Hoje, 7 de setembro, o Meio não sairia. Mas um atentado à vida de Jair Bolsonaro, candidato líder das pesquisas, fez necessária esta edição Extra. Não é inédito. Na campanha de 1930, o candidato a vice de Getúlio Vargas, João Pessoa, foi assassinado a tiros — um dos fatos que levaram à Revolução que pôs Getúlio no poder. O Brasil de hoje é outro. Mas, numa eleição que já se mostrava incerta, tudo mudou. De novo.

— Os editores

Atentado a Bolsonaro lança Brasil na incerteza

Passava pouco das 15h, ontem, e Jair Bolsonaro era carregado nos braços de eleitores pelas ruas de Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira, quando recebeu a facada. Porque as veias e artérias na região da barriga costumam sangrar para dentro, enchendo a cavidade abdominal, não houve inicialmente sinal de como havia sido grave. As primeiras informações sugeriam um corte superficial. Não foi. Bolsonaro chegou por volta das 15h40 à Santa Casa da cidade. Estava em choque, perdera muito sangue, a pressão arterial foi ao chão. Ao abrir o abdome em cirurgia, o sangue era tanto que os médicos chegaram a temer que o fígado tivesse sido atingido. Não aconteceu. Mas uma veia grande foi cortada, assim como cortou na parte superior o intestino grosso, permitindo que fezes escorressem pelo espaço. É sério quando ocorre, pois amplia em muito o risco de contaminação. Foi retirado o sangue e o candidato recebeu transfusões. Limpou-se a cavidade o quanto deu e, na região do corte intestinal, Bolsonaro recebeu uma colostomia. É temporária, para permitir a cicatrização. O ex-capitão ficará entre uma semana e dez dias internado. Pelo menos. A colostomia, bolsa externa para colher fezes e gazes intestinais no período de recuperação, vai impedi-lo de fazer o tipo de campanha ativa à qual está acostumado. A eleição é no dia 7 de outubro. Falta um mês.

O atentado foi registrado em vídeo. Após a cirurgia, já acordado, Bolsonaro falou em outro vídeo.

O esfaqueador é Adélio Bispo Oliveira, de 40 anos. A polícia o prendeu imediatamente, quando a multidão iniciava um linchamento. Na delegacia, ele confessou o crime, com argumentos confusos. “O motivo do intento se deu por motivos pessoais os quais não iríamos entender”, registra o boletim de ocorrência. “Disse também em certos momentos que foi a mando de Deus.” Formado em pedagogia, Adelio trabalhava como garçom de acordo com seus advogados. Distante da família, foi filiado ao PSOL entre 2007 e 14. Em seu perfil no Facebook, questiona se Lula pode ‘mudar de atitude’ embora se engaje na campanha Lula Livre. Faz uma ligação entre o senador mineiro Aécio Neve e a Maçonaria — a Maçonaria, aliás, é uma obsessão. E se mostra simpático ao Cabo Daciolo.

Um segundo homem foi detido em conexão com o crime, mas não há detalhes ainda. (Estadão)

Vice de Bolsonaro, o general da reserva Antonio Hamilton Mourão acusou a oposição. “Não acho, tenho certeza”, afirmou à Crusoé. “O autor do atentado é do PT. Se querem usar a violência, os profissionais da violência somos nós.” Não há qualquer indício de que o esfaqueador tenha conexão com o PT.

Todos os candidatos manifestaram horror ao crime, assim como o fizeram o presidente Michel Temer, a presidente do Supremo Cármen Lúcia e a do TSE, Rosa Weber.

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Josias de Souza: “A facada contra Bolsonaro desnorteou os comitês de campanha adversários. Generalizou-se no comando das candidaturas rivais a avaliação de que a dramaticidade do ataque deve potencializar o desempenho de Bolsonaro, praticamente assegurando a presença dele no segundo turno. Disseminou-se também, embora com menor grau de certeza, o temor de que a atmosfera emocional reduza a rejeição a Bolsonaro. A perspectiva decorre da constatação de três obviedades: 1) O bombardeio dos contendores contra o capitão terá de ser interrompido. 2) O quadro clínico estimula o sentimento de solidariedade do eleitor. 3) Nas próximas semanas, mesmo sem fazer campanha nas ruas, Bolsonaro frequentará o noticiário como protagonista. Será hiperexposto nos telejornais do horário nobre na condição de vítima.”

Clóvis Rossi: “O ataque a Bolsonaro é a mais recente evidência de que o ódio impregnou de tal maneira partes da sociedade que qualquer hipótese de conciliação se torna perto de impossível. Não é porque Bolsonaro foi a vítima que deixa de ser também responsável por essa maré de ódio. O que existe é um ambiente de radicalização horroroso pelo qual todos os partidos são de alguma forma responsáveis. Não há outro meio para sair do buraco em que o país caiu a não ser a negociação e o diálogo. Não há no Brasil uma maioria política capaz de impor suas posições. Basta lembrar que nem mesmo no segundo turno das eleições mais recentes (2002, 2006, 2010 e 2014) houve maioria absoluta do eleitorado a favor do presidente afinal eleito. Logo ou há diálogo entre as parcelas majoritária e minoritárias ou o mar de bílis se transformará em um tsunami.” (Folha)

Paulo Celso Pereira: “O resultado prático do atentado é imprevisível, por envolver um sem-número de variáveis. Como estará a saúde do presidenciável? Bolsonaro voltará à campanha? E sua postura será beligerante? Adotará um ‘Bolsonaro paz e amor’? E como seus adversários abordarão a situação do deputado? Existe outra questão ainda mais importante: qual será a postura do eleitor brasileiro a partir de agora? A beligerância política que dominou o país desde que ‘o gigante acordou’ nos protestos de 2013, com a ascensão dos grupos radicais de black blocs, foi levada ao paroxismo no atentado de ontem. Nesse meio tempo, a tão alardeada cordialidade brasileira foi banida das redes sociais, que se tornaram terreno baldio para vozes radicais no país outrora tido como pouco politizado. Fica então a pergunta: após o ataque, o eleitor vai mesmo apostar em mais radicalismo?” (Globo)

Carlos Melo: “Processos políticos e sociais, às vezes, podem sair mesmo do controle e transformar aquilo que era ruim em algo muito, muito pior. Eis o porquê do imperativo da moderação que agentes políticos deveriam ter. Dizia Aristóteles que uma das virtudes do político seria a capacidade de ponderar. Os políticos no Brasil rasgaram essa regra. Apostaram na disputa acirrada e agora parecem prestes a perder o controle. A política, no entanto, foi criada para mediar. Atos de violência são sua negação; são apostas na barbárie. E, não importam quais sejam as armas, facas, tiros ou o discurso de nós contra eles. Um clima assim desperta o monstro; o sujeito, louco-maluco, no meio da multidão, alimentado por todas as taras das disputas sem limites, que lança mão de uma arma — imaginem se fosse um revólver — e, se não tira a vida de outro, esmaga a democracia.”

Desarmem seus discursos

Tony de Marco

 
Mao-do-Bolso

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