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Bolsonaro quer isolar o Brasil do mundo

O que você espera de um presidente da República? Bem, primeiro e sobremaneira, acho que a respeito disso temos um consenso, você espera de um presidente que ele defenda seu país de qualquer ataque. Certo? Temos cinco pré-candidatos de oposição à sucessão de Lula. O Brasil sofreu, na semana passada, o pior ataque direto à sua soberania em muitas décadas. Um presidente americano impôs pesadas sanções econômicas ao país exigindo que a Justiça do Brasil tomasse decisões com base no que deseja a Casa Branca. Ou decide como eu quero ou vou punir você pesado. Que ninguém se engane: é um cabresto. É um ataque direto. A mensagem não poderia ser mais clara. Os Estados Unidos exigem ditar como atua o Brasil.

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Veja, não está em debate, aqui, o que você, ou eu, achamos da Justiça brasileira. Eu acho que tem um monte de problemas e tenho muita discordância sobre muitas decisões. Mas é a tal história. Num Estado Democrático de Direito, a Justiça toma sua decisão final, a gente reclama, a gente critica, a gente se opõe, a gente enche a rua dizendo que não quer, tudo dentro do jogo. Mas temos um pacto. A decisão final é a última decisão. Decidido está. Esta é, essencialmente, o acordo num Estado Democrático de Direito. É isto que quer dizer um Estado Democrático de Direito. O que não é tolerável é uma nação estrangeira querendo ditar como decide a nossa Justiça. O que não é tolerável é qualquer nação estrangeira exigindo subserviência.

Pois é. A Temos cinco pré-candidatos de oposição à sucessão de Lula. Como cada um deles se portou.

Tarcisio de Freitas, governador de São Paulo: “Lula colocou sua ideologia acima da economia, e esse é o resultado. Tiveram tempo para prestigiar ditaduras, defender a censura e agredir o maior investidor direto no Brasil. Outros países buscaram a negociação. Não adianta se esconder atrás do Bolsonaro. A responsabilidade é de quem governa. Narrativas não resolverão o problema.”
Narrativas? O presidente Donald Trump escreveu uma carta. Exigiu que a Justiça brasileira não tome decisões sobre empresas americanas. Exigiu que a Justiça brasileira não julgue o ex-presidente que tentou um golpe de Estado. Se o Brasil não obedecer a Donald Trump, vai ser punido. Então o que Tarcisio está dizendo? Está dizendo que o Brasil deve se curvar a Trump.

Romeu Zema, governador de Minas Gerais. “As empresas e os trabalhadores brasileiros vão pagar, mais uma vez, a conta do Lula, da Janja e do STF. Ignorar a boa diplomacia, promover perseguições, censura e ainda fazer provocações baratas vai custar caro para Minas e para o Brasil.”

Ou seja, Lula, Janja e STF, por favor, façam o que os Estados Unidos querem, agora!´

Ronaldo Caiado, governador de Goiás. “O que nos cabe fazer diante da gravidade do momento seria a criação de uma Comissão de Parlamentares, da Câmara e do Senado, com a missão de abrir diálogo com o governo americano. E esclarecer ao povo dos Estados Unidos que não confundam declarações do Lula com o pensamento do povo brasileiro.”

Ou seja, bota o rabo entre as pernas, ignora que o Brasil tem um corpo diplomático que tem a responsabilidade pela Constituição de estabelecer as relações com as outras nações, atropela a Constituição, e vai pedir desculpas pelo governo do Brasil. Vem cá, se Caiado for presidente ele também vai passar pro Congresso suas obrigações de chefe do Executivo?

Ratinho Júnior e Eduardo Leite não se posicionaram. Como não? Bem, ainda há políticos de oposição inteligentes no Brasil. Hoje, Eduardo Bolsonaro saiu dando entrevistas pela imprensa. À Folha de São Paulo, falou o seguinte: “O Trump não usou força total. Ele poderia ter feito muito mais.” Aí, vocês perguntam, o que mais ele poderia fazer? “Ele pode chegar ao extremo de fazer igual a Rússia. Congelou o acesso da Rússia ao sistema swift inteiro, proibiu empresas americanas de fazerem investimento na Rússia, de receberem investimento russo. Ele congelou bem de um monte de oligarca russo.”

Deixa eu traduzir aqui para vocês o que o filho Zero Três está dizendo: Trump pode tirar o Brasil do sistema econômico internacional. Não poderemos mais fazer transferências monetárias para fora do Brasil. Empresas americanas não poderão fazer negócios no Brasil. Os recursos de brasileiros em contas correntes nos Estados Unidos podem ser bloqueados. O Brasil se tornará um país pária no mundo.

Isto não é Eduardo Bolsonaro falando na semana passada. Isso é Eduardo Bolsonaro falando hoje, conforme gravo este vídeo, segunda-feira, 14 de julho, dia da Queda da Bastilha. Ou seja: se o Brasil não atender às exigências da Casa Branca, poderá ser muito pior. Vejam bem, Eduardo Bolsonaro querer é uma coisa, conseguir é outra. Mas o lobby que ele está fazendo faz dois meses já garantiu uma punição para o Brasil que é a pior imposta pelos americanos em todas suas tarifas, com exceção da China. Só foi pior pra China, todo o resto teve menos impacto. E o pior: os americanos vendem mais pra gente do que nós vendemos pra eles. Quer dizer, o critério da punição não foi comercial. Não foi econômico. Foi puramente político.

