Prezadas leitoras, caros leitores —

A gente sabe que está difícil e não há perspectiva clara de quando as coisas vão melhorar.

Não temos informação suficiente a respeito deste novo coronavírus. Sobre qual sua letalidade, qual o ciclo exato da doença que provoca.

Tampouco está clara qual a justa medida entre a quarentena e a preocupação econômica. O debate entre cientistas está em curso, experiências distintas estão sendo tocadas por gestores públicos em países diversos.

E, em boa parte do Brasil, os dias têm sido bonitos. Claro que há tensão, preocupação de toda ordem. Mas também há família, amores, livros e filmes, games. O mundo sairá melhor, desta.

Talvez, até, mais unido. Quem sabe? Estamos precisando.

Até lá, cá no Meio, seguiremos informando tão bem quanto as incertezas do tempo o permitem.

Obrigado pela companhia,

— Os editores.

Bolsonaro prega fim de isolamento — e se isola

O presidente Jair Bolsonaro tem marcada para hoje cedo uma teleconferência com os quatro governadores do sudeste. Ontem, sem citar qualquer um por nome, ele partiu para o ataque em pronunciamento por cadeia nacional. “Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, a proibição de transportes, o fechamento de comércios e o confinamento em massa”, ele pediu. O presidente quer diminuir a política de quarentena. “O que se passa no mundo tem mostrado que o grupo de risco é o das pessoas acima dos 60 anos. Por que fechar escolas? Raros são os casos fatais de pessoas sãs com menos de 40 anos de idade.” Ele também se queixou da imprensa. “Grande parte dos meios de comunicação foram na contramão. Espalharam exatamente a sensação de pavor, tendo como carro-chefe o anúncio do grande número de vítimas na Itália, um país com grande número de idosos e com o clima totalmente diferente do nosso. O cenário perfeito, potencializado pela mídia, para que uma verdadeira histeria se espalhasse pelo nosso país.” Em seu discurso, o presidente ainda reafirmou que está bem. “No meu caso particular, pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado com o vírus, não precisaria me preocupar. Nada sentiria ou seria, quando muito, acometido de uma gripezinha ou resfriadinho, como disse aquele famoso médico daquela famosa televisão.” Assista ou leia. (G1)

Na escrita do discurso, Jair Bolsonaro teve a ajuda de seu filho Carlos e do ‘gabinete do ódio’, apelido recebido pelos assessores que organizam suas redes sociais. (Estadão)

Entre as informações que o presidente ignora está um relatório da Agência Brasileira de Inteligência. A projeção dos analistas é de que o número de mortes pode chegar a 5.571 em apenas duas semanas. (Intercept)

No Congresso, a reação foi imediata. E, desta vez, não partiu da presidência da Câmara — mas do Senado. “Neste momento grave, o país precisa de uma liderança séria, responsável e comprometida com a vida e a saúde da sua população”, puseram em carta presidente e vice da Casa, Davi Alcolumbre e Antonio Anastasia. “Consideramos grave a posição externada pelo presidente da República hoje, em cadeia nacional, de ataque às medidas de contenção ao covid-19.” Os dois senadores pediram que a opinião de cientistas seja levada em conta. “É momento de união, de serenidade e equilíbrio, de ouvir os técnicos e profissionais da área para que sejam adotadas as precauções e cautelas necessárias para o controle da situação, antes que seja tarde demais. A nação espera do líder do Executivo, mais do que nunca, transparência, seriedade e responsabilidade.” (Poder 360)

O deputado Rodrigo Maia veio na sequência, via Twitter. “Desde o início desta crise venho pedindo sensatez, equilíbrio e união. O pronunciamento do presidente foi equivocado ao atacar a imprensa, os governadores e especialistas em saúde pública.” (Twitter)

O ex-presidente Fernando Henrique foi particularmente duro. “O presidente repetiu opiniões desastradas sobre a pandemia. Se não calar estará preparando o fim. E é melhor o dele que de todo o povo.” (Twitter)

Também da base governista vieram críticas. “Se o presidente se dispusesse a comunicar todas as suas visões e ações de forma coesa acerca de como enfrentará a pandemia do coronavírus, seria bom para ele, para os movimentos populares que o apoiam e também para toda a sociedade”, argumentou o deputado Luiz Philippe de Orléans e Bragança, pré-candidato do Planalto à prefeitura de São Paulo. (Oeste)

