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Pedro Doria

Diretor de jornalismo do Meio. É também figura fácil no Twitter e Instagram. Colunista de O Globo, O Estado de S. Paulo e da CBN. Foi editor-executivo do Globo e editor-chefe de digitais do Estadão, além de colunista da Folha de S. Paulo. Knight Fellow pela Universidade de Stanford. É autor de oito livros, a maioria sobre história do Brasil.

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Gemini 3.0: o que muda no mundo da inteligência artificial?

No Pedro+Cora do dia 20 de novembro de 2025, os jornalistas Pedro Doria e Cora Rónai conversam sobre o lançamento do Gemini 3.0. No papo, discutem as diferenças entre as grandes empresas de inteligência artificial, como GPT, Gemini e Claude, destacando como cada modelo tem suas próprias especificidades, capacidades únicas e limitações. Além disso, debatem acerca do uso cotidiano de cada um deles e apontam caminhos para o futuro da tecnologia.

A Lei Antifacção é boa

A Lei Antifacção, que a Câmara dos Deputados aprovou ontem e o Senado vai encarar, não é ruim. Ela também não vai resolver o problema da criminalidade urbana, tá? Mas, olha, a que o Planalto mandou também não iria. Só que o ponto é o seguinte: a lei é melhor do que o que tínhamos antes. E, pra entender bem essa lei, para entender seus efeitos, a gente tem uma felicidade. Saiu também essa semana a pesquisa do DataFavela, organizada pelo Preto Zezé, que apresenta um panorama dos brasileiros que vivem do crime nas comunidades do país como jamais tivemos. Tem um monte de lição ali se quisermos ouvi-las. Vamos começar pelo básico. O que a lei diz. Ela começa criando um tipo penal novo, o “domínio social estruturado”. Ou seja, ele acontece quando três ou mais pessoas, ligadas a uma organização criminosa ou a uma milícia, usam de violência para controlar um território. Ou para impor controle sobre determinadas atividades econômicas. Vocês entendem: Gatonet, luz, distribuição de gás, vans. Ou então usam violência para atacar alguma infraestrutura essencial. Ônibus, metrô, energia, mesmo prisões. Em essência, a lei reconhece que formar uma máfia, como as da Itália ou dos Estados Unidos, como acontece hoje no Brasil com Comando Vermelho, com PCC ou as milícias, é um crime próprio. Ter este reconhecimento, por si, já é um grande ganho. Aí a lei cria outro tipo penal. O do favorecimento do domínio social. Quer dizer, quem ajuda. Presta serviços, dá abrigo, fornece informação, guarda armas ou explosivos. Não tem esse nome, mas é o crime de associação mafiosa, que todos os países que venceram máfias tiveram de formalizar em seus códigos. Vai além nos agravantes. Se você exerce comando nesta associação, aumenta a pena. Se é sua função obter recursos para a associação, aumenta a pena. Se você é um funcionário público, um PM, um bombeiro, e participa, sua pena é maior. Se constrói ligações com outras organizações criminosas, no Brasil ou no exterior, também aumenta a pena. E, olha só, também aumenta a pena se você buscar vantagem econômica com garimpo ilegal ou exploração ilegal de florestas. Nada disso, a penetração na estrutura do Estado, o intercâmbio com o ataque à Amazônia, nada disso estava claramente numa lei. Agora, está. E é bom que esteja. Mas vamos seguir. Um juiz passa a poder bloquear, já no inquérito, ou seja, antes de uma condenação, antes mesmo de começar o julgamento, qualquer bem ligado aos crimes que estão sendo investigados. Imóveis, veículos, contas em banco, criptomoedas, participação em empresas. Até