Vinte anos de Virada
A Virada Cultural faz 20 anos neste 2025. É, sem dúvida, o evento de cultura mais importante do calendário da Prefeitura de São Paulo. Também o que gera mais polêmica. Com um desenho original de ocupar o centro da cidade com arte, a Virada hoje se espalha por São Paulo toda. O Centro continua recebendo os principais palcos e é onde acontece a virada propriamente dita, com shows madrugada adentro. Mas dos 21 palcos montados pela prefeitura neste ano, apenas cinco ocupam a região central, 16 estão espalhados pela cidade, funcionando em horários reduzidos, mas levando atrações a locais que têm carência de experiências culturais.
Por mais que seja uma festa, há alguns pontos polêmicos na realização da Virada deste ano, como um crescimento no orçamento, que pode chegar a quase a R$ 60 milhões nesta edição, a fraca curadoria de artistas de fora do país e até o engajamento de equipamentos icônicos da própria administração, como é o caso do Teatro Municipal. Para entender esses pontos e saber mais sobre essa edição da Virada, falamos com o Secretário Municipal de Cultura de São Paulo, Totó Parente. Veja abaixo os principais trechos da entrevista.
Qual a importância da Virada Cultural, que faz 20 anos, para cidade?
A Virada Cultural, segundo uma pesquisa do Datafolha divulgada no Itaú Cultural, é o evento mais esperado do ano na cidade, depois vem festa junina e, em terceiro, o Carnaval. A Virada faz parte já da alma do paulistano, de todos os brasileiros e estrangeiros que vivem aqui em São Paulo.
A prefeitura disse na divulgação que vai fazer a maior Virada Cultural da história. Eu cobri outras Viradas, e essa não é a maior nem o número de palcos nem o número de atrações. Por que essa seria a maior Virada?
Qual o número de atrações você viu?
Em 2019, por exemplo, eram 1.200 atrações em mais de 250 pontos da cidade.
Essa aqui vai ter mais de 1.200 apresentações. Você vai poder conferir no site da Virada e contar uma por uma. Serão quase 1.300 apresentações e mais de 200 locais da cidade. Por isso eu garanto que será a maior Virada Cultural da história de São Paulo. [Usando inteligência artificial, o Meio fez o levantamento no site da Virada Cultural e o número era de 797 eventos]
A estratégia da prefeitura foi descentralizar a Virada. Dos 21 palcos principais 16 estão em outras partes da cidade. Só os palcos do Centro vão funcionar 24 horas?
A determinação do prefeito Ricardo Nunes (MBD-SP) é levar a cultura para maior número de pessoas. Imagina quem mora lá em Parelheiros e quer ir ao show do Mumuzinho ou do Alceu Valença ou do Péricles. Lá não tem nenhum equipamento privado cultural, e a pessoa também não tem situação econômica para isso. Então, nós optamos por descentralizar esses palcos. Eles não vão funcionar 24 horas. Agora, no Centro, sim. Nós teremos cinco palcos, 32 locais de ativação cultural, mais o Theatro Municipal, o Centro Cultural Banco do Brasil, a Caixa Cultural, o Mosteiro de São Bento, a Igreja da Sé.
Uma coisa que mudou foi o orçamento, que está bem mais alto, podendo chegar a R$ 60 milhões. A de 2019 que eu citei antes tinha um orçamento abaixo dos R$ 20 milhões. Por que a virada ficou tão cara?
Talvez por conta do aumento do número de palcos, de atrações e a inflação toda desse período. É o custo que temos. Metade é gasto em infraestrutura, em palco, som, iluminação, montagem, camarim, aluguel de geradores, de UTIs, montagem de postos médicos, pagamento de segurança privada. E a outra parte é em cachê para artistas.
Segurança sempre foi uma questão da Virada. Foi montado um esquema especial para essa edição?
Sim, um superesquema. O mesmo do Carnaval, que o Datafolha fez uma pesquisa entre quem participou e deu 99% de aprovação. Serão 25 mil câmeras do Smart Sampa, cerca de 10 mil homens da Polícia Militar, da Polícia Civil, da Guarda Metropolitana, Guarda Civil, além de segurança privada. Terão drones com reconhecimento facial em todos os palcos, câmaras de reconhecimento facial. Como no Carnaval, terão policiais civis e militares à paisana para coibir o roubo. Só no Centro serão mais de 3 mil homens e mulheres garantindo a segurança. Então, as pessoas podem vir curtir uma Virada com segurança. Isso ainda é o nosso maior desafio porque as pessoas não se sentem confortáveis de sair de casa para ir para o Centro, têm um pouco de medo. Mas eu quero que vejam a experiência do Carnaval e saibam que será a mesma.