Aliás... Segundo estudo do DAPP, da Fundação Getúlio Vargas, os tuítes da base governista estão sendo em grande parte ignorados pelo público que acompanha a rede social. (Twitter)

Parte da repercussão do isolamento presidencial, evidentemente, é política. O governador paulista João Doria percebeu, no momento, que é hora de se posicionar como o anti-bolsonaro. Ontem, observa o jornalista Fábio Zanini, falou consistentemente a respeito da necessidade de transparência, um dos pontos fracos do presidente. Assim, apresentou em público o resultado de seu exame, negativo para o novo coronavírus. O prefeito paulistano, Bruno Covas, havia feito o mesmo, mais cedo. (Folha)

Pois é... O Hospital das Forças Armadas, em Brasília, apresentou ao governador local uma lista daqueles que receberam exame positivo. Lista parcial: dos 17 nomes, dois foram omitidos para que suas identidades fossem mantidas em sigilo. É onde Bolsonaro fez o seu exame. De acordo com o repórter Vicente Nunes, podem ser o presidente e a primeira-dama. (Correio Braziliense)

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Para ler com calma: Se há, nalgum canto, uma lista dos 5 grandes colunistas da imprensa mundial, ela inclui o inglês Martin Wolf, do Financial Times. Segundo ele, estamos perante um dilema ético de escala global. “Alguns ainda argumentam que é errado forçar a economia no caminho de uma depressão para suprimir a transmissão do vírus”, ele escreve. “Mas não é certo que a economia ficaria melhor numa política laissez faire. Desde antes das quarentenas impostas por governos, muitos já haviam parado de ir a restaurantes, cinemas e lojas.” Ainda assim, Wolf mostra que o FMI e outros organismos internacionais não conseguirão, sozinhos, dar conta do nível de financiamento que muitos países em desenvolvimento precisarão. Quão mais rápido os países ricos conseguirem conter suas pandemias para poder agir de forma solidária mundialmente, melhor para todos. Numa economia global, a recuperação deve ser global. Governantes devem resistir à tentação de agir apenas dentro de suas fronteiras. “Escolheremos solidariedade contra hostilidade e responsabilidade global contra uma interiorização nacionalista? Diferentemente de vírus, seres humanos têm escolhas.” (Financial Times)

Viver

São 2.201 casos e 46 mortes no Brasil. O Ministério da Saúde vai ampliar para 22,9 milhões de testes para o novo coronavírus. O volume inclui testes rápidos já aprovados pela Anvisa. Apesar da ampliação, o número ainda não deverá ser suficiente para atender toda a população que poderá apresentar sintomas. Casos graves e profissionais da saúde continuam tendo preferência. Mas o governo quer ampliar testes em casos leves em cidades maiores. O plano é fazer a testagem em postos volantes, por meio da instalação de máquinas para análise de exames do material genético do vírus. As máquinas devem ser fornecidas em negociação com empresas privadas. Para enfrentar o pico da epidemia, o país precisa aumentar a capacidade de testagem diária dos atuais 6,7 mil testes para até 50 mil. (G1)

O setor de saúde está usando a criatividade para contornar o problema de falta de materiais. O Conselho Federal de Medicina Veterinária abriu um cadastro de equipamentos veterinários que possam ser usados em humanos. Ventiladores mecânicos, monitores e concentradores de oxigênio para pets podem ser adaptados, desde que sigam as regras sanitárias. A expectativa é levantar até 30 mil equipamentos. (Folha)

Hotéis também estão sendo adaptados para receberem pacientes com sintomas mais estáveis e liberar leitos em hospitais. Prefeituras pelo país também estão fazendo acordos para oferecer estadias para profissionais da saúde que morem com alguém dos grupos de risco. (Folha)

Os EUA podem se tornar o novo epicentro do coronavírus, segundo a OMS. Nas últimas 24 horas, 85% dos novos contágios reportados em todo o mundo tinham origem nos EUA e na Europa. Pelo mundo, foram registradas 17.241 mortes e 395.647 contaminados. (Globo)

Na Itália, o governo estima que o número de casos pode ser dez vezes maior do que o registrado. Isso resultaria em pelo menos 640 mil pessoas. (Globo)