empresas inteiras. Então se um fundo na Faria Lima estiver limpando dinheiro, o juiz pode simplesmente bloqueá-lo. Pode bloquear acesso a crédito e a pagamentos, a quaisquer plataformas digitais. O confisco é antecipado. É um bocado de poder na mão da Justiça. E, olha só, mesmo que não aconteça uma condenação da pessoa, o juiz pode apreender quaisquer bens se for comprovada a origem ilícita. O confisco pode ser feito de quaisquer bens incompatíveis com a renda declarada do condenado nos cinco anos anteriores ao crime. Inclusive se estiver em nome de terceiros. E inclui na conta responsabilidade solidária de sócios e herdeiros. Não é uma lei ruim. É bom que a gente a tenha. Mas, então, por que não resolve o problema? Olha, o mundo é mais complicado do que isso, então vamos lá. Vem comigo. O problema da lei é que ela parte do seguinte princípio: se a pena for dura o suficiente, as pessoas não vão cometer o crime. Basta ter medo de ficar tempo demais na cadeia, de ferrar com a vida de filhos e netos. Só que não é assim que funciona na vida real. A pesquisa do Datafavela conversou com quase quatro mil pessoas que trabalham no crime em favelas de 23 estados do país. Gente do PCC, do Comando Vermelho, dos grupos menores. Por que as pessoas entram no crime? Para fazer dinheiro. A maioria é soldado, é olheiro, avião. São jovens, estão armados e bem mais que a metade ganha até três mil e quinhentos por mês. Mais da metade já passou pela cadeia. E, hoje, como está hoje, o Brasil precisa de 200 mil vagas nas cadeias. Vamos prender mais gente e por mais tempo? Bem, começa assim. Precisamos construir muito mais presídios. Veja, esses jovens já passaram pela cadeia. Na cabeça deles, o destino é um de dois. Ou morte cedo ou prisão novamente. Eles não acham que terão um destino diferente. Na cabeça deles, a pena aumentar não muda nada. Porque, veja, não é só que mais da metade dos entrevistados já foi presa. Mais da metade têm parentes presos ou que foram presos também. Percebe o ciclo? E, olha, eles passam uma boa parte dos dias drogados. Metade não completou o Fundamental. 7% não têm qualquer instrução formal. Só 13% têm ensino médio completo. Vivem drogados, têm pouca instrução, a vida que conhecem inclui violência e morte e cadeia. Não quero dar uma de gente de esquerda que passa a mão na cabeça de facínora, não, tá? Mas isso aqui que a gente tem é um problema social. Podemos prender mais. Devemos prender quem comete crimes. É só que a lei parte do princípio de que, se prender e prender por tempo o suficiente, resolve. Não resolve. Não resolve porque o medo de ser preso e ser morto já existe e não impede ninguém de estar nisso hoje. E tem outra coisa que a gente sabe, tá? É nas prisões que PCC e Comando Vermelho se estruturam. As prisões fazem parte da mecânica de poder destas organizações criminosas. Seria ótimo se fosse fácil resolver prendendo, é só que o tipo de cadeia que temos fortalece as facções. Não as enfraquece. Então como resolve? Bem, vamos lá. 68% dizem que não têm qualquer orgulho do que fazem. 