Brasil vai ao 2º turno com Bolsonaro e Haddad

Jair Bolsonaro e Fernando Haddad disputarão em segundo turno o Palácio do Planalto. O capitão reformado teve quase 50 milhões de votos, 46% dos válidos, enquanto o petista levou 30 milhões — 29%. Os dois terão, a partir de hoje, três semanas de campanha até o domingo, dia 28, quando os brasileiros voltam às urnas. A propaganda eleitoral gratuita começa amanhã, terça-feira, e se dividirá em dois períodos diários de 20 minutos. São dez minutos para cada candidato — às 13h e às 20h30, na televisão. Em dias alternados, falam candidatos aos governos estaduais e os presidenciáveis.

O candidato militar não deu a tradicional entrevista coletiva, tampouco fez o habitual discurso num ambiente cheio de militantes. Preferiu uma transmissão ao vivo pelas redes sociais. “Ganhamos em quatro regiões”, afirmou. “Perdemos no Nordeste, mas nossa votação lá foi muito boa.” Seu discurso foi de união. “Temos tudo para sermos uma grande nação, unir nosso povo, unir os cacos que nos fez o governo da esquerda no passado.” Para ele, foram falhas que não especificou nas urnas eletrônicas que impediram a vitória no primeiro turno. “Vamos junto ao TSE exigir soluções para isso que aconteceu, e não foi pouca coisa.”

Haddad seguiu a tradição, e falou de um palanquete no Hotel Pestana, em São Paulo, a aliados e jornalistas. “Há muita coisa em jogo no Brasil”, disse tendo de um lado sua vice, Manuela D’Ávila, e do outro a presidente do PT, Gleisi Hoffman. “Essa é uma eleição incomum, muito diferente de todas as que participamos. Vamos enfrentar esse debate no campo democrático com uma única arma: o argumento.” Seu principal desafio será o de formar um arco grande de alianças — se propôs a isso. “Queremos unir os democratas do Brasil, um projeto amplo que busque de forma incansável justiça social.”

Ciro Gomes teve 13 milhões de votos, o equivalente a 12,5% dos válidos. Geraldo Alckmin, 5 milhões, quase 5%. João Amoêdo chegou em quarto, 2,7 milhões de votos ou 2,5%. Cabo Daciolo é o quinto (1,26%), seguido de Henrique Meirelles (1,20%) e Marina Silva (1%).

Muito sorridente, quase eufórico, até, Ciro falou a jornalistas na frente de seu prédio logo após o segundo turno se confirmar. “Vou comemorar agora a vitória do Camilo, a do senador Cid Gomes, que é o meu orgulho, fizemos uma extraordinária maioria na Assembleia Legislativa do Ceará”, afirmou, se referindo à eleição em primeiro turno para o governo local do petista Camilo Santana, a quem apoiou. “Minha história de vida é de defesa da democracia e contra o fascismo”, seguiu, deixando ainda no ar qualquer tratativa de apoio formal a Haddad. Um jornalista pediu que fosse um pouco mais claro. “Ah”, falou o ex-ministo, “ele não, sem dúvida.”

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Sérgio Abranches: “O presidencialismo de coalizão passará por um teste inédito. O eixo político-partidário que organizou o sistema político se desfez. O PSDB definha como força política. O atropelamento de Antonio Anastasia por Romeu Zema, em Minas, deixa o partido apenas com alguma chance em São Paulo, com um candidato que não é do núcleo duro. O PT sofre uma derrota icônica, com Pimentel e Dilma, e fica confinado ao Nordeste. Esses resultados apontam para uma mudança na composição de forças no Congresso. Reforça a hipótese de que haverá vários partidos médios, com bancadas entre 35 e 50 deputados, e nenhuma megabancada. O presidente precisará de uma coalizão mais numerosa e heterogênea. Confirmada esta hipótese, os problemas do novo presidente serão mais centrados nas relações com seus aliados, do que nos embates com a oposição. O resultado representa, de qualquer forma, uma ruptura com o padrão que dominou a política da Terceira República nas últimas duas décadas e meia. Ele foi responsável pela estabilidade democrática, apesar das máculas da corrupção. A estabilidade mostrou-se resiliente a crises econômicas, a mudança de polo no controle da Presidência, do PSDB para o PT, e ao impeachment de Dilma. Agora, entrará em águas desconhecidas e enfrentará um teste inédito. Acresce-se a este quadro a aguda polarização da sociedade, com seus reflexos políticos. Uma polarização que opõe não mais partidos estruturados, mas visões polares e altamente emocionais. Essa combinação entre uma composição mais fracionada do Congresso, sem partidos dominantes, e a polarização social, é inédita. É sem precedentes e de alto risco político.”

