Bolsonarismo em semana de alta

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Ontem, quando já era tarde da noite, o Senado aprovou um projeto de lei que limita muito as saídas temporárias de presos no Brasil. Projeto relatado por Flávio Bolsonaro, tá? E é importante a gente entender o que aconteceu ali por um motivo que vai muito além do debate sobre segurança pública. O que o Senado mostrou, ontem, é o tamanho do peso do voto de direita, do voto conservador, no cenário político do Brasil. Porque, dos 81 senadores, 62 votaram a favor, dois votaram contra, e o resto preferiu não dar as caras.

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Cid Gomes, do PSB do Ceará, e Rogério Carvalho, do PT de Sergipe. Os únicos votos contrários.

O que a lei dizia era o seguinte: todo preso, com exceção de quem cometeu crime hediondo que resultou em morte, pode ter o direito de sair temporariamente da cadeia se cumprir alguns requisitos. Bom comportamento, ter cumprido um sexto da pena se for primário ou um quarto, se for reincidente, e tiver autorização de um juiz. Essas saídas acontecem em datas comemorativas, mas também para quem está fazendo curso profissionalizante ou alguma atividade ligada à ressocialização.

Se a lei ficar como foi aprovada no Senado, tem uma turma que perde esse direito. Além dos condenados por crime hediondo, estão fora aqueles que cometeram crimes com violência ou grave ameaça. Além disso, ninguém mais tem direito a saidinha em data comemorativa. Só vale para estudar ou trabalhar. Vai reduzir muito quem pode e quando pode. Hoje, mais de 95% dos presos beneficiados com a saidinha voltam quando devem. É gente demais seguindo as regras pra cassar esse direito. A Câmara ainda precisa aprovar a coisa como o Senado deixou. A Câmara é mais bolsonarista que o Senado.

Por trás desse tipo de decisão está uma pergunta. Para que serve cadeia? Por que a gente prende as pessoas? Uma resposta é punir. Outra resposta é recuperar. Uma terceira é afastar da sociedade quem oferece perigo. Cadeia tem os três objetivos e dependendo de como você entende sociedade vai botar mais ênfase num lado ou no outro. O instinto conservador tende a ir pelo caminho da punição. A reação de bate pronto da pessoa conservadora é de afastar e punir.

O Brasil é um país que gosta de punir. A gente prende muito, prende por pouco, com frequência sem julgamento ou sem lá muito direito de defesa. A gente tortura, e torturamos fartamente. Representantes do Estado brasileiro torturam. Sempre torturaram. A gente lincha muito. Somos um dos países campeões em linchamento. Tem vários grupos de WhatsApp, grupos populares, que a toda hora têm vídeos de meninos pegos batendo carteira, gente acusada de estupro, de roubo, apanhando sem clemência no meio da rua. Coisas duras de ver. Sem julgamento, sem prova, só na base da raiva, da explosão popular. Vídeos nos quais a mensagem típica é: bem feito, aprende.

Só que a gente é também, ao menos é isso que nossa Constituição determina, uma Democracia Liberal. Numa democracia liberal, tirar a liberdade de alguém ir e vir é uma decisão que pode ser tomada, mas é também uma decisão muito grave. Então punir, filosoficamente, conta, mas conta muito menos. Tirar de circulação quem oferece perigo é importante, ressosiabilizar é fundamental. Você tira a liberade para devolver assim que for possível. As saidinhas são isso. É o jeito de o cara não enlouquecer na cadeia, manter contato com o mundo lá fora, se preparar para quando a liberdade retornar. Saidinha é fundamental para que o sistema funcione minimamente bem, sem piorar as pessoas lá dentro. O nosso sistema já funciona muito mal. Sem essas saidinhas, será pior. As cadeias vão virar uma panela de pressão pior.

Pro parlamentar de direita, é fácil simplesmente dizer não pode, não dá, é tudo bandido. Não tem de ter colher de chá. Não tem de tratar bem. Punir, punir, punir. Mas, olha, as leis que temos hoje foram aprovadas por parlamentares brasileiros. Se estão mudando agora, se estão bolsonarizando a coisa, não é à toa. Se a liderança do governo percebeu ontem, no Senado, que não ia conseguir segurar a avalanche de direita, também há razão de ser. O problema, em essência, é que no momento está dando muito pouco voto tratar tecnicamente o problema da criminalidade. E está dando muito voto tratar a coisa na base do bandido bom é bandido maltratado.

Essa me parece uma coisa que a militância de esquerda não está percebendo. O clima do Brasil está ainda bem mais para lá do que para cá. E o lado de lá é iliberal. Um dos maiores riscos, para qualquer grupo político, é o de se alienar. É o de não entender em que ambiente está caminhando. E, com a internet, é muito fácil se alienar. É muito fácil viver num mundo em que tem tanta gente à sua volta falando as mesmas coisas que você pensa que, até parece, as ideias são senso comum, todo mundo concorda. Não é. E Bolsonaro vai juntar uma turma, na Avenida Paulista, no domingo que vem.
Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.