84% dizem que não querem os filhos seguindo o mesmo caminho. Insônia, ansiedade, depressão. Se queixam de tudo e é fácil imaginar que é assim mesmo, né? É uma vida desgraçada e é como um vício. O sujeito entra e não sabe como sair. Entra no ciclo. E ele ganha muito mal. Quem acha que é uma vida de namoradas, tênis da moda e ser celebridade no morro, para a maioria deles não é nada disso. Que tipo de profissão tira seu futuro, põe a chance de você morrer jovem lá em cima, te mantem em estresse absoluto 100% do tempo e te paga dois salários mínimos por mês? A maioria diz que o dinheiro acaba antes do fim do mês, tá? 58% dizem que deixariam o crime se tivessem oportunidade econômica. É só que eles não acreditam que vão conseguir emprego. E, se conseguirem, não acreditam que vão manter o emprego. Vocês perceberam a armadilha da lei? O deputado Guilherme Derrite veio de São Paulo com um projeto ruim debaixo do braço. O governo pressionou, o Parlamento trabalhou, no final saiu um projeto direito. Ele entende as falhas que a legislação tem hoje. Ele não chama nosso problema de máfia, mas tipifica o crime, ataca a organização e vai no dinheiro. O problema que fica é o seguinte. Ele não resolve a base. Enquanto as favelas do Brasil não tiverem economias saudáveis, capazes de gerar oportunidades reais, de criar negócios capazes de pagar dois salários para quem mora lá, não vai ter resolvido. E isso acontece de duas maneiras principalmente. Uma é o Estado reocupando o território. Não adianta subir e matar. Os soldados são repostos, gente. Também não adianta subir e prender só. Os soldados são repostos. A polícia não tem de subir o morro. A polícia tem de estar no morro. Todo dia. Como está em Ipanema, como está em Higienópolis ou no Plano Piloto. A polícia tem de estar lá, o posto de saúde tem de ter médico, precisa agência do Itaú, do Bradesco e do Banco do Brasil. A concessionária pública de luz precisa poder cobrar uma conta. A banda larga tem de ser de uma empresa normal, com CNPJ. As pessoas precisam ter título das suas casas e precisam pagar IPTU. E, olha, a escola pública vai precisar começar a educar direito, tá? A gente universalizou acesso ao ensino, toda criança na escola, nos anos 1990. O passo seguinte era melhorar educação. Melhorou traço. Não pode. Muitos países resolveram seu problema de educação em menos de vinte anos. Estamos há quase trinta desde a universalização do acesso e ainda não conseguimos ensinar direito as crianças pobres do país. Ah, mas é complicado. Claro que é. O problema do Brasil é que resolver é complicado. Mas, enquanto a favela estiver à parte da cidade, será complicado. Cidades têm bairros pobres. Isso é normal em qualquer lugar do mundo. Mas favelas não são bairros pobres, são pedaços à parte das cidades. Tem de integrar a favela à cidade, tem de integrar as pessoas da favela ao pedaço da sociedade que tem direito a sonhar. Enquanto não fizermos isso, vai ter violência, vai ter barbárie. Porque, como sociedade, não conseguimos criar um ambiente em que um grupo de jovens olhem para o futuro e achem que tem uma chance de haver uma vida melhor. O diabo dessa frase, “ter direito a sonhar”, é que ela parece poesia barata. Não é isso. Se você acha que você não tem qualquer chance de ser médico ou engenheiro ou astronauta, quando tem cinco anos, a vida é ladeira abaixo. Se tudo o que você tem é tio preso, pai ausente, primo trabalhando de vapor. Esse é o tamanho do mundo para você. O que a pesquisa do Datafavela está dizendo é isso. Esses rapazes trabalham por muito pouco arriscando tudo. Eles não acreditam que vão manter qualquer emprego. E periga ser verdade. Aos 16 anos, eles já sequer se veem como parte com qualquer chance no mundo. Eles não entendem a possibilidade de outra vida. O Preto Zezé está falando isso pra gente faz quanto tempo? Dez anos? Quinze? Vinte? A gente vai parar pra ouvir quando? A lei Antifacção não é ruim. Ela está bem direita. Ela é necessária. Mas ela não é nem próximo do suficiente para resolver o problema.

