prisão preventiva “evidencia que, diante de risco concreto à ordem pública e de manipulação política do processo, a lei alcança todos, inclusive o ex-presidente. O trânsito em julgado se aproxima e abre caminho para o início do cumprimento da pena. Bolsonaro preso!”, escreveu Lindbergh. José Dirceu, ex-presidente nacional do PT e ex-ministro da Casa Civil, publicou uma montagem com Bolsonaro atrás das grades e disse que a prisão é “um recomeço para o Brasil” e que o “chefe da tentativa de golpe está preso”. (Estadão)
O líder do governo Lula na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), declarou que o país vive “um momento histórico”. “Quem atacou a democracia vai pagar por isso!”. Já a líder do PSOL na casa, deputada Talíria Petrone (RJ), disse que foi acordada com um “alarme diferente” neste sábado, com a notícia de que Bolsonaro foi preso. “O Brasil sorri. GRANDE DIA”, escreveu. (Folha)
Enquanto isso, no condomínio Solar de Brasília, onde Bolsonaro cumpria prisão domiciliar, houve queima de fogos e até convite para comemoração nas áreas residenciais. Os fogos puderam ser ouvidos enquanto a deputada Bia Kicis, apoiadora de Bolsonaro, dava entrevista. O grupo de WhatsApp dos moradores se agitou, com alguns preocupados com a movimentação nas ruas internas e a possibilidade de novos tumultos. (Globo e Poder360)
Pedro Doria: “Alexandre Ramagem, antes de ser preso, fugiu para os Estados Unidos. Eduardo Bolsonaro está nos Estados Unidos. Bolsonaro tem o episódio de ter dormido na embaixada da Hungria e tem o pedido de asilo encontrado no celular para os argentinos, para o presidente Javier Milei. Para se criar uma muvuca a fim de tentar facilitar a fuga do ex-presidente, o risco é razoável. A Polícia Federal foi lá e o transferiu para uma sala confortável, dentro da sua sede, onde a prisão pode ser mantida com segurança. Não tem nada de absurdo nisso. É só a Justiça trabalhando”. (Meio)
Maria Cristina Fernandes: “O fato mais determinante para a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro, os indícios de violação da tornozeleira eletrônica, se deveu à atuação de uma secretaria do governo do Distrito Federal. Há quase três anos, as falhas da polícia do GDF facilitaram a tentativa de golpe. A aposta de que algo se move no aprimoramento das instituições subiu um degrau. O Centro Integrado de Monitoração Eletrônica da Secretaria de Administração Penitenciária, que deu o alerta da tornozeleira é, em última instância, subordinado a Ibaneis Rocha, governador que está sob a lupa da operação que decretou a prisão do banqueiro Daniel Vorcaro e a liquidação do Master. É Ibaneis também quem tem sido o anfitrião das reuniões de governadores que se insurgem contra a tentativa do governo federal de normatizar uma ampliação da União nas políticas de segurança pública com a PEC da Segurança e o PL Antifacção. Não são circunstâncias armadas. É a roda da história”. (Valor)
Vera Magalhães: “Numa avaliação governistas e bolsonaristas coincidem: o apelo feito por Flávio Bolsonaro a uma vigília para ‘lutar’ pelo pai e os indícios de violação de sua tornozeleira eletrônica, apenas um dia depois da notícia de que o governo dos Estados Unidos incluiu novos produtos da pauta de exportações brasileiras na lista de exceções ao tarifaço, é sinal de que o entorno de Jair Bolsonaro entendeu que se esgotou a estratégia de obter apoio de Donald Trump para pressionar os Poderes no Brasil e, assim, tentar reverter a iminente prisão do chefe do clã”. (Globo)
Francisco Leali: “Fora do campo penal, a prisão antecipada do ex-presidente põe em xeque a direita. Dispara o relógio para que escolha entre ficar berrando pela liberdade do preso ou passar a procurar uma outra alternativa elegível e viável para a disputa em 2026”. (Estadão)
Igor Gielow: “Com o desastre da ação do incendiário deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) contra o Brasil na terra de Trump, coube a Flávio assumir o manto de presidenciável presumido da família, ao menos neste momento. A toxicidade de seu sobrenome o inviabiliza pelo cenário atual, mas sua voz é suficiente para bagunçar ainda mais o coreto da dividida oposição. Moraes lhe deu, mordendo a isca da vigília, oxigênio retórico para continuar relevante no jogo”. (Folha)
Flávia Tavares: “Quem acha que Flávio Bolsonaro voltou dos Estados Unidos com um erro de estratégia se engana. Ao se encontrar com Eduardo, absorveu exatamente o script que a ala Steve Bannon domina tão bem: provocar caos, criar comoção e fabricar um fato novo capaz de arrancar Jair Bolsonaro do ostracismo da prisão domiciliar. A lógica é simples: reacender a base pelo choque emocional, recolocar o ex-presidente no centro do palco e calibrar a narrativa para onde ela sempre rendeu mais dividendos ao bolsonarismo. Politicamente, o noticiário volta a ser sobre ele e não sobre um potencial candidato da direita do pós-bolsonarismo”. (Meio)