Christian Lynch: “Aparentemente, em 3/4 do país, houve grande rejeição não só do PT quanto de seus aliados históricos à direita, isto é, ao bloco que sustentou os governos Lula e Dilma. Sofreu fadigas pelo longo tempo de poder, imensos desgastes com os escândalos de corrupção e acabou metralhado pela Lava Jato. Esse antigo bloco ficou encurralado no Nordeste, onde venceram candidatos da esquerda mas também Renan Calheiros e outros. Tornar-se um ‘partido nordestino’ não é bom sinal: a região costuma ser o último reduto de grandes partidos em seu ocaso, como o PFL. Para que Haddad vença, dobrando a resistência ao petismo no Sul e no Sudeste, terá de abandonar a retórica do ‘golpe’ que fracassou em eleger Dilma e Lindbergh. Terá de ser mais ele mesmo e menos Lula. Por outro lado, embora a vantagem de Bolsonaro seja enorme e seu eleitorado firme, ele terá pela frente o desafio de se ‘normalizar’, ou seja, se apresentar mais claramente de forma propositiva e não somente ‘reativa’. A estratégia de guerrilha internáutica e a conveniente invisibilidade do capitão, facilitando sua assimilação ao ‘anti-tudo’, não poderão continuar. Bolsonaro terá muito espaço de televisão e terá de esclarecer projetos de país. Terá, sobretudo, que caminhar para o centro e se moderar, ou seja, apresentar-se como um possível chefe de Estado ‘normal’. Será Bolsonaro capaz de fazer isso de modo crível sem perder apoiadores? Para vencer a eleição, os dois terão de caminhar para o centro sem se descaracterizarem.”

Pois é... A Câmara dos Deputados passará a ser mais claramente dividida entre direita e esquerda. São justamente os partidos de Bolsonaro e Haddad que terão as maiores bancadas: PT e PSL elegeram mais de 50 deputados cada e serão as siglas com mais força na Casa. O deputado federal mais votado é Eduardo Bolsonaro, filho do presidenciável. Ele desbancou Enéas Carneiro, Celso Russomanno e Tiririca e tornou-se o deputado federal com mais votos na história. Candidato do PSL em SP, recebeu, segundo O Globo, mais de 1,7 milhão de votos.

A Operação Lava Jato é uma vitoriosa. O número de investigados por ela que não conseguiram se reeleger é grande, até mesmo entre os mais conhecidos. No Ceará, o presidente do Senado, o emedebista Eunício Oliveira, buscava um novo mandato mas acabou ficando em terceiro lugar em uma eleição disputada. O mesmo aconteceu em Roraima, com o presidente nacional do MDB, Romero Jucá. A família Sarney foi abatida quase por inteiro do poder. Não deu para Roseane Sarney, do MDB, que acabou vencida na disputa pelo governo maranhense por Flávio Dino, reeleito. Sarney Filho e Edison Lobão também não conseguiram espaço no Senado. Ficou solitário um neto do ex-presidente, que se elegeu para a Assembleia local.

Não é uma lista pequena entre investigados ou mesmo entre aqueles que a combateram. A começar pela ex-presidente Dilma Rousseff, que teve no impeachment os direitos políticos mantidos, mas que o povo mineiro escolheu tirar da política por um tempo. Ela ficou em terceiro e não vai ao Senado. Lista longa mesmo. Inclui ainda Beto Richa, tucano do Paraná. Lindbergh Farias, do PT fluminense. Delcidio Amaral, do PTC sul-mato-grossense. Marco Antonio Cabral, filho de Sergio Cabral; Daniele Cunha, filha de Eduardo Cunha; Leonardo Picciani, filho de Jorge Picciani — os três representantes do núcleo central do MDB do Rio. Não entrou tampouco Cristiane Brasil, do PTB-RJ, filha de Roberto Jefferson. Ou ainda: Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM); Cassio Cunha Lima (PSDB-PB); Garibaldi Alves Filho (MDB-RN); Wadih Damous (PT-RJ); Lúcio Vieira Lima (MDB-BA), irmão de Geddel. E, no Espírito Santo, o quase vice de Jair Bolsonaro, Magno Malta, do PR.