Como pesquisar melhor e não cair em armadilhas de falsos descontos na Black Friday

No Pedro+Cora do dia 18 de novembro de 2025, Pedro Doria e Cora Rónai dão dicas sobre a Black Friday: como pesquisar os preços antes e criar sua lista de favoritos, em quais ofertas prestar mais atenção em produtos de tecnologia e como não cair nas armadilhas de falsos descontos.

Como máfias institucionalizadas têm tudo a ver com insegurança pública

A disputa presidencial de 2026 será uma briga apertada a ser definida por cerca de 3% do eleitorado brasileiro. Esse público decisivo valoriza o esforço, desconfia de políticos, e se preocupa com a economia, a segurança e a corrupção. Essa sensibilidade moral conecta-se à percepção da sociedade de que o crime organizado não é "terrorismo", mas sim uma máfia que atua corrompendo policiais, empresários e políticos. No Ponto de Partida React, desta sexta-feira (14), Yasmim Restum e Pedro Doria conversam sobre o conceito e máfia e como essa corrupção institucionalizada tem conexão direta com a pauta da segurança pública como moeda eleitoral mais do que valiosa nas próximas eleições. Yasmim Restum e Pedro Doria te guiam nessa jornada com uma seleção dos comentários que vocês enviam nas redes sociais e canais do Meio. Para participar, comente nos vídeos do Ponto de Partida de segunda ou quarta. Assista em vídeo no Youtube, e acompanhe em áudio no seu tocador de podcasts preferido.

As novas profissões criadas pela inteligência artificial

No Pedro+Cora do dia 13 de novembro de 2025, os jornalistas Pedro Doria e Cora Rónai conversam sobre as três novas profissões que surgiram com o avanço da inteligência artificial. No papo, discutem como o mercado de trabalho está mudando, quais são essas novas funções, o que elas exigem de quem deseja se especializar e como a IA está moldando o futuro das carreiras.

Quem elegerá o próximo presidente?

Um grupo muito pequeno de brasileiros, apenas 3% do eleitorado, decidirá o próximo presidente da república. São mulheres, de classe C, mulheres jovens das periferias urbanas do Sudeste. E um novo levantamento do Instituto Ideia nos ensina muito sobre elas.

Derrite altera relatório de PL Antifacção e volta atrás sobre atuação da PF

O relator do projeto de lei Antifacção na Câmara, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), incluiu no texto uma proposta que pode restringir a atuação da Polícia Federal no enfrentamento ao crime organizado. Depois da repercussão negativa, o trecho foi suavizado em uma nova versão apresentada ontem. Mesmo assim, a PF ainda avalia que o projeto reduz sua autonomia. O Central Meio desta terça, 11 de novembro de 2025, recebe o cientista político Paulo Henrique Cassimiro, professor de Ciência Política IESP e UERJ.

