Prezadas leitoras, caros leitores —

Nos feriados, habitualmente, o Meio não circula. Neste de hoje, em que deveríamos estar celebrando o Bicentenário do Brasil, não dá. O presidente da República parte para o tudo ou nada, numa grande celebração golpista que visa mobilizar seus eleitores.

Esta edição extra trata, portanto, apenas da Política. Ontem, em entrevista ao #MesaDoMeio, o ex-ministro da Defesa Celso Amorim afirmou que vê possibilidade de confusão, mas não de envolvimento dos militares em ruptura institucional.

Hoje, nossa equipe estará acompanhando cada momento em Brasília, no Rio e em São Paulo. Às 19h, estaremos ao vivo no YouTube para um Conversas com o Meio especial. Faremos um balanço do dia. E, amanhã, a cobertura completa. Como sempre. Em 8 minutos.

— Os editores

Edição Extra: Hoje é o tudo ou nada de Bolsonaro

Se o desfile do Bicentenário da Independência em Brasília terá hoje algum verniz de festa cívica, no Rio o evento da tarde é explicitamente político, apesar da participação de militares. A começar pelo local, a orla de Copacabana, palco de atos de apoio ao presidente. Como conta Malu Gaspar, o presidente Jair Bolsonaro (PL) não vai ocupar o palanque montado pelo Exército, e sim o trio elétrico do pastor Silas Malafaia, um dos mais ferrenhos apoiadores do governo. Ali se reunirão autoridades, líderes evangélicos e empresários, incluindo os investigados por pregarem um golpe de Estado. A escolha do trio busca evitar problemas com a Justiça Eleitoral, como aconteceria se Bolsonaro pedisse votos em instalações das Forças Armadas. Uma ausência notável, revela Lauro Jardim, será a da primeira-dama Michelle Bolsonaro, estrela em eventos com evangélicos. O comando da campanha teme que “o clima esteja confuso”. Certamente estará barulhento. O Exército avisou aos moradores de prédios vizinhos ao Forte de Copacabana que serão feitas salvas de canhão ao longo do dia. A orientação é manter as janelas abertas para “evitar danos”. (Globo)

Então... A natureza política da festa se mostra: Bolsonaro não contará com a presença dos líderes dos outros Poderes no Bicentenário. Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiram não comparecer, como conta Luciana Lima, repórter especial do Meio. Esteio do apoio ao presidente no Congresso, Lira preferiu ficar em Maceió, trabalhando pela própria reeleição, embora vá participar de atos na capital alagoana. Já Pacheco foi mais direto e disse que o Legislativo comemorará a data amanhã numa cerimônia “verdadeiramente cívica”. Bolsonaro foi convidado, mas o cerimonial do Planalto não confirma sua presença. (Meio)

Não só. No Distrito Federal, outro de seus aliados, o governador Ibaneis Rocha (MDB), decidiu enfrentar o presidente. Na tarde de ontem, dois militares estavam cadastrando cerca de 60 caminhoneiros para participarem na manhã de hoje do desfile pelo Bicentenário da Independência. A inciativa fere uma determinação do governo do DF proibindo a entrada de veículos na Esplanada dos Ministérios. O bloqueio da área, marcado para a tarde de ontem, havia sido antecipado para a noite de segunda-feira exatamente porque caminhoneiros tentavam chegar ao local antes do fechamento. Procurado depois da ação dos militares, o governador reiterou o veto: “Neste 7 de setembro, só entra gente na Esplanada. Não está autorizada entrada de caminhão”, disse Ibaneis. (Metrópoles)

O governador resolveu comprar a briga porque, candidato à reeleição, quer evitar atritos com o Judiciário. No ano passado, partiram de caminhoneiros as tentativas de invasão do STF e o ataque com fogos de artifício ao prédio da Corte. (Meio)

Aliás... O PT recorreu ao STF acusando Bolsonaro de ter “cooptado o desfile cívico-militar” de 7 de Setembro. O partido entrou como parte interessada numa ação em que o presidente é investigado por abuso de poder político e