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Um balanço preliminar do conflito Israel-Hamas

Foto: Omar Al-Qattaar/AFP

Como a guerra influencia a política do Oriente Médio e qual é a viabilidade de um cessar-fogo permanente

Balanços sobre processos históricos são sempre temporários. Mais ainda em relação a uma situação fluida, como o atual acordo de cessar-fogo entre Israel e Hamas. Dentro destes limites, finalizada uma fase do conflito iniciado no dia 7 de outubro de 2023, podemos fazer uma avaliação de suas consequências até o momento.

Para realizar um balanço, devemos considerar tanto os objetivos que ambas as partes, explicita ou explicitamente, se colocaram, como os resultados inesperados ou não-intencionais produzidos pela dinâmica do conflito.

O Hamas, ao que tudo indica, tinha como objetivo principal paralisar a negociação em curso entre Israel e Arábia Saudita, que levaria a um acordo que marginalizaria o Hamas e afastaria as possibilidades de eliminar o Estado de Israel. Ele contava com o apoio de um levantamento palestino na Cisjordânia, do Hezbollah e eventualmente do Irã. Possivelmente a decisão de atacar, pelo menos o momento de fazê-lo, levou em consideração que a população de Israel se encontrava dividida e mobilizada em torno das medidas propostas do governo que atacavam a autonomia do poder judiciário.

O resultado inicial do ataque significou um golpe na imagem das forças armadas e da inteligência de Israel, tanto em relação a população do país, mas também na sua imagem exterior.

O resultado inicial do ataque significou um golpe na imagem das forças armadas e da inteligência de Israel, tanto em relação a população do país, mas também na sua imagem exterior — um elemento importante de capacidade de dissuasão frente a potenciais ataques inimigos. Levou também a uma paralisação das negociações com a Arábia Saudita.

Depois de mais de um ano, os resultados para o Hamas são, em grande medida, decepcionantes. O conflito levou à perda de vidas humanas, e a destruição material enfraqueceu seu apoio na população de Gaza. Boa parte de seu arsenal, incluindo o sistema de túneis que era um elemento central de sua estratégia militar, foram destruídos, e boa parte de seus líderes, eliminados. O levantamento esperado da população palestina na Cisjordânia não aconteceu. Seu principal aliado, o Hezbollah, sofreu uma enorme derrota, levando-o a aceitar um cessar-fogo unilateral com Israel e diminuindo parte de sua influência e poder de veto na vida política do Líbano, que nomeou um presidente e um primeiro-ministro que em outras circunstancias não teriam sido escolhidos.

O conflito por sua vez, ainda que indiretamente, favoreceu a queda do governo do Assad na Síria, principal lugar de passagem de armas do Irã para o Hezbollah.

A negociação de Israel com a Arábia Saudita foi suspensa, mas somente adiada, e acordos de paz de Israel com os países do Golfo permaneceram inamovíveis.

Finalmente, o Irã não só perdeu seus principais próxis em caso de uma guerra com Israel como mostrou uma frágil capacidade de defesa antiaérea, quando Israel revidou, destruindo parte de seu sistema de defesa.

Em suma, o saldo da guerra para o Hamas, sem considerar a enorme tragédia humana, foi fundamentalmente negativo.

Possivelmente o único saldo positivo foi um amplo movimento de setores da opinião pública mundial de apoio a causa palestina. Sua importância prática é difícil de julgar, mas como organização não compensa os custos sofridos.

Em Israel, a reação inicial da população após o ataque foi uma impressionante mobilização da sociedade civil, apoiando a frente interna e o esforço de guerra. As forças armadas e a inteligência militar israelenses, por sua vez, demostraram que, apesar das trapalhadas do 7 de outubro, são extremamente eficientes.

A derrota sofrida pelo Hamas, o enfraquecimento do Hezbollah, a queda de Assad e a fragilidade militar exposta pelo Irã fortalecem geopoliticamente Israel e os países árabes que consideram Irã seu principal inimigo.

Se houve ganhos importantes para Israel, em particular em termos geopolíticos, alguns haveres devem ser mencionados. O poder militar israelense se mostrou extremamente eficaz, mas também ficou explícita a dependência do fornecimento de armas pelos Estados Unidos. A perda de apoio em setores da opinião púbica internacional não pode deixar de ser mencionada.

O consenso inicial da guerra em Israel foi se diluindo pelas manobras do governo em torno da negociação de retorno dos reféns, dividindo o país. Inicialmente, a escolha entre negociar o retorno dos reféns e destruir o Hamas parecia exigir ter que optar por uma ou outra possibilidade. Com o passar do tempo, destruídos os principais alvos militares, a postergação das negociações produziu uma enorme mágoa em amplos setores da opinião pública.

O ataque do 7 de outubro levou ao primeiro-ministro a colocar como objetivo da guerra a destruição da capacidade militar e política do Hamas. O objetivo anunciado pelo primeiro-ministro não se realizou, o Hamas continua presente em Gaza, ainda que diminuído, com capacidade militar e administrativa frente a uma população sem possibilidade de se expressar politicamente.

O objetivo de destruir ou diminuir radicalmente a presença do Hamas, para ter algum fundamento na realidade, só pode ser realizado dentro um projeto político, de longo prazo, capaz de equacionar o tema palestino.

Na realidade, o objetivo de destruir ou diminuir radicalmente a presença do Hamas, para ter algum fundamento na realidade, só pode ser realizado dentro um projeto político, de longo prazo, capaz de equacionar o tema palestino. E aqui se localiza a principal fraqueza de Israel. A capacidade e inteligência demostrada no plano militar não se reproduz no plano político. Pelo contrário, o governo, onde um primeiro-ministro com vários processos na justiça por corrupção, faz contorções e todo tipo de concessões para se manter no poder, não possui a capacidade apresentar uma solução que desagradará aos setores nacionalistas e religiosos mais radicais.

O futuro é imprevisível, mais ainda numa região particularmente turbulenta. Eleições em Israel, que o governo pode adiar até outubro de 2026, poderão arejar um pouco o governo, mas o país continuará dividido e dificilmente trará mudanças importantes na disposição política da população. Pelo contrário, a guerra envenena corações e mentes.

A orientação do futuro governo da Síria é um ponto de interrogação. Com um país destruído, um governo que se apoia em forças díspares, mas onde grupos fundamentalistas têm um papel importante, deverá enfrentar pressões de seu principal apoiador, a Turquia, para que desarme a província curda autonomizada no norte do país. Por sua vez, os possíveis financiadores da reconstrução econômica da Síria terão sua própria agenda.

A possibilidade de o Líbano de reconstruir suas instituições do Estado exigirá a capacidade das forças armadas de controlar e, finalmente, desarmar o Hezbollah, o que pode produzir uma nova guerra civil.

O Irã passará por embates internos entre acelerar a capacidade de produzir uma bomba atômica — o que levará possivelmente a um ataque preventivo de Israel e/ou os Estados Unidos —, ou rever radicalmente sua estratégia geopolítica e sua inserção na região.

Em todos esses casos, se projeta a sombra do novo governo de Trump e sua disposição a impor uma solução ao conflito, frente a dois atores, o governo de Israel e o Hamas, que por razões diversas, não possuem um espaço mínimo para negociar um acordo de paz ou mesmo um cessar-fogo mais permanente.

O futuro dirá.


*Bernardo Sorj é sociólogo, diretor do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais e do Projeto Plataforma Democrática. Foi professor de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais, do Instituto de Relações Internacionais da PUC/RJ e é professor titular de Sociologia aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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