Prezadas leitoras, caros leitores —

É tanta informação todos os dias a respeito do novo coronavírus que, por vezes, nos esquecemos de um ponto fundamental: muito desta informação é incerta. Estamos lidando com ciência em movimento. Cloroquina, que chegou a parecer uma droga promissora no trato da doença, hoje é praticamente descartada. Máscaras, que a própria Organização Mundial da Saúde chegou a dizer serem desnecessárias, hoje são recomendadas.

Do início da pandemia para cá, muito mudou. Em que momento deve se ir ao hospital? Em que terapias a ciência põe seu foco no momento? O que sabemos a respeito de imunidade? Quais os percalços na busca de uma vacina? Por que em alguns lugares se espalha tão rápido e, noutros, é tão lento? Dedicaremos o Meio de Sábado a uma atualização. Ainda não é conhecimento firme, porém é mais do que sabíamos há um ou dois meses. Este vírus nos impõe uma aula a respeito dos ritos da ciência, que não oferece uma verdade instantânea mas uma lenta e contínua aproximação.

Este é um alerta importante para a leitura diária do noticiário, cá no Meio ou em outros veículos. Sabemos tanto quanto dá para saber e isto não é por má fé. É da natureza do processo.

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— Os editores.

Bolsonaro pressiona STF por fim de quarentena

Acompanhado de um grupo de empresários, o presidente Jair Bolsonaro atravessou ontem a Praça dos Três Poderes para pressionar, pessoalmente, o Supremo Tribunal Federal. Os representantes da indústria haviam ido ao Planalto pedir políticas que auxiliem o sustento do setor durante o período da quarentena. Bolsonaro decidiu transformar o encontro num ato político pela volta ao trabalho. “Não estava na nossa agenda inicial, mas o presidente Bolsonaro trouxe a discussão da flexibilização do isolamento no país”, afirmou o presidente-executivo da Associação Brasileira de Indústria de Máquinas e Equipamentos, José Velloso. “Precisamos de uma coordenação, nós precisamos ter um trabalho conjunto para que a volta da atividade seja feita da melhor maneira possível sem risco para as pessoas e preservando o maior número de empregos possível”, completou o presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico, José Ricardo Roriz Coelho. Pegando todos de surpresa, o presidente da República então entrou em contato com seu par no Poder Judiciário, Dias Toffoli, e pediu para ser recebido naquele momento. “Temos um problema que vem cada vez mais nos preocupando”, discursou Bolsonaro já no STF. “Os empresários trouxeram essas aflições, a questão do desemprego, a questão da economia não mais funcionar. O efeito colateral do combate ao vírus não pode ser mais danoso que a própria doença.” Sua queixa a Toffoli era de que havia ‘CNPJs na UTI’. O presidente do Supremo recomendou a Bolsonaro que comande o Executivo, organize um comitê de crise e proponha com estados e municípios um plano. O Planalto ainda não tem sugestão de como fazer a abertura que deseja. (G1)

No primeiro momento, o meio jurídico reagiu mal ao fato de Toffoli ter recebido Bolsonaro. Mas rapidamente, informa a Coluna do Estadão, ficou claro que ele não poderia ter fechado a porta na cara do presidente e a avaliação mudou. Toffoli conseguiu manobrar para driblar a armadilha. A principal queixa dos empresários, por sua vez, era voltada para a falta de ajuda dos bancos, principalmente do BNDES. (Estadão)

Carlos Melo, do Insper: “Bolsonaro talvez imaginasse atravessar o Rubicão. Mas, o que lhes sobrou foi o ato cênico de uma extravagante marcha pela Praça dos Três Poderes. Triunfo de nada, mais que inútil foi constrangedor. Gesto de enfrentamento? Talvez fosse intenção, mas restará como história do dia em que um presidente da República espontaneamente submeteu seu Poder a outro, como se Dias Toffoli fosse o verdadeiro chefe de Estado. Foi desconcertante assistir a um embaraçado presidente do STF dizer a Jair Bolsonaro, nas entrelinhas, que o presidente da República é ele, Jair, não Toffoli; que é tarefa do Executivo, não do Supremo, planejar ações, construir consensos, articular atores políticos e a sociedade — governadores, inclusive. Pois, quereriam mais o que aqueles senhores?” (Estadão)

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A Advocacia Geral da União pediu ao ministro Celso de Mello que reconsidere. O Planalto não quer entregar o vídeo que provaria a tentativa, por Bolsonaro, de intervir na Polícia Federal do Rio. Ou, então, gostaria de enviar apenas o trecho no qual presidente e o ex-ministro Sérgio Moro interagem. (Poder 360)

