Lula subiu no telhado
É hora de quem é de esquerda abrir o olho. Este escândalo do INSS pode ser muito maior do que o Petrolão. Pior porque o rombo na Petrobras, dinheiro desviado por corrupção, por roubo, foi de 42 bilhões de reais. Agora estamos falando dum total que pode chegar a 90 bilhões. Pode chegar. Não sabemos o valor e é importante não se precipitar. Mas está claro que o número é nas dezenas de bilhões. Só que não é só isso. O prejuízo, no caso da Petrobras, são os investidores que compraram ações da empresa e, em última análise, o povo brasileiro. O povo é uma abstração. Ninguém viu dinheiro sumir da sua carteira, foi o Estado que geriu mal o que é estatal. Agora é muito diferente. Estamos falando de aposentados e pensionistas. Pessoas pobres, pessoas frágeis, pessoas às vezes em desespero, pessoas para quem cada centavo conta, gente que muitas vezes tem dificuldades cognitivas por conta da idade. E esse dinheiro que foi desviado saiu diretamente do bolso delas.
O grande problema para a esquerda, neste momento, é que a militância não está equipada para lidar com um problema destes. Acostumou-se a repetir que Lula foi preso, na esteira no Mensalão, por perseguição política. Alguns até devem acreditar que toda a Operação Lava Jato era um complô das elites contra o PT.
Houve perseguição política pelo juiz Sergio Moro, sim. Houve, também, incompetência. E, entre os desvios de conduta de Moro e a incompetência dos procuradores de Curitiba, foram tantos os absurdos no julgamento da primeira instância que o caso ruiu por razões técnicas. Moro forçou a barra ao julgar Lula. Não havia como provar conexão direta entre o roubo gigante na Petrobras e o apartamento e o sítio que o presidente teria ganhado das empreiteiras. Se qualquer presente que Lula tenha ou não ganhado não está diretamente conectado à Petrobras, Moro não tinha que julgar Lula. Moro era juiz do Petrolão. Não de desvios pessoais do presidente. O caso dos imóveis tinha de ter ido pra primeira instância em Brasília.
Mas é isso. Lula é presidente por inépcia e arrogância do juiz e dos procuradores. E, ao comemorar a libertação de Lula, depois sua eleição contra Bolsonaro, um bom pedaço da esquerda se esqueceu do seguinte: a Petrobras foi barbaramente assaltada durante o governo Lula. O roubo aconteceu, foi registrado oficialmente nos balanços da empresa. É o maior caso de corrupção reconhecido oficialmente pelo Estado brasileiro em sua história.
E agora temos este mostro com o qual lidar. A investigação está apenas começando. O governo, o PT e a esquerda têm um problema real que enfrentar e um problema de estratégia política. Fingir que o problema existe não é solução para nada.
Porque, vejam, Ciro Gomes está muito certo. O Palácio do Planalto demitiu o ministro da Previdência, Carlos Lupi, do PDT, e alçou ao cargo o número dois da pasta, Wolney Queiroz, também do PDT. Tecnicamente, Lupi pediu demissão. É aquele pedido de demissão que funciona assim: o chefe liga, diz que você está fora, mas para não ficar mal podem todos fingir que você pediu pra sair.
A bancada do PDT na Câmara dos Deputados deixou a base do governo. A do Senado, não, essa continuou com o governo. Taí um partido disciplinado, que sabe o que quer, ideologicamente coerente. Resta a pergunta sobre como agirá o PDT na Câmara. Vai votar com os bolsonaristas a partir de agora?
Segundo Ciro, Lula tratou Lupi como um fusível. Demitiu o presidente do PDT para se proteger. Os verdadeiros responsáveis pelo desvio, de acordo com Ciro, são Michel Temer, Jair Bolsonaro e o próprio Lula.
É claro que ele está certo. O presidente da República é o responsável principal por qualquer coisa que ocorra em seu governo. Mas, ao mesmo tempo, o que ele quer dizer? Sua tese é de que ministro de Estado não tem qualquer responsabilidade? Vejam, Ciro Gomes, ao tentar defender Lupi, está também muito errado. Então, para ele, Carlos Lupi, sendo o ministro que comanda o sistema previdenciário do país, não tem nada com o problema? Claro que tem. A principal responsabilidade de Lula nessa história, aliás, é justamente a de ter escolhido um ministro que nada fez a respeito.
Falta um ano e cinco meses para a eleição. A popularidade de Lula está em queda. A direita está dividida. E uma bomba arrasa quarteirão foi acesa em Brasília. E você? Você entende o tamanho da explosão que pode vir? Entende o que aconteceu?
Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.
