Bolsonaro dá mostras de que sente pressão

A segunda-feira foi marcada por confusão no Planalto. Após publicar uma Medida Provisória com uma série de iniciativas voltadas para a economia, o presidente Jair Bolsonaro recuou. Em um dos pontos, a MP 927 autorizava que empregadores suspendessem contratos de trabalho e salários por até quatro meses no período em que dura a calamidade pública. Para evitar demissões em massa, propunha o governo, que ficasse autorizado o não pagamento de salários. A polêmica explodiu entre analista da imprensa e nas redes sociais. “Tira”, determinou ao ministro Paulo Guedes o presidente. “Estou apanhando muito.” Em entrevista a Adriana Fernandes, Guedes explicou onde o governo bateu cabeça. “Estamos tentando proteger todo mundo que a gente consegue. Soltamos centenas de medidas nas duas últimas semanas. A velocidade é muito grande.” Para o ministro, houve um erro na forma como o texto foi redigido. Saiu pela metade. “A ideia é suspender o contrato de trabalho e imediatamente negocia. Como a gente sabe que o trabalhador é mais frágil num momento como esse, o governo teria que entrar com uma suplementação salarial. Só que não botaram isso. Botaram livre negociação. E, aí, dá a impressão que o cara que vai ser demitido, não ganha nada e fica recebendo um curso.” O texto que substitui a iniciativa ainda não foi publicado. “Você pega um trabalhador que ganha R$ 2 mil e a empresa não aguenta pagar. Aí, reduz à metade (o salário), cai para R$ 1 mil. O governo paga 25% (do salário). Acaba o salário caindo para 75% (do que era originalmente). A empresa paga 50%, o governo 25% e todo mundo perde um pouquinho.” (Estadão)

Bruno Boghossian: “Por semanas, o ministro da Economia insistiu em que sua agenda liberal era a única maneira de enfrentar a crise. A desastrosa medida provisória que permitia a suspensão de contratos de trabalho sem medidas de compensação contaminou de vez o receituário que o ministro pretendia deixar como marca e drenou o capital político que ele já vinha perdendo. O vaivém que levou Bolsonaro a defender a ação pela manhã e revogá-la menos de quatro horas depois ampliou a deterioração. Em seus 15 meses no posto até aqui, Guedes se notabilizou por desconsiderar danos políticos que seus planos poderiam produzir. Enquanto até governos europeus comprometidos com fórmulas fiscalistas passaram a adotar medidas emergenciais de expansão de gastos, Guedes insistiu na aplicação de um receituário inapropriado para tempos de caos. Qualquer plano, de agora em diante, tende a ser recebido com contestação e desconfiança nas ruas, no Congresso e, principalmente, no gabinete presidencial.” (Folha)

Então... o Congresso está articulando um orçamento de guerra para agilizar liberação de recursos. A ideia é apresentar um orçamento paralelo no qual ficariam suspensas as restrições constitucionais e legais para as despesas exclusivamente voltadas a pandemia. Parlamentares avaliam que são necessários R$ 500 bilhões para medidas como aumentar o aporte para o Bolsa Família e os trabalhadores informais, além de suspensão de tributos para empresas. (Estadão)

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O governo está sentindo a pressão — e, em especial, o presidente. Quando uma repórter perguntou, ontem, como ele reagia à pesquisa do Datafolha que indicou queda de popularidade, sua resposta veio como explosão. “Uma pergunta impatriótica, que vai na contramão do interesse do Brasil, que leva ao descrédito da imprensa brasileira. Uma pergunta, me desculpem, infame até. Vão dizer que estou agredindo a imprensa. Se estou agredindo, saiam da frente do Alvorada”, disse intempestivo. “Aí vem uma pergunta que a popularidade do Mandetta está melhor do que a minha. Vá às favas, pô!” — e deu uma banana. (UOL)

A relação com a imprensa tende a piorar. Hoje virá nova polêmica: o Planalto editou outra MP suspendendo prazos de respostas à Lei de Acesso à Informação. É a lei que obriga o governo a dar informações que deveriam ser públicas a quem pede. Assim, o governo deixa de ser obrigado a responder a perguntas. (G1)