Uma fotografia da reunião, tida como delicada, mostra que havia dezenas de pessoas presentes. E os vazamentos já começaram. Bolsonaro, segundo ouviu Bela Megale, estava de ‘péssimo humor’ e afirmou aos ministros que poderia demitir qualquer um — incluindo Moro. O mau humor do presidente, agora, está voltado para o procurador-geral da República, Augusto Aras. Desejava que ele tivesse esperado um pouco mais para abrir uma investigação. (Globo)

A atriz e secretária da Cultura, Regina Duarte, deu ontem uma entrevista insólita à CNN Brasil. Louvou a ditadura, descartou os mortos e torturados no período e se queixou das perguntas dos jornalistas. “Sempre houve tortura”, afirmou. “Não quero arrastar um cemitério. Por que olhar para trás? Não vive quem fica arrastando cordéis de caixões, acho que tem uma morbidez neste momento. A Covid está trazendo uma morbidez insuportável, não tá legal.” Assista. (CNN Brasil)

Contraponto: Seu par em mais de uma novela, o ator Lima Duarte gravou um dia antes um vídeo emocionado de lamento pela morte do amigo Flávio Migliaccio e choque com a celebração da ditadura. Assista.

Meio em vídeo: Lavajatistas x Bolsonaristas, o fim da polarização e o surgimento de um centro político. Assista.

O Jair que há em nós

Tony de Marco

 
Leia o artigo de Ivann Lago.
 
Pizza-bolsonarista

Viver

O Brasil tem 9.146 mortes oficiais por coronavírus, com mais 610 registros confirmados ontem  — 227 deles ocorreram nos últimos três dias. São Paulo segue como o estado com mais casos (39.928) e mortes (3.206). Na sequência estão o Rio de Janeiro (14.156 casos e 1.394 óbitos) e Ceará (13.888 diagnósticos e 903 mortos). Desde a última atualização do Ministério da Saúde, o Pará ultrapassou o Maranhão em número de casos. Agora, o governo paraense contabiliza 5.524 contaminados e 410 mortos por Covid-19. Já as autoridades maranhenses totalizaram 5.389 infectados e 305 óbitos. Ambos os estados estão nas regiões do Brasil em que houve aceleração de diagnósticos da doença no último mês. Trata-se do terceiro dia consecutivo em que o País atinge a marca de 600 novos registros de óbito pela Covid-19. Segundo dados de ontem, compilados pela organização Worldometers, que utiliza fontes oficiais de cada país e faz estatísticas sobre a doença, o Brasil foi o segundo país a registrar mais mortes novas, atrás apenas dos Estados Unidos.

Ao menos 6,8 milhões de brasileiros já vivem em cidades sob regime de bloqueio completo por causa do novo coronavírus. A medida está em vigor em três capitais, São Luís, Belém e Fortaleza, mas também é alvo de estudo ou foi aplicada parcialmente em outros 13 Estados, incluindo Rio e São Paulo. O lockdown, termo usado para designar o fechamento das cidades, é considerado o último recurso contra o avanço da Covid-19 e foi adotado em outros países, como Itália e Espanha.

António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas: “Devemos agir agora para fortalecer a imunidade de nossas sociedades contra o vírus do ódio. Portanto, hoje peço que não sejam poupados esforços para erradicar o discurso do ódio em todo o mundo”.

O número de profissionais de enfermagem mortos pela Covid-19 no Brasil chegou a 98 na quarta-feira, segundo dados do Cofen (Conselho Federal de Enfermagem). O número de casos já é maior do que nos Estados Unidos, país mais atingido pela pandemia do novo coronavírus. Lá, se contabiliza 91 mortes, de acordo com levantamento do NNU (National Nurses United). Em todo o mundo, mais de 260 profissionais de enfermagem já morreram, de acordo com o ICN (International Council of Nurses) e 90 mil estão infectados com a doença. Dos 98 profissionais de enfermagem mortos pela Covid-19 no Brasil, 25 são enfermeiros, 56 técnicos e 17 auxiliares de enfermagem. Desses, 67% são mulheres.

