Prezadas leitoras, caros leitores —

Esta é uma edição extra do Meio. É uma notícia grande demais para que esperemos até segunda-feira.

— Os editores.

Lula está livre

Passava pouco das 17h40 de ontem, sexta-feira, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou a sede da Polícia Federal em Curitiba. Livre. Lula vestia paletó de um azul bastante escuro, camiseta num tom azul um tico mais claro, e sorria. A ordem de soltura foi expedida pouco mais de uma hora antes pelo juiz federal Danilo Pereira Junior. Condenado em segunda instância com uma sentença confirmada já pelo STJ, o ex-presidente está no grupo dos beneficiados pela decisão do STF de que o cumprimento da pena só ocorre automaticamente quando a última apelação foi perdida. Lula esteve preso por 580 dias e, durante todo este período, um grupo de fiéis militantes se alternou num acampamento no qual ritualizaram o processo de lhe gritar ‘bom dia’, ‘boa tarde’ e ‘boa noite’. Ao deixar a prisão, foi a eles que escolheu discursar pela primeira vez. (G1)

Discurso de Lula — trecho: “Queridos companheiros e companheiras, vocês não têm dimensão do significado de eu estar aqui com vocês. Não pensei que no dia de hoje poderia estar conversando com homens e mulheres que, durante 580 dias, gritaram ‘bom dia’, ‘boa tarde’, ‘boa noite’. Não importa que estivesse chovendo, que estivesse 40 ou zero grau. Vocês eram o alimento da democracia que eu precisava para resistir à canalhice que o lado podre do Estado brasileiro fez comigo e com a sociedade brasileira. Que o lado podre da Polícia Federal, o lado podre do Ministério Público, da Receita Federal, trabalham e trabalharam para tentar criminalizar a esquerda, o PT, e o Lula. Imaginei que, quando saísse, eu iria poder encontrar cada companheiro da vigília e dar um grande abraço, um grande beijo. Vocês não têm noção do que fizeram. Fiquei fortalecido, corajoso. O lado mentiroso e canalha do Ministério Público e o Moro e mais o TRF-4, eles têm que saber: não prenderam um homem, tentaram matar uma ideia, e uma ideia não se mata. Quero lutar para provar que existe um bando de mafiosos no país e essa maracutaia que fizeram para tentar, liderados pela Rede Globo, criar a imagem de que o PT precisava ser criminalizado e o Lula era bandido. Caráter e dignidade não é coisa que a gente compra em shopping, não se compra em feira, nem no bar. Saio daqui sem ódio. Aos 74 anos, meu coração só tem espaço para o amor, porque o amor vai vencer neste país. Estou indo para São Paulo. Amanhã tem encontro no Sindicato dos Metalúrgicos e, depois, as portas do Brasil estarão abertas para que eu volte a percorrer esse país e discutir com o nosso povo uma saída. O Brasil piorou, o povo está desempregado, o povo está trabalhando de Uber, de bicicleta para entregar comida. Não tenho mágoa dos policiais federais, dos carcereiros, não tenho mágoa de ninguém. Tenho é vontade de provar que esse país pode ser muito melhor se ele tiver um presidente que não minta tanto no Twitter quanto o Bolsonaro. Serei eternamente grato e fiel à luta de vocês. Que Deus abençoe cada homem e cada mulher. Obrigado pelo grito ‘Lula livre’.” Leia à íntegra. (Poder 360)

Assista ao discurso na íntegra.