Você por algum motivo precisa falar com jornalistas de vez em quando? Isso é algo que mexe com os nervos? Precisa falar no vídeo? Precisa se comunicar pelas redes? Existe um tipo de curso, que é o de media training, em geral muito caro, mas que ensina os traquejos. Bem, aqui no Meio a gente é do ramo. A gente sabe falar pra câmera, nós somos jornalistas, e somos digitais. E a gente vai oferecer um curso de media training. Um curso que cabe no seu bolso. Chamamos para isso três feras, três especialistas na coisa. Leila Sterenberg, Natália Lima e Elis Monteiro, que vão dar aulas de media training, essencial para quem quer construir uma marca pessoal ou empresarial que seja forte no mundo digital. Assinante do Meio tem 20% de desconto, tá? Só esse desconto já quase paga a assinatura premium. Assina o Meio, pega o desconto e já assiste à primeira aula. Vai ser no dia 29 de fevereiro, ao vivo, com a Leila.

E este aqui? Este é o Ponto de Partida.

Conversei com uma pessoa que trabalha no Palácio do Planalto, hoje de manhã. O receio que esta pessoa me manifestou é um que outros, no governo, têm. O de que a fala do presidente Lula comparando Israel com Hitler tenha turbinado a manifestação que Bolsonaro convocou para a Paulista. Pois é, não é algo que pareça fazer sentido para quem está nas redes de esquerda ou lendo, principalmente, os veículos de esquerda. Pelo contrário. O que parece é que Lula acertou um golaço. Há quem diga que Lula até reorientou a política externa de Europa e Estados Unidos.

A turma da Quaest fez uma análise das redes socias. Acompanhou Facebook, X, o Twitter, Instagram e TikTok. Nas horas seguintes ao comentário do presidente, as reações nas redes foram muito negativas. 90% das menções foram críticas a Lula. 90%. E não foi pouca gente falando, não. Desde o início de 2023, ou seja, mais de um ano, foi o terceiro assunto mais comentado do Brasil. Só a intentona bolsonarista de 8 de janeiro e a operação da Polícia Federal contra os golpistas rendeu mais papo.

A coisa melhorou para o governo de segunda para terça-feira. O Planalto trabalhou duro: a primeira-dama foi às redes, alguns ministros, houve uma mobilização para tentar virar o jogo. Lançaram mão da velha hashtag olavista, né? Tem Lula Tem Razão no Twitter até dizer chega. Mas mesmo com o trator em pleno funcionamento para mobilizar as pessoas, 59% das manifestações seguiram negativas. De novo, números da Quaest. Com a máquina do governo funcionando a pleno vapor, ainda assim não foi possível reverter. Foi nessa hora que o pessoal no Palácio do Planalto começou a torcer pra que se mudasse de assunto o mais rápido possível.

Enquanto isso, o bolsonarismo já estava trabalhando as suas redes. Desde pataquadas como o pedido de impeachment ao convite para que o embaixador de Israel fosse estar lá no palanque com Bolsonaro. Tem material seduzindo evangélico com o mote Israel que não acaba mais.

Isso não tem nada a ver com Israel ou Gaza. Isso tem a ver com política interna brasileira. A população evangélica tem uma visão particular a respeito de Israel, por conta da Bíblia. Porque o retorno de Cristo será lá, da maneira como os pastores entendem. Isso cria um elo emocional.

Bolsonaro está pedindo às pessoas que façam número para ele fazer uma demonstração de força. Ele precisa de alguns quarteirões da avenida Paulista cheios. Por que pede isso? Porque não só tentou dar um golpe de Estado como deixou um rastro de Zaps, de documentos e de testemunhas de como o planejamento se deu. Isso foi investigado pela Polícia Federal, a coleção de provas não é pequena e o risco de ele, assim como alguns generais quatro estrelas e um ex-comandante da Marinha terminarem presos não é pequeno.

Preso ou não, Jair Bolsonaro segue sendo popularíssimo. Segue tendo algo que, até hoje, apenas Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu ter na história da Nova República. Uma base cativa de votos tão grande que o garante no segundo turno de qualquer eleição presidencial. No cenário atual, se Bolsonaro não pode ser presidente, ele escolhe quem vai para o segundo turno.

Enquanto isso, Lula se afasta do Centro. Como se não tivesse vencido por uma margem mínima. Uma margem que só se deu porque, ora, do outro lado estava um golpista.

As redes enganam. Elas enganaram os bolsonaristas, em 2022. Eles tiveram a impressão de que a vitória era inevitável. Enganaram muita gente de esquerda agora esses dias, com a impressão de que Lula havia ganho esse debate. Não enganam os profissionais, tá? A turma no Planalto sabe que, politicamente, foi ruim e talvez, apenas talvez, tenha dado uma força que o principal adversário estava precisando.

A principal missão de Lula é cuidar do Brasil, é diminuir o tamanho do movimento bolsonarista. A democracia brasileira precisa disso. Isso se faz trazendo para mais próximo do centro quem escorregou pra extrema direita. Alimentando só a esquerda, não vai funcionar.

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