Pois é: também entre os eleitores de Bolsonaro a confiança é maior em seu ministério do que no presidente. Neste grupo, 56% consideram que Bolsonaro faz um bom trabalho no combate ao coronavírus. E 64% acham que o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, conduz bem o processo. (Folha)

E... Pelo menos uma pesquisa voltada ao monitoramento das redes sociais encomendada por partidos de centro indicam que, no Twitter, Bolsonaro está em queda. É sua rede preferencial. Mas a oposição não se mostrou capaz de oferecer um líder que faça frente, informa Bela Megale. Para quem comenta nas redes, não há nome que represente com clareza o anti-Bolsonaro. (Globo)

Aliás... De acordo com o mesmo Datafolha, os brasileiros depositam sua confiança para compreender a crise do coronavírus no jornalismo profissional. Programas jornalísticos da TV (61%) e jornais impressos (56%) lideram no índice de confiança sobre o tema, seguidos por programas jornalísticos de rádio (50%) e sites de notícias (38%). (Folha)

Viver

Os números oficiais apontam 1.960 casos confirmados e 34 mortes no Brasil. O ritmo de infecções está um pouco mais lento do que na Itália e Espanha: demorou oito dias para o país subir de 100 para mil casos, enquanto nos países europeus esse período foi de seis e sete dias, respectivamente. Mas especialistas defendem que ainda é cedo para avaliar comportamento da pandemia pelo país. A previsão é que os números cresçam exponencialmente no mês de abril. (Globo)

Um mapa em tempo real dos casos no Brasil. (G1)

Pesquisadores brasileiros estão se mobilizam para aumentar oferta de testes, política defendida pela OMS. Um deles é a Universidade Federal do Rio de Janeiro que está desenvolvendo um teste sorológico. Com apenas uma gota de sangue, seria possível saber se tem o coronavírus e em qual estágio. Pesquisadores também estão se juntando a empresários com o objetivo de prover os recursos necessários e na escala necessária para testes. (Estadão)

Aliás. Os hospitais têm sofrido com a demora na importação de insumos. Com a redução na atividade aérea e navios atracados, a entrega chega a demorar 90 dias. A Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) afirmou que os preços dos materiais hospitalares também aumentaram. (UOL)

Enquanto isso... o Ministério da Saúde regulamentou, em caráter excepcional, a telemedicina. Médicos poderão atender pacientes a distância enquanto estão em quarentenas. (Folha)

O número de casos está desacelerando na Itália: a alta caiu de 10% para 8,1%. O país já registra o maior número de mortos, com mais de seis mil pessoas. Enquanto isso, a Espanha está lutando para não acabar como os italianos. Em 24h, as mortes aumentaram em 32%. Com hospitais operando no limite, o primeiro-ministro espanhol disse que o pior ainda está por vir. (Folha)

A OMS avisou que o coronavírus está se espalhando a uma velocidade mais rápida pelo mundo: os primeiros 100 mil casos foram registrados em 67 dias; os segundos 100 mil em 11 dias; já os terceiros ocorreram em apenas 4 dias. (G1)

5% dos casos estão em Nova York. Apenas três semanas após a primeira confirmação, a cidade se tornou um novo epicentro do coronavírus. (Globo)

Perda de olfato e paladar também podem ser indicativos da Covid-19. Médicos britânicos avisaram que pacientes com esses sintomas devem ficar em quarentena, mesmo que não tenham outros mais comuns da doença, como febre, tosse e dificuldade na respiração. Na Coreia do Sul, 20% dos pacientes confirmados apresentaram esses sintomas. (New York Times)

Veja como o coronavírus age no corpo. (BBC Brasil)

69 drogas também foram identificadas como possíveis remédios contra a Covid-19. Na lista estão remédios já usado para outros doenças, como diabetes e esquizofrenia. A hidroxicloroquina, usada contra a malária, também está entre elas. Trump chegou a pedir para o FDA, agência reguladora, acelerar a aprovação. No entanto, falta fazer teste clínicos. A OMS anunciou que começaria junto com outros países. A droga, no entanto, ataca muitas proteínas humanas o que pode causar muitos efeitos colaterais. (New York Times)