O presidente Jair Bolsonaro preferiu manter o silêncio, hoje. Chamou os assessores para conversar e proibiu a todos que criticassem a decisão do Supremo de suspender a prisão automática após segunda instância. Foi particularmente enfático com Filipe Martins, o assessor especial para assuntos especiais, particularmente ligado ao escritor e guru Olavo de Carvalho. (Crusoé)

Lula não foi o único beneficiado pela decisão do Supremo. Também já deixaram a prisão, ou tiveram a ordem de soltura decretada, o ex-governador tucano de Minas Eduardo Azeredo e o ex-secretário da Casa Civil José Dirceu. Outros políticos, como o ex-governador do Rio Sérgio Cabral e o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, continuarão presos. Pesa contra eles, também, uma ordem de prisão preventiva, que não foi abordada pelo Supremo. (G1)

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Vera Magalhães: “Lula solto — e não livre, como se tenta falsamente vender na narrativa triunfalista montada pelo PT — vai exacerbar a polarização entre os extremos estridentes da sociedade: de um lado, bolsonaristas revoltados clamando pelo fechamento do STF e, do outro, viúvas do lulopetismo ignorando que Lula foi condenado em duas instâncias e teve a condenação confirmada pelo STJ por crime comum. O PT passou o último ano e meio preso a uma samba de uma nota só, o da soltura de seu chefe maior. Foi um ator coadjuvante na discussão da reforma da Previdência e tem sido uma voz omissa diante das controvérsias do governo Bolsonaro. Com Lula de volta ao palanque, vai entoar d enovo a cantilena da perseguição política e tentar obter dividendos político-eleitorais de seu carisma — algo ainda duvidoso, uma vez que o antipetismo continua forte. A ideia de reconstrução de alternativas moderadas de centro vai se perdendo no rame-rame de radicalização do discurso fácil das redes sociais.” (BR Político)

Ascânio Seleme: “É cedo para dizer qual será o resultado do retorno de Lula ao cenário político. Mas será importante. Ninguém pode negar ou fingir desconhecer a estatura do ex-presidente. Mesmo preso, teve força suficiente para colocar o ex-prefeito Fernando Haddad no segundo turno da eleição. O discurso que fez no acampamento da militância em frente à Polícia Federal de Curitiba ao deixar a carceragem foi temperado por momentos agressivos e por declarações de amor e ternura que lembram o Lulinha Paz e Amor. Difícil dizer qual deles prevalecerá. O homem que já identificou a si mesmo com uma metamorfose ambulante, deu ontem a pista de que vai circular em permanente ziguezague. Interessa a ele as vezes morder e em outras assoprar. Foi assim que ele construiu sua liderança incontestável no PT. Será assim que seguirá determinando o rumo de seu partido e dos demais satélites que orbitam o PT.” (Globo)

Pedro Doria: “Que Lula vem aí é chave. Num ambiente de baixíssima popularidade, atordoado por acusações graves de corrupção em seu governo, optou por radicalizar. Jogo político. Radicalizando, mobilizou os fiéis. Quando deixar a prisão, porém, vai encontrar um Brasil diferente. E terá duas possibilidades de jogo. Uma beneficia o PT eleitoralmente. A outra beneficia a democracia. No novo Brasil, a oposição ao PT não é o PSDB, tampouco o MDB. É a extrema direita. Eduardo Bolsonaro não fala de AI-5 em caso de radicalização da esquerda à toa. Ele torce por esta radicalização. Ele alimenta esta radicalização. Ele saliva só de pensar. Aos bolsonaristas raiz interessa um país conflagrado, sob tensão. É na divisão dos democratas que eles ganham. Só é possível se manter num governo radical se a sociedade está radicalizada. Lula sabe desempenhar muito bem os dois papeis. O de Lulinha Paz e Amor, o do Lula besta-fera. Se mantiver o Lula radical, manterá a militância unida e provavelmente levará o PT ao segundo turno. Talvez para perder e reeleger Bolsonaro — mas isso ainda é cedo para dizer. Se voltar a encarnar uma versão do Lulinha Paz e Amor e partir para costurar laços com todas as forças democráticas da sociedade, mesmo que seja por pactos de não-agressão, ele abaixa a fervura em um dos dois polos e o ambiente no qual o bolsonarismo se cria se desfaz. Provavelmente custaria ao PT o segundo turno, pois é o ambiente político que favorecerá algum centro.” (Facebook)

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