Quem luta contra a paz em Israel?
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O pior cenário a partir daqui é uma guerra, uma guerra em três frentes. As Forças de Defesa de Israel estão combatendo Gaza. Mas e a fronteira com o Líbano? Se o Hezbollah, que como o Hamas é financiado pelo Irã, começa a atacar por lá, é uma nova frente. E se levantes ocorrem na Cisjordânia, que fica na fronteira oriental de Israel, pronto. São três frentes. Vira uma guerra bem pouco trivial. Não quer dizer que Israel tenha o risco de perder um conflito assim, não tem. Mas pode ser uma guerra que dure um tempo e que mate muito. Principalmente civis inocentes.
Por isso que é sempre importante entender o que está acontecendo. E entender não é se alinhar naquela matriz, se eu sou de esquerda estou com os palestinos e, se eu sou de direita, com os israelenses. O mundo não se encaixa nessa fórmula. A jornalista britânica Helen Lewis fez uma observação direto ao ponto esses dias, quando viu uma nota de apoio do grupo Queers for Palestine. Sabe, Mahmoud Ishtiwi, um dos principais comandantes do Hamas, foi executado em 2016 por ordens da liderança do bando. Havia sido considerado um dos heróis do conflito de 2014 contra Israel, ainda assim foi executado. Por quê? Foi acusado de depravação moral. Isso quer dizer que foi acusado de se relacionar sexualmente com outro homem.
Vejam, para padrões progressistas, o Hamas é indefensável. O grupo é antissemita. Ou seja, é racista. O Hamas é misógino, em seu modelo de casamento, a mulher serve ao homem. E é virulentamente homofóbico. É isso. Soldado é executado perante julgamento pelo crime de manter relações com outro homem. Viver em Gaza, a terra governada pelo Hamas, é uma espécie de Conto da Aia.
Percebe que não faz nenhum sentido para alguém que seja progressista e democrata e defenda direitos iguais para todos defender o Hamas? O Hamas é um talibã. Seus valores se aproximam mais dos de bolsonaristas mais radicais.
Isto posto, neste momento há uma crise humanitária que se estabeleceu em Gaza. Mais de um milhão de pessoas se deslocaram, deixaram suas casas. Isso num território com pouco mais de dois milhões pessoas. É quase metade da população. Segundo as contas das autoridades em Gaza, já morreram quase três mil pessoas. Toda a faixa está sem luz, a água potável está acabando e o combustível também. A ONU acusa o Hamas de ter confiscado combustível emergencial de suas estruturas de atendimento à saúde.
Existem três saídas de Gaza. Duas, Erez e Kerem Shalom, ficam em Israel. O ataque do Hamas foi feito por Erez, danificou os portões, e Israel deu ordens para que ambas fossem cerradas para não haver risco de mais entrada de terroristas. Sobra, então, Rafah, que é a entrada pelo Egito. A gente fala pouco dos egípcios, mas eles são tão ciosos quanto os israelenses de regular muito a entrada e saída. Todo mundo, da ONU aos Estados Unidos, até o Brasil, pressionam o Egito para abrir Rafah para entrada de suprimentos humanitários, saída de feridos e estrangeiros. Além de temer a entrada em seu país de terroristas do Hamas, os egípcios também não querem ver acampamentos de refugiados na península do Sinai.
A cada dia que esta passagem não é liberada, a coisa coisa complica mais. Mas se este é o cenário pior, qual é o cenário melhor?
Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.
De quem é Jerusalém? Quem merece a terra de Israel? Ou deveríamos chamá-la Palestina? Aliás, há quanto tempo esse conflito existe e por quê? Eu e o Leonardo Pimentel fomos alguns milênios para trás e trouxemos o conflito até os anos 2000 para entender o enrosco. Se você gosta muito de história, está tudo contado no site do Meio. Para assinantes premium. Que, aliás, ganham muito mais do que só isso. Vai lá. Assine.
E este aqui? Este é o Ponto de Partida.
Não dá para cansar de repetir. O que tem de ser defendido é um tipo de política, não um povo ou outro. A política por defender é uma só: a criação o quanto antes do país Palestina. Isto quer dizer que é preciso encontrar formas de dar força para aqueles que apostam num projeto de paz com formação de dois Estados. É isso que beneficia os dois povos.
Qual é o caminho para a paz?
Primeiro: o Hamas não é interlocutor possível. Porque o Hamas tem como seu programa a destruição de Israel. Não quer a paz, quer o fim de Israel. O Hamas precisa ser isolado.
Dois: Israel precisa conseguir costurar acordos de abertura diplomática com a maior parte dos países do oriente Médio. Precisa deixar de ser um pária.
O problema é o seguinte. Durante décadas, os movimentos palestinos disseram para seu povo que o objetivo era eliminar Israel. Em algum momento vão ter de dizer que Israel fica. Para isso, esses líderes políticos precisarão ter o respaldo de outros líderes árabes. Egito, Jordânia, Emirados Árabes, Arábia Saudita. Quanto mais gente assina junto, mais fácil para os líderes palestinos venderem a paz.