Eu realmente acho divertido quando, às vezes no mesmo vídeo, vem um “ele é comunista” e um “ele é bolsonarista”. Não é à toa que somos atacados pelos dois lados. A gente não joga em cima do muro. O Meio preza pela liberdade. Liberdade para discordar. Para ouvir direita e esquerda. Para pensar diferente mesmo que as pessoas tenham congelado na polarização. O Meio é lugar de conversa. É onde você se informa sobre política, economia, cultura, tecnologia e atualidades ouvindo diferentes pontos de vista de gente que trabalha com fatos, com números, com análises qualificadas. Temos streaming com filmes que não repetem o que está por aí e te fazem saber mais e pensar diferente. Nossa Edição de Sábado mergulha em debates atuais para você saber como opinar sem replicar discurso. O Meio Político é um conteúdo especial semanal para entender o cenário em Brasília e o que está rolando no cenário político. Vem conhecer o Meio Premium. Caso você não goste, o que eu duvido, o cancelamento é zero burocracia. Leia. Assista e compreenda o que é essencial para sair das bolhas.
E este? Este é o Ponto de Partida.
Primeiro ponto: começou no governo Temer? Começou. Engrenou no governo Bolsonaro? Engrenou. Mas multiplicou-se em muitas vezes a partir de 2023, quando Lupi estava cuidando do galinheiro e, Lula, havia assumido o Planalto. Não adianta dizer que já vinha de antes. O problema era pequeno e ficou muito grande. Segundo a Corregedoria Geral da União, o valor dos descontos feitos nas pensões e aposentadorias por sindicatos foi de 706 milhões de reais. Em 2024 foi de quase três bilhões. Mais do que triplicou.
E este é um dos roubos. O roubo menor, pelo qual Lupi caiu. Os sindicatos faziam descontos falsificando a autorização dos beneficiários. Tem um roubo bastante maior que é o dos empréstimos consignados.
Neste caso, não são sindicatos, mas bancos e principalmente cooperativas de crédito ligadas aos sindicatos que desviam dinheiro. O maior deles, a Contag, é ligada na medula ao PT. Pois então, aposentados e pensionistas podem contrair empréstimos usando o benefício do INSS como garantia. Aí, todo mês desconta a parcela do empréstimo. O esquema funcionava da seguinte forma: alguém pegava o empréstimo, falsificava a assinatura da aprovação, e todo mês o pobre coitado que nem sabia da coisa era descontado daquela parcela.
No ano de 2023, 35 mil pessoas reclamaram com o TCU de financiamentos desse tipo que não haviam autorizado. Como o total do consignado via INSS é de quase 90 bilhões de reais, não sabemos ainda qual o tamanho da coisa.
A esquerda tem dois caminhos. O primeiro é o de negar, gritar que todo mundo é fascista. Ser espertinho tipo Ciro Gomes e dizer eu sou limpinho, a sujeira é toda do outro.
O outro caminho é abrir uma investigação absolutamente transparente, responsabilizar rápido todo mundo que precisa ser responsabilizado e falar honestamente com a sociedade.
O governo, porém, está que nem barata tonta. O Planalto demorou uma semana para demitir Lupi e Lula sumiu, não fala sobre o assunto. É um pouco como se estivesse torcendo para sumir. Não vai sumir. É roubo e roubo de velhinhos. Muitos escândalos de corrupção são abstratos. Estes são concretos. Uma legião de brasileiros está olhando para seus contracheques de aposentadoria e pensão, seus holerites, e gente demais está descobrindo que também foi descontado.
Já tem vídeo do deputado Nikolas Ferreira, de longe o melhor comunicador do bolsonarismo, explicando cada detalhe, distorcendo uns poucos, e acumulando milhões e milhões de views. Esse negócio não vai sumir.
O ponto é o seguinte: aqueles 20% de brasileiros muito leais ao presidente Lula o defendem com ardor. Com paixão. Com convicção. Tudo certo. Lula não é percebido pelos outros 80% como um cara honesto. O PT é um partido com fama de corrupto. Lula ganhou a eleição? Ganhou. Por uma mínima margem, mais brasileiros acharam que Bolsonaro era uma alternativa pior.
Muita gente na esquerda acreditou que aquela eleição foi um reset, que o jogo zerou, nova vida. Não foi. A fama continua de pé. E um incontável número de brasileiros, quase metade da sociedade, continua achando inacreditável que um governo que se mostrou tão corrupto tenha voltado ao poder. São pessoas que não entendem que Bolsonaro era uma ameaça à democracia. Ou, bem, pessoas que não estão preocupadas com democracia.
Na eleição do ano que vem, Bolsonaro não estará na cédula e não parece que vai ter candidato com general de vice. Muitos dos que votaram em Lula votaram a contragosto. Porque o acham corrupto. Porque acham o PT inepto na gestão da economia. Está ficando cada vez mais fácil construir uma chapa de oposição.
Se apenas dois por cento dos que votaram em Lula votarem contra ele, na próxima eleição, o PT deixa o governo. E deixa com fama de corrupto, com Lula indo pra aposentadoria política. Sabe quando a esquerda vai reconstruir sua imagem? Vai demorar e muito.
A chance é agora. Investigação ampla, geral, transparente. Já. Mas Lula achou mais negócio sair calado para ser fotografado entre Vladimir Putin e Nicolás Maduro. Às vezes parece que não entendeu como o mundo da política em redes sociais funciona.