No total, MDB, Rede e PP elegeram o maior número de senadores. Serão 21 partidos na composição da Casa a partir de 2019 — a maior fragmentação da história. Veja todos os eleitos.

Entre os deputados estaduais, levou o título de deputada mais votada da história a advogada e professora Janaína Paschoal, do PSL. Ela recebeu mais de 2 milhões de votos em São Paulo, foi eleita para a Alesp e superou o recorde histórico para o legislativo estadual e federal.

Maior colégio eleitoral do país, São Paulo terá segundo turno na eleição para governador. Disputarão o Palácio dos Bandeirantes o tucano João Doria, que teve 31,77% dos votos, e o atual governador Márcio França, do PSB, que em uma arrancada de última hora passou o emedebista Paulo Skaf e garantiu a segunda vaga com 21,53% dos votos. Houve reviravolta também no Senado: Eduardo Suplicy, do PT, que aparecia em primeiro lugar nas pesquisas eleitorais, acabou ficando de fora, em terceiro lugar. Foram eleitos Major Olímpio, do PSL, e Mara Gabrilli, do PSDB. Veja a apuração completa.

No Rio, o resultado do primeiro turno surpreendeu. Até sábado, as pesquisas indicavam que Romário, do Podemos, iria para o segundo turno com Eduardo Paes, do MDB. Mas Wilson Witzel, do PSC, virou o jogo — dias após declarar seu apoio ao presidenciável Jair Bolsonaro. Terminou o primeiro turno em primeiro lugar, com 41,28% dos votos, e disputará o cargo de governador com Paes, que teve 19,56%. No Senado, foram eleitos Flavio Bolsonaro, do PSL, filho de Jair Bolsonaro, e Arolde de Oliveira, do PSD, que disputou até o fim da apuração a segunda vaga com Cesar Maia do DEM. Veja a apuração completa.

Em Minas, outro candidato que declarou apoio a Jair Bolsonaro na última semana viu seu desempenho subir nesse primeiro turno. Romeu Zema Neto, do Novo, teve 42,73% dos votos e disputará o segundo turno para governador com o tucano Antonio Anastasia, que teve 29,06%. O petista Fernando Pimentel, que tentava a reeleição, ficou em terceiro e acabou fora da disputa. Também houve surpresa na disputa para o Senado: a ex-presidente Dilma Rousseff, do PT, figurava em primeiro lugar nas pesquisas eleitorais, mas acabou em quarto e não conseguiu se eleger. Foram eleitos Rodrigo Pacheco, do DEM, e Carlos Viana, do PHS. Veja a apuração completa.

No Rio Grande do Sul, a disputa para o governo será entre Eduardo Leite, do PSDB, que teve 35,90% dos votos, e José Ivo Sartori, do MDB, que recebeu 31,11%. Nas pesquisas para o Senado, Paulo Paim, do PT, disputava a preferência ponto a ponto com José Fogaça, do MDB. Mas quem acabou se elegendo junto ao petista foi Luis Carlos Heinze, do PP. Veja a apuração completa.

Também houve reeleições em primeiro turno — 13, no total (Folha). Na Bahia, Rui Costa, do PT, garantiu mais quatro anos a frente do estado. Ele teve 75,71% dos votos. Com isso, o PT se consolida no comando do executivo estadual por 16 anos consecutivos. Foram eleitos para o Senado Jaques Wagner, do PT, e Ângelo Coronel, do PSD. Veja a apuração completa.

Em Pernambuco, Paulo Câmara, do PSB, também foi reeleito em primeiro turno. Foi por pouco: ele teve 50,70% dos votos válidos. Armando Monteiro, do PTB, teve 35,99%. Para o Senado foram eleitos Humberto Costa, do PT, e Jarbas Vasconcelos, do MDB. Ambos compuseram a chapa de Câmara. Veja a apuração completa.

No Ceará, a vitória foi petista. Camilo Santana foi reeleito com folga, com 79,96% dos votos. Ele é afilhado político de Ciro Gomes e foi eleito governador em 2014 com o apoio político do grupo do pedetista. Camilo sucedeu Cid Gomes, irmão de Ciro, no comando do Executivo cearense. Cid, aliás, foi eleito senador junto a Eduardo Girão, do PROS. Veja a apuração completa.

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