É por isso que o Hamas fez o ataque de Sábado, 7 de outubro. Para implodir um acordo que se aproximava de ser concretizado com a Arábia Saudita.
Foi também por esta razão que, por duas vezes, líderes palestinos recusaram um acordo de paz que estava na mesa. Em 2000 foi a vez de Yasser Arafat e, em 2008, de Mahmoud Abbas. Ambos temiam não ter respaldo para dizer que o território hoje ocupado por Israel não seria parte de uma grande Palestina no futuro. Este acordo pode voltar à mesa no futuro. Quando voltar, é fundamental que as condições tenham sido preparadas para que ele seja aceito. Hamas fora e acordos diplomáticos na região são a chave.
Três: Israel, hoje, é um problema. O último primeiro ministro que pôs na mesa um acordo de paz, aliás o acordo mais ousado já proposto por Israel, foi Ehud Olmert. Do partido de Benjamin Netanyahu. É inconcebível que Netanyahu oferecesse algo do tipo neste atual governo.
O governo que ele montou é um governo que divide Israel. É um governoque propõe o enfraquecimento da Suprema Corte. É um governo que prefere políticos que vociferem de forma raivosa contra a oposição em detrimento de erguer pontes.
É bom entender que Bibi, o primeiro ministro, botou gente incompetente em vários cargos chaves da segurança. E fez isso por razões ideológicas. Pela primeira vez na história de Israel, pilotos reservistas chegaram a produzir um documento afirmando que não voltariam ao serviço se fosse para defender este governo. Voltaram, a situação era extrema, mas alguém acha que o Hamas não prestou atenção? Claro que prestou.
Atacar um país dividido é mais fácil do que atacar um país unido. Israel precisa deixar a extrema-direita, abandonar os ataques de seu governo à sua própria democracia. O grande mal das extremas-direitas do mundo é esta cisão das sociedades.
E aí vem um ponto quatro. É tão importante quanto os outros. É preciso renunciar ao antissionismo. O sionismo é um movimento com muitas vertentes, da esquerda à direita, com um único propósito, realizado enfim por resolução da ONU em 1947. Fundar um estado judaico. Depois de milênios de perseguição, após o holocausto, criou-se enfim um Estado nacional para os judeus.
Ser sionista é isso. Ser a favor da contínua existência de um Estado judaico ali. Isto não é em nada incompatível com a ideia da existência de um Estado palestino.
Só que da maneira como a palavra é usada em inúmeros movimentos de esquerda, parece uma ofensa terrível. Ser contra a existência de Israel é ser contra a paz com formação de dois Estados. Qualquer um que se junta a vozes no mundo contra a existência de Israel pode achar que está com a melhor das itnenções, mas está boicotando o processo de paz.
A gente não precisa mais de gente que boicote a paz.
O Jerusalem Post publicou, na sexta-feira, uma pesquia que mostra que 56% dos israelenses defendem que Bibi renuncie ao comando do país após o conflito. Este número impressiona: 86% dos entrevistados acreditam que a falha foi do governo em não prevenir o araque. E, olha, 94% acreditam que o governo é responsável por não estar preparado a reagir para impedir a matança.
Esta é a janela de esperança para depois da tragédia. A tragédia em si já está em curso.
No início do vídeo falei que o pior cenário era o de a guerra se alongar com três frentes simultâneas. Gaza, Cisjordânia e a fronteira com o Líbano. Isso ocorre se o Irã decidir influenciar os grupos que patrocina. A principal americana, neste momento, não tem nada a ver com Israel ou Palestina. É mandar um sinal após o outro para Teerã. Para que não se meta.
Mas se temos um conflito que se alonga no Oriente Médio e somamos isto à Guerra da Ucrânia, de repente são duas guerras importantes em pontos do mundo onde a geopolítica é delicada. O historiador Niall Ferguson, num artigo do Times, fez uma provocação. E se neste cenário de conflito aberto em zonas petroleiras leva a China a fazer uma aposta e, de repente, impor um bloqueio naval a Taiwan.
O País do Centro considera este seu território, assim como a Rússia considera a Ucrânia parte de sua esfera de influência. Que deveria estar sob seu controle. De Taiwan saem os mais sofisticados chips de tudo o que usamos. Carros, geladeiras, computadores, celulares. Tem coisa que vem da China, da Coreia do Sul, mas é aquela coisa. O mais importante polo é Taiwan.
O impacto sobre a economia do mundo é catastrófico. E a situação, a crise, vai esquentar. As tensões vão aumentar. Porque há um bloco antiamericano que se formou, não é? Rússia e China o lideral, com Coreia do Norte e Irã em seu encalço, fazendo os favores que lhe cobram.
Esta guerra pode não parar em Israel. E o único caminho segue sendo o da paz com a formação de dois estados. E isso inclui dar força para quem aposta neste projeto e esvaziar quem tenta detoná-lo. O Hamas é só o primeiro da lista.