O brasileiro entendeu tudo

A tese da esquerda, para a eleição de 2026, é simples. Defesa da soberania nacional e discurso contra as elites. É isso. Ou seja, a direita quer atacar o Brasil e os ricos têm de contribuir mais. A aposta da direita também é simples. Esta será uma eleição sobre segurança pública. O brasileiro não está em paz, tem medo de ser assaltado, e a esquerda está mais preocupada com o bandido do que com o cidadão de bem. É claro que um está fazendo uma caricatura do outro, mas eleição é assim. Faz duas semanas que aconteceu a operação no Morro do Alemão e a esquerda segue sem uma resposta clara para dar. Mas e a direita? Em grande parte, os políticos de direita estão tentando entender para onde ir. O que já é claro para todos? Lula perdeu uns pontinhos de popularidade, então na direita já se sabe que foi uma vitória. A primeira vitória, da direita, em vários meses. Mas sabe quem perdeu mais do que Lula no Alemão? Jair Bolsonaro. Porque, veja, há décadas que Bolsonaro é o político dono da frase “bandido bom é bandido morto” no Congresso Nacional. Era o primeiro deputado que apareceria na cabeça de qualquer um quando alguém justificava violência policial. E, no entanto, ninguém da família Bolsonaro viabilizou, chamou atenção, puxou decisões para si. Nada. Isso é importante, tá? Porque é uma mudança. Na opinião popular, foi uma derrota pequena do governo federal e uma derrota gigante da família Bolsonaro. Naquele episódio, o resto da direita ganhou independência e espaço para agir. A cada momento assim, a relação de poder interna da direita muda. Os partidos de direita vão precisando menos da popularidade de Bolsonaro e a família Bolsonaro vai dependendo mais dos favores de políticos de direita com poder. Guilherme Derrite, o secretário de Segurança do estado de São Paulo, deixou o cargo para voltar à Câmara dos Deputados e relatar o projeto da Lei Antifacção, enviado pelo Palácio do Planalto. O texto vai ser muito mexido. Os governadores começaram a chamar esses grupos criminosos como o Comando Vermelho de terroristas. Derrite foi para a Câmara fazer isso, trazer a palavra terrorismo para o centro do palco. Só que ele tem um problema que não é pequeno nessa operação. Terrorismo é um crime tão grave que quem cuida dele é a União. É o governo federal. É um crime contra o Estado nacional. Isso quer dizer que uma lei que classifique como terroritas os traficantes tira poder dos governadores e o entrega para o presidente Lula. Isso, ora, a direita não quer. Tem outros problemas, também. Se o Brasil começa a dizer para o mundo que tem grupos terroristas agindo em seu interior, o país abre espaço para sanções econômicas, empresas brasileiras podem ter investimentos cortados nelas se houver suspeita de envolvimento com o crime. Investimento cai. Ações militares contra o Brasil entram no radar. Classificar legalmente como terrorista é uma dor de cabeça que os governadores de direita não querem. Mas ao mesmo tempo, eles querem o peso da palavra para fazer campanha eleitoral. A saída de Derrite é montar um Frankenstein. Trata todas as penas como se fosse terrorismo sem chamar de terrorismo. Mas tem um problema aí, tá? Porque estão pensando errado sobre esse crime. Terrorismo é essa palavra que enche a boca, impõe gravidade, mas é pensar errado sobre o problema que o Brasil tem. Grupos terroristas atuam politicamente. Seu objetivo é ter ganhos políticos. A base pode ser ideológica, para grupos paramilitares fascistas ou comunistas. A base pode ser nacionalista, como foram IRA e ETA, na Europa, o a OLP, da Palestina. Pode ser religiosa, como é o caso do Hamas o da al-Qaeda. Mas, fundamentalmente, o objetivo é ter um ganho político. O Comando Vermelho, o PCC ou as milícias cariocas não estão nem aí pra isso. Seu objetivo é econômico. Querem ganhar dinheiro com o crime. Então como é que chamamos grupos que corrompem a polícia e o Estado, tomam o controle de certos territórios? Que cobram uma tributação própria. Vão lá e achacam o dono da birosca, o sujeito que dirige a van. Se quer trabalhar nessa