Niterói se antecipa... Enquanto a cidade — e todo o Estado — do Rio de Janeiro se aproxima do colapso sanitário, do outro lado da ponte a cidade vizinha mais rica parece enfrentar a pandemia de coronavírus com um pouco mais de tranquilidade. O município, conhecido por ter o sétimo IDH mais alto de todo o país, vem buscando desde janeiro se antecipar à Covid-19 com uma série de medidas sociais, econômicas e sanitárias. Com 500.000 habitantes, foi a primeira cidade a adquirir testes rápidos —um total de 50.000 da China e da Coreia do Sul com o objetivo de testar 10% de sua população ao longo de dois meses. A principal medida é a testagem em massa da população. Enquanto o Ministério da Saúde fala sobre a impossibilidade de examinar todo o país, devido ao tamanho de sua população, Niterói pretende atingir uma proporção de testes maior que países inteiros. (El País)

A maior ameaça à resposta do Brasil à Covid-19 parece ser seu presidente, Jair Bolsonaro, mais empenhado em uma guerra contra a ciência do que contra o novo vírus. O diagnóstico está no editorial publicado ontem pela prestigiada revista científica britânica The Lancet. Em entrevista, o médico e editor da Lancet, Richard Horton, falou sobre a publicação.

Richard Horton: “A política criada por Bolsonaro pode ser chamada de uma guerra contra a ciência, e ela colocou o Brasil numa situação de grande risco. O país está certamente mais fraco e vulnerável por conta disso. Em 20 anos da Lancet, acompanhamos o desenvolvimento da ciência no Brasil como um dos grandes sucessos do país. Instituições como a Fiocruz não são apenas centros nacionais de excelência, são pólos internacionais de excelência. Os cientistas brasileiros são líderes globais em muitos domínios, e esse é um recurso poderoso no qual um país deve se apoiar para o bem da sua população. E é nada menos que uma tragédia que o governo não reconheça, abrace e apoie essa comunidade. É por isso que eu chamo o comportamento de Bolsonaro de uma traição a seu povo. E isso é imperdoável”.

Cultura

Dos romances publicados na década passada, nenhum tem aparecido em tantas listas de leitura com temas sobre pandemias quanto Estação Onze, de St. John Mandel (Amazon). É sobre um grupo de artistas que viaja apresentando peças de Shakespeare e números musicais para comunidades de sobreviventes após uma pandemia que quase dizimou o mundo. A narrativa vai e volta no tempo para descrever a vida antes e depois. Segundo a Time, Mandel mostra o impacto da pandemia em todas as vidas e tece perspectivas de personagens por várias décadas para explorar como a humanidade pode desmoronar e, de alguma forma, voltar a se unir.

No cânone europeu, nenhuma obra se compara a O Decamerão (Amazon) escrito pelo humanista renascentista Giovanni Boccaccio no final da década de 1340 e início de 1350. “Seus protagonistas, sete mulheres e três homens, se refugiam em uma vila nos arredores de Florença para evitar a pandemia”, escreveu Lois Beckett, do The Guardian, referindo-se à peste bubônica, ou "Peste Negra", que devastou a Europa. Lá, isolados por duas semanas, eles passam o tempo contando histórias um para o outro - histórias animadas e muitas vezes bizarras - com um tema diferente para cada dia.

Um surto posterior da peste bubônica em Londres inspirou o autor de Robinson Crusoe, Daniel Defoe, a escrever Um Diário do Ano da Peste (Amazon). Segundo Alec Scott, do Globe and Mail, o romance provavelmente foi baseado nos diários do tio do autor.

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É um encontro diário no Instagram. As apresentações de Teresa Cristina começam já tarde da noite e, por vezes, invadem a madrugada, atraindo centenas de fãs, anônimos e famosos. Já o Cristiners é uma espécie de “after” misturado com fã-clube, reunindo o público em grupo de mensagens para dar continuidade aos assuntos que rolaram na noite.

Cotidiano Digital

O plano de expansão do Alibaba está acelerando com a pandemia. O e-commerce chinês tem conquistado mercados europeus e asiáticos com a venda de equipamentos de saúde, como máscaras, álcool em gel e respiradores. Segundo o Sensor Tower, o seu app esteve entre os mais baixados no primeiro trimestre do ano na Espanha, França e Polônia— mercados até então não conquistados pela empresa. O Alibaba tem ganhado espaço onde a Amazon tem sofrido com falta de mercadorias ou difícil entrega. A expectativa do chinês é de pós-pandemia os novos usuários se mantenham na plataforma consumindo os outros produtos.

Por aqui, estima-se que o e-commerce ganhou ao menos quatro milhões de novos clientes, que devem manter o hábito depois, segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico. Mas com a restrição de voos, as entregas têm demorado mais e têm ficado mais caras, segundo a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata) e a União Postal Universal (UPU).

E o STF barrou MP que obrigava as teles compartilharem dados pessoais dos usuários para pesquisas do IBGE durante a pandemia.

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