A entrada da literatura na Virada é uma novidade desta edição?
Sim, terá uma Virada Literária com grandes nomes, Itamar Vieira Junior, do Torto Arado, Bruna Lombardi, Xico Sá, Antônio Prata e tantos outros. Vai funcionar das 18 horas de sábado às 18 horas de domingo, sem interrupção, na Biblioteca Mario de Andrade. Vamos ter também um palco na frente Copan só de stand-up comedy, um na Praça Roosevelt só com monólogos, um na Praça do Patriarca só com mágicos. Então vai ser a Virada de todas as linguagens, uma virada completa. Não é uma virada musical, é uma virada cultural efetivamente.
Outra coisa interessante dessa edição é o corredor de museus da avenida Paulista funcionando de graça na Virada, além dos museus da região da Luz abrindo a noite inteira, como a Pinacoteca, o Museu da Língua Portuguesa e o Memorial da Resistência. Como foi a costura com as instituições que não são da prefeitura?
Quando eu assumi a secretaria, a primeira orientação que eu recebi do prefeito foi: “Totó, diálogo, diálogo, diálogo e diálogo”. Então eu procurei dialogar com todas as partes que fazem cultura em São Paulo. Tomei iniciativa de procurar o pessoal da Paulista, e todos os equipamentos culturais de lá estão envolvidos. Desde a Casa das Rosas, o Sesc, o Itaú Cultural, a Japan House, O Centro Cultural Coreano, o Masp. O Masp está com exposição do Monet e do Renoir. Custa quase R$ 80 o ingresso [R$ 75 a inteira], mas vai ser gratuito. Todas as atrações da Virada serão gratuitas. Pinacoteca, Museu do Imigrante, Museu das Favelas. Vamos ter hip-hop, K-pop na Oficina Oswald de Andrade, no Bom Retiro.
Vai ser uma Virada mais diversa?
Vai ter do gospel ao Sepultura, vai ter do circo ao balé do Theatro Municipal. Essa Virada representa o que é São Paulo, uma cidade multiétnica, multicultural, com povos de todo o Brasil e de todo o mundo. Vai ter um pouco esse sentimento.
O Theatro Municipal foi muito importante como palco nas primeiras Viradas Culturais, trazendo artistas de peso. Por que vocês desistiram de levar a programação de shows para o teatro?
Nós não desistimos. Quando eu assumi a Secretaria, as datas da Virada não tinham sido reservadas. Porque o Theatro Municipal tem assinantes e não tinha horário. Agora eu reservei para o ano que vem. Vai ter uma apresentação do Eduardo Gudin à meia-noite, uma da Wanderlea às 11h. Mas a Praça das Artes, que é parte do Municipal, vai ter coro, orquestra, balé.
Nessa Virada há um esvaziamento de grandes shows internacionais. Por que a opção de não trazer grandes nomes de fora como houve em outras edições?
Nós estamos trazendo estrangeiros, tem um palco na República com pessoas do jazz e do soul, praticamente todos internacionais.
Sim, mas não são artistas de grande expressão, não tem uma Lady Gaga, certo?
Eu queria que você entendesse o seguinte. Eu estou a 140 dias na Secretaria de Cultura. Tomei posse no dia 2 de janeiro. No dia 25 de janeiro tive que entregar o aniversário de São Paulo, em seguida o Carnaval e agora a Virada. É um processo. Se eu continuar na secretaria, a maior Virada Cultural não vai ser essa, vai ser a do ano que vem. Porque nós vamos acertar essas coisas todas. Eu tive pouco tempo, e eu sou de gestão pública, não tinha experiência na área cultural. Fui quatro vezes secretário do governo federal em vários governos diferentes. Então foi todo um processo de aprendizagem e, no ano que vem, com certeza será melhor do que esse ano. Nós vamos buscar atrações internacionais a partir de agora, vamos pedir para os consulados indicarem. Enfim, vamos começar a montar a virada cultural de 2026 às 20 horas de domingo.
Durante a Virada está acontecendo um grande festival, repleto de nomes internacionais de peso. Como o senhor vê a concorrência com o C6 Fest?
Talvez eles não tivessem conhecimento da data, mas São Paulo tem espaço para todos. E eu acho que a partir do ano que vem ninguém vai querer marcar nenhum evento nesse dia, como era antigamente.