área, tem de me pagar um arrego? Como é que chamamos um crime que impõe certos serviços. Luz, compra de mim. TV a cabo? Compra de mim. Gás? Segurança? Se estes grupos começam a ficar tão poderosos que, além de entrar na Polícia e no Estado, também começam a se impor em grandes negócios, e forçar sociedade em empresas de capital aberto, e encontram outros caminhos de lavagem de dinheiro, qual é o nome que damos para esse tipo de crime? A gente pode dar um passo além. O que acontece se estes criminosos começam a ter seus próprios deputados, seus próprios políticos? Isso tem nome, gente. Tem série de TV, tem filme, aliás tem grandes séries de TV e grandes filmes sobre exatamente este tipo de crime, brutal, que depende de substituir o Estado em sua atuação. O nome é máfia. E sabe de uma coisa? Tem uma nova pesquisa, do Instituto Ideia, que mostra com clareza que a população está entendendo tudo do que está acontecendo. Vem comigo. O Ideia fez essa pesquisa em 6 de novembro e nos dá muito mais sutileza sobre o que o brasileiro pensa sobre o problema do crime que ocupa territórios de cidades, como acontece aqui no Rio mas não só. Quando a polícia é aplaudida por matar, a sociedade presta menos atenção na corrupção dentro dela. 48% concorda. 19% discorda. Quando as pessoas se sentem inseguras, aceitam que a polícia aja sem prestar contas por seus atos. 50% concordam, 21% discordam. Quando a polícia tem liberdade para agir sem prestar contas, a corrupção dentro dela aumenta. 61% concorda, 15 discorda. A violência da polícia leva o crime a se armar mais e isso faz a polícia agir com mais violência. 50% concordam, 25% discordam. Ver mortes em operações dá a sensação de que a polícia está agindo, mesmo sem resolver o problema. 51% concordam, 21% discordam. Segura essas, vamos para outro pacote de perguntas. O envolvimento de policiais, empresários e políticos corruptos dificulta o combate ao crime organizado. 81% concordam, 5,4% discordam. O combate ao crime deve priorizar a investigação e punição dos chefes, empresários, políticos e policiais corruptos. 80% concordam, 5% discordam. Facções e milícias crescem porque conseguem circular dinheiro e armas com ajuda de gente influente. 84% concordam, 4% discordam. O acesso de criminosos presos a celulares mostra que parte da polícia e do Estado participam do crime. 74% concordam, 7% discordam. A sociedade percebe que uma polícia mais violenta não resolve nada. E a sociedade tem toda a convicção de que o problema está dentro das polícias, dentro das assembleias legislativas, até em alguns palácios de governos. Com a Cosa Nostra, foi assim. Com a máfia de Al Capone, na Chicago dos anos 1930, igual. Estes sistemas criminosos se tornam intermediários entre mercados ilegais e o poder público. Fazem isso corrompendo. Ambos criam toda uma rede de economia paralela, com negócios que incluem drogas, contrabando, jogo, prostituição, venda de gás, transporte, TV a cabo. A partir daí, porque tem muito dinheiro sujo acumulado, começam a penetrar em negócios legítimos para fazer a lavagem da grana. O ponto aqui é o seguinte. Existem soluções conhecidas. Para lidar com máfias, é preciso seguir simultaneamente dois caminhos. O primeiro é ir atrás do dinheiro. Esses grupos criminosos geram muito dinheiro e precisam lavá-lo. A gente precisa entender como estão lavando suas fortunas e cair dentro dos mecanismos e das empresas que resolvem este problema deles. O segundo caminho é o de reocupação de territórios. Se tem um bairro de uma cidade em que o bandido pode chegar prum pequeno empresário e dizer metade do seu lucro, paga pra mim, a polícia tem de agir. Inclusive com força. Para impedir. Mas, para que a ação da polícia tenha sucesso, a gente não foge de fazer uma limpa dentro da polícia e dentro da política. Porque, vejam, existe uma razão para o problema não ter sido resolvido. A polícia trabalha mais para o crime do que para a sociedade. Em muitos estados, os políticos locais trabalham mais para o crime do que para a sociedade. Olha a pesquisa do Ideia. Os brasileiros já sabem disso.