Aliás. Depois de dois dias consecutivos com números de mortes em queda, a Itália voltou a ter aumento: 743 vítimas nas últimas 24 horas. Os italianos sofrem com um grave problema de falta de respiradores. Muitos países suspenderam a venda do equipamento. O Brasil, no entanto, enviou uma carga de ventiladores pulmonares e máscaras de proteção para o país. A entrega foi feita depois do ministro da Saúde do Brasil pedir a ajuda para empresários. (Globo)

Do outro lado do mundo, a Índia impôs o maior confinamento da história. 1,3 bilhão de pessoas vão ficar em casa. Até agora, o país registra 482 casos confirmados e nove mortes. (G1)

Enquanto o mundo se fecha, a vida na província de Hubei, primeiro epicentro da doença, está aos poucos voltando ao normal. A partir de hoje os moradores estão liberados para circular livremente. Mas os habitantes de Wuhan, que estão em quarentena desde janeiro, precisam esperar até abril. (Época)

Fotos aéreas do mundo parado. (Bloomberg)

E a OMS criou uma conta no WhatsApp para tirar dúvidas sobre a doença.

O material genético do vírus sobreviveu até 17 dias no navio japonês que ficou de quarentena. Depois de desocupado, pesquisadores dos EUA identificaram o novo coronavírus em uma variedade de superfícies em cabines de passageiros infectados. Pesquisas anteriores indicavam sobrevivência de cerca de 3 dias. (Crescer)

A alta taxa de contaminação do vírus pode ser explicada pela sua própria estrutura: a forma de coroa de espinhos consegue entrar com mais efetividade, dominar a célula e usar o material genético dela para se multiplicar mais depressa. “A pessoa infectada vira uma fábrica de vírus antes que os sintomas apareçam. Isso faz com que passe de uma pessoa para outra com grande eficiência e dificulta demais o fim da pandemia. Por isso, as quarentenas são fundamentais”, explica Patrícia Rocco, chefe do Laboratório de Investigação Pulmonar da UFRJ. (Globo)

Os Jogos Olímpicos foram adiados para 2021. A decisão veio antes do esperado. O Comitê tinha dado um mês para decidir sobre o evento. Mas, em conversa por telefone, o primeiro-ministro do Japão e o presidente do Comitê concluíram que o melhor é adiar. A decisão vale também para os Jogos Paralímpicos. Vários países e comitês olímpicos nacionais, incluindo o brasileiro, já tinham pedido pelo adiamento devido a pandemia. Enquanto isso, a chama olímpica, já acesa na Grécia, ficará no Japão. E o evento manterá o nome Tóquio-2020. (Globo)

Em 124 anos de Olimpíadas da Era Moderna, a competição nunca havia sido adiada. Ela só deixou de ocorrer durante a Primeira e Segunda Guerra Mundial, em 1916, 1940 e 1944. Aliás, a edição cancelada de 1940 também seria em Tóquio. A cidade teve que esperar até 1964 para finalmente sediar os primeiros Jogos Olímpicos na Ásia. (Folha)

Cultura

Sir Patrick Stewart — o ator conhecido pelos papeis de capitão Jean-Luc Picard, em Jornada nas Estrelas, ou do professor Charles Xavier, em X-Men — também está produzindo arte online. Lendo sonetos de Shakespeare, um por dia, no Twitter. Não é um inglês fácil, o do século 16. Mas é um baita ator, com pronúncia cristalina, vale nem que seja pela sonoridade.

Aliás... Ele estrela, na Amazon Prime, a série Picard.

Stewart não é o único, diga-se. Não é todo dia, mas Yo-Yo Ma, talvez o maior violoncelista do mundo, vem tocando em sua conta as músicas que o tranquilizam.

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Entre as novidades da Netflix está Freud (trailer). A primeira temporada explora a vida do jovem Sigmund Freud, no século 19, ainda antes da psicanálise. Assista. Pois é. Há uma penca de lançamentos marcados para a semana que vem. Entre eles, o retorno de La Casa de Papel. Assista ao trailer da quarta temporada.

Cotidiano Digital

As principais redes difusoras de informação na internet — incluindo Facebook, YouTube e Twitter — estão fazendo uso de inteligência artificial para extirpar conteúdo de desinformação a respeito do novo coronavírus.

No Brasil, nos últimos dias, terminaram retirados vídeos do escritor Olavo de Carvalho e do blogueiro governista Allan dos Santos.

Por 12 horas, o Twitter ainda suspendeu as contas do blogueiro, de Flávio Bolsonaro e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

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