Nós temos uma família brasileira, a família Bolsonaro, que está trabalhando duro nos Estados Unidos para conseguir a punição coletiva de todo o Brasil. De todos os brasileiros. E como se posicionam Tarcisio, Zema e Caiado? O primeiro reflexo dos três foi ficar do lado dos Bolsonaros.

Isso piora, tá?
Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.

A indústria pesqueira brasileira já teve todos seus contratos de compra pelos americanos cancelada. Todos. Vai ter peixe mais barato no mercado nesse mês. A indústria dos calçados entrou numa crise brabíssima. Onde fica a indústria dos calçados? No Sul e em São Paulo. A turma da pecuária, principalmente carne de boi, está em pânico. Se você entrar hoje num grupo de Zap com os principais nomes do agro, só pancada em Bolsonaro. Estamos falando, aqui, de alguns dos principais financiadores do bolsonarismo. Por que estão por aqui com Jair, com Eduardo, com Flávio, Michele e Carlos? Porque a família decidiu punir a eles, a seus principais financiadores, para tentar conseguir o perdão por seus processos.

Vejam, os Bolsonaros estão há meses tentando vender a tese da anistia. As pesquisas não mostram que tenha gente preocupada com anistia. O brasileiro não comprou a ideia. Aliás, nem os brasileiros bolsonaristas compraram a ideia, já que suas manifestações estão cada vez mais vazias. Até dizem que querem anistia, mas não a ponto de se dar ao trabalho de ir pra rua pedir. Não estão envolvidos emocionalmente com o projeto. E o relógio está lá. Tic, tou, tic, toc. Rodando. O julgamento se aproximando. Então Eduardo Bolsonaro se licenciou de seu mandato e foi desesperado pros Estados Unidos com a intenção de convencer Donald Trump a punir o Brasil para salvar seu pai. Hoje, Bolsonaro foi às redes para dizer que querem “destruí-lo por completo”. Sua solução? Destruir o Brasil por completo para se proteger. Brasil acima de tudo? Bobo é quem acreditou. Se não tiverem o Brasil, estão dispostos a destruí-lo. É só observar suas ações. É só ouvir o que estão falando e acreditar. Veja bem, os Bolsonaros podem ser acusados de muita coisa, mas não de não serem claros. Eles falam exatamente o que pensam. Sempre falaram. Não são cínicos.

Qual foi o erro de Tarcisio, Zema e Caiado? Eles concluíram que precisam de Bolsonaro para ter os votos de Bolsonaro. Precisam apoiar em tudo. E saíram seguindo essa diretriz a ponto de cegarem-se. De pararem de pensar. Não ocorreu a eles que, no momento em que os Bolsonaros começaram a atacar o Brasil, a economia brasileira, eles deveriam defender o Brasil. Escolheram defender Bolsonaro e não o país. Inacreditável.

O que quer, neste momento, um empresário do agronegócio? Resolver. Rápido. O que quer um empresário do aço? Do combustível? De qualquer negócio que exporte para os Estados Unidos? Querem que este problema suma. Ou seja, este não é o momento de ter confusão, de ter gente disputando espaço e criando caos. Quem negocia é diplomata. Ponto. Deixa a diplomacia trabalhar para tentar evitar o pior. E estes empresários sabem muito bem quem criou este problema. Por que sabem? Porque a carta de Donald Trump é clara e porque Eduardo Bolsonaro não é modesto. Ele está dizendo, lá, todo dia, em suas redes sociais. É dele a conquista. Parabéns. Conseguiu mesmo. Donald Trump ouve você.

Nas redes sociais, os Bolsonaros estão levando uma surra. E, olha, não estão nem aí. Porque o importante, para eles, neste momento, não é serem populares. O importante é chantagear o Brasil até conseguirem o que desejam. Os três pré-candidatos erraram muito feito. Romeu Zema e Tarcisio de Freitas estão por aí, aparecendo abatidos, dizendo agora que é a diplomacia brasileira que tem de resolver o problema que os Bolsonaros causaram. Ratinho Júnior e Eduardo Leite, que escolheram esperar antes de se posicionar, jogaram com inteligência.

Na semana passada, antes das tarifas aparecerem, falei num Ponto de Partida que o bolsonarismo estava em declínio. Este declínio pode estar se acelerando. Vejam bem, é cedo para dizer qualquer coisa e estamos a um ano e meio da eleição presidencial. Mas o tabuleiro está se mexendo muito rápido. As peças estão se movendo. E adesão cega ao bolsonarismo, por candidatos da direita, pode começar a ter um custo alto.

Neste exato momento, Jair Bolsonaro, sua mulher e sua prole já não têm mais o apoio irrestrito de boa parte do dinheiro que os apoiava. Essas pessoas não vão virar de esquerda e vão procurar um candidato. A pergunta é a seguinte: que perfil querem? Bolsonaro ajuda ou atrapalha? A resposta não é óbvia.

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