Aprendizados: Mamdani em NY e megaoperação no Rio

Transporte público com gratuidade universal, creches em tempo integral, congelamento de alugueis. Tudo isso faz parte das promessas de governo de Zohran Mamdani, democrata que é hoje o mais jovem prefeito de Nova York - socialista e muçulmano.

Mamdani para Esquerda e Centro

A eleição de Zohran Mamdani traz lições para o Partido Democrata, nos Estados Unidos? Mais do que isso, traz lições para a esquerda para além dos Estados Unidos? E para o Centro liberal? A resposta é, sim, traz. Mas calma, nem todas as lições são óbvias. Algumas das características do sucesso de Mamdani, como candidato, são muito tipicamente novaiorquinas e não se aplicam ao resto dos Estados Unidos, quanto mais ao mundo. Às democracias ocidentais. Mas tem outros pontos que fizeram parte da campanha que têm eco para muito além da cidade. Antes de tudo, Mamdani jamais será presidente dos Estados Unidos. Ele nasceu em Uganda. De acordo com a Constituição, apenas americanos natos podem se candidatar à Casa Branca. Mas ele pode ser Speaker da House, que é tipo presidente da Câmara e é o cargo mais alto do Congresso. O futuro dele é esse. Se tudo der muito certo na Prefeitura, pode também seguir o caminho de Bernie Sanders, que foi prefeito de Burlington, a maior cidade de seu estado, Vermont, e de lá se tornou o senador mais à esquerda do Congresso. Bernie está com 84 anos. Precisa de um sucessor de líder da esquerda Democrata. Elizabeth Warren, outra senadora, é um nome. A deputada Alexandria Ocasio-Cortez pode ser candidata ao Senado no ano que vem. Mais carismática do que Warren. Tem uma disputa aí. Esse é meio que o tamanho da esquerda americana, tá? Esquerda como nós a reconheceríamos na América Latina e na Europa, lá são uns cinco, seis deputados federais, dois senadores, e agora o prefeito de Nova York. E esse é o primeiro ponto a compreender sobre o Mamdani no cenário americano. A cidade de Nova York é um dos cantos mais progressistas do país. A Califórnia é barbaramente progressista. Mas essas são exceções. Um político muçulmano, filho de um professor da Universidade de Columbia e uma cineasta iraniana, que se declara socialista, de tempos em tempos pode encantar um lugar como Nova York. É uma cidade do mundo, cosmopolita, e que se orgulha disso. Nova York é onde a expressão “melting pot” surgiu. O caldeirão de gentes diferentes que se derretem e se misturam para virar uma coisa particular, única. E, ironicamente, a cidade símbolo dos Estados Unidos talvez seja uma das cidades menos americanas dos Estados Unidos. Isso quer dizer que alguém com o discurso de Mamdani não tem qualquer chance de se eleger presidente americano? Calma. Eu não iria tão longe. Só que, antes, é preciso entender que Mamdani representa, ao mesmo tempo, duas esquerdas diferentes. Sim, porque há muitas esquerdas, assim como há muitas direitas. Por um lado, aos 34 anos, com esse perfil cosmopolita, filho de pais sofisticados culturalmente, ele dá liga muito fácil com um tipo muito particular de eleitores jovens, muito comuns nas grandes universidades americanas. O eleitor woke. Não é só isso. Foi justamente no campus da Universidade de Columbia que se deu o maior conflito entre o governo Trump e os estudantes que se levantaram contra Israel por conta da guerra em Gaza. Um dos intelectuais mais influentes do mundo woke, do mundo identitário, é Edward Said, professor de Columbia, que morreu em 2003. Ele popularizou dentro da academia, nos anos 1970 e 80, a ideia de Orientalismo. Ele é o pai intelectual do conceito de Decolonialismo. O antropólogo Mahmood Mamdani, seu colega em Columbia, era também um de seus mais próximos amigos e colaboradores. Amigos íntimos mesmo, de se frequentarem, de um ajudar o outro quando tinha algum apuro. Pai de Zohran. O discurso que os estudantes de Columbia mobilizados contra Israel era puro Said. Era puro Mamdani pai. Neste momento da história, em Nova York, com Donald Trump na presidência, aqueles estudantes e os não-estudantes mas que estão ali pela faixa dos vinte anos e são igualmente bem-educados, progressistas, novaiorquinos, pertencem pesadamente a este universo que constrói esse discurso. Mamdani é um político talhado para se encaixar no seu ideal de candidato. Só tem um problema: o resto dos Estados Unidos, inclusive muita gente que vota Democrata, criou