Por aqui, o Hospital Albert Eistein vai começar a realizar estudo sobre a hidroxicloroquina, que deve durar dois meses. (UOL)

Carrinhos de compras abarrotados de papel higiênico se tornaram comuns em meio as quarentenas. A escolha de um item um tanto inusitado tem explicação. Para especialistas de marketing uma das razões é o fator psicológico: por ser um produto higiênico dá uma sensação de segurança. As pessoas também ficam ansiosas ao verem prateleiras vazias. Por causa do volume, são poucos unidades expostas nos supermercados, o que faz com que esgotem mais rapidamente. E ver os outros comprando pacotes e pacotes, gera um medo de não ficar de fora. (El Pais Brasil)

Então… uma calculadora para saber quanto realmente comprar de papel higiênico durante a quarentena.

Outro item em alta é a maconha. Nos EUA a demanda cresceu 159% na Califórnia, em relação ao mesmo período do ano passado, e saltou 100% no estado de Washington e 46% no Colorado. Em muitas cidades, as lojas de maconha medicinal estão abertas por serem consideradas serviços essenciais. (Globo)

Para ler com calma: Existe um debate delicado acontecendo — há especialistas importantes que questionam a decisão de colocar o mundo em quarentena. Um deles é John Ioannidis, o principal epidemiologista da Universidade de Stanford e um dos mais respeitados do mundo. Seu argumento é de que governos estão tomando decisões sem dados concretos — o número de testados no mundo é pequeno, não sabemos realmente quantos foram infectados e, portanto, qual o índice de mortalidade deste vírus SARS-CoV-2. Pode ser equivalente ao de uma influenza sazonal e, aí, parar o mundo traria impactos muito maiores na economia e na saúde mental. David Katz, fundador do Centro de Prevenção de Doenças de Yale, é outro crítico. Se os dados sul-coreanos estiverem corretos, ele argumenta, 99% dos infectados sentem no máximo sintomas leves e não precisam de tratamento. É o país que mais testou. O caminho ideal, ele diz, talvez fosse o de concentrar testes em idosos, que são os mais vulneráveis, e não a população inteira. E isolar e proteger a eles. Isto permitiria que a economia retomasse e os recursos fossem concentrados onde há maior risco. Thomas Friedman, o principal colunista do New York Times, compra o argumento e pergunta se os governos do mundo não estão sendo levados por um espírito de manada. Um foi, todos seguem. O debate é delicado e, cá no Meio, mencionamos com cautela o argumento contrário. As vozes minoritárias não necessariamente estão certas, as covas comunitárias no Irã não são fictícias, o colapso do sistema hospitalar no norte da Itália tampouco. Mas há um debate em curso.

Cultura

Conforme o Meio fechava chegou a notícia de que morreu, durante a madrugada, o desenhista francês Albert Uderzo. Tinha 92 anos e sofreu falência cardíaca. Com seu parceiro René Goscinny, Uderzo deu vida a Astérix, Obélix e a trupe de gauleses que desde 1959 resistiram à invasão romana. Uderzo passou a escrever sozinho os álbuns após a morte de Goscinny, em 1977 e até completa 84. Em 52 anos de carreira se tornou um dos grandes nomes da história dos quadrinhos.

Assista: Uderzo desenha suas personagens.

Lista: Os melhores álbuns de Astérix e Obélix.

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Os melhores livros para ler — e quaisquer outras atividades de quarentena — sugeridos por Humberto Werneck, Ignácio de Loyola Brandão, Marcelo Rubens Paiva, Sérgio Augusto, Roberto DaMatta, Luís Fernando Veríssimo e Milton Hatoum, colunista do Caderno 2 do Estadão.

Cotidiano Digital

A Microsoft está voltando seus olhos para o Windows — quer repensar a estratégia e voltar o foco da empresa para o velho sistema operacional. O principal objetivo do novo comandante da área, Panos Panay, é simplificar a interface. A meta é conseguir algo que a Apple sempre teve mas a empresa de Bill Gates nunca conseguiu: fazer com que o Windows deixe de ser uma imposição profissional e passe a oferecer uma experiência que dê prazer às pessoas. A versão do Windows para aparelhos de tela dupla, aliás, está para sair.

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