verdadeiro horror a este movimento. O considera radical, alienado, e autoritário. Aqui não importa se concordamos ou não. É como é percebido. Em Nova York, na Califórnia, vai ter muito lugar em que o eleitorado vai gostar. No resto do país? Não tem chance. Só que, e esse “só que” é muito importante aqui, Mamdani pertence a outra esquerda. Uma esquerda que tem um pesado discurso econômico preocupado com desigualdade, que deseja maior presença do Estado na economia. Intervencionista e distributivo. Sua campanha foi feita com inteligência. Ele quase apagou o discurso woke, sabia que já tinha aqueles eleitores garantidos. E jogou lá pra cima o discurso econômico. Esse é um discurso que encontra muitos eleitores. Tanto a esquerda quanto o Centro Liberal precisam aprender muito sobre este lado de Mamdani e, principalmente, com seus eleitores. Não bastasse, tem uma última lição. 34 anos. Não pertence mais ao mundo da televisão. Pertence ao mundo do Instagram e do TikTok. Para ele, essa é a comunicação mais natural. Mamdani é um político que não está na direita e faz redes sociais como ninguém. A globalização dos anos 1990 e início dos 2000 foi muito boa pra uma quantidade muito grande de pessoas. 23%, quase um quarto da população mundial, passava fome quando o Muro de Berlim caiu. Em 2020 esse número estava por volta de 9%. Para os muito pobres, a globalização representou uma melhoria de qualidade de vida sem igual. Na Ásia, a classe média explodiu. Uma quantidade gigante de pessoas teve uma melhoria sem igual de qualidade de vida. O número de muito ricos também aumentou. Mas a globalização teve custo para dois tipos de pessoa. Operários do mundo desenvolvido perderam empregos que pagavam bem e eram estáveis. Despencou o número de vagas boas para homens com ensino médio, principalmente nos Estados Unidos e Europa, mas também na América Latina. E a classe média tradicional no mundo desenvolvido estagnou. Não teve ganho relevante, alguns até pioraram de vida. Então, na Europa e nos Estados Unidos, a distância entre os muito ricos e a classe média e os operários ficou gigante. No mundo das empresas, vimos uma concentração imensa de alguns grupos. Formação aberta de monopólios e oligopólios, principalmente na nova elite da indústria de tecnologia. Temos problemas de regulação. Para os mais jovens, essas coisas se juntam. A tecnologia vai aos poucos tornando mais difícil acesso a bons empregos para recém-formados. Nas grandes cidades do Ocidente, essa concentração de renda por um lado, e o achatamento da classe média tradicional do outro, cria um problema mais agudo. O valor de imóveis vai escalando, morar em centro urbano vai encarecendo muito, porque tem muito mais bilionário e milionário. A classe média profissional e estudada, quanto mais jovem for, mais dificuldade tem em morar no mundo cosmopolita. Se a esquerda abandona o woke, o identitarismo, que afasta eleitores, e mergulha em propostas econômica, ela terá muito eleitor para disputar com a direita populista. O Centro Liberal não carrega o peso woke, mas precisa revisitar o resultado da globalização. Não devia ser difícil. Liberais são pró-mercado, pró-concorrência, enfrentar monopólios deveria ser natural no discurso. E compreender que regras são necessárias para promover igualdade de oportunidades, que há dois séculos liberais defendem igualdade de oportunidades, deveria ser o suficiente para voltarmos a imaginar políticas públicas que encaram o problema. Por fim, precisamos todos fora da direita dura um banho de loja em comunicação. Só virá com mais políticos jovens. Gente para quem a comunicação digital é natural, vai no fluxo. A eleição de Zohran Mamdani é simultaneamente fruto de uma cultura progressista e woke que só tem em Nova York. Mas é também fruto de uma concentração de riqueza que está tornando muito, muito difícil para alguém bem formado e com trinta e poucos viver numa cidade global. Nas grandes cidades brasileiras, esse fenômeno também ocorre. Congelar preço de aluguel não vai resolver o problema. Mas isso não quer dizer que outras soluções não sejam possíveis. Sabe, temos trabalho para fazer. Tem certos temas nos quais só a direita autoritária e populista mergulha. É hora de repensar políticas, de imaginar, de criar. O mundo do século 21 tem problemas que não são os mesmos do século 20. As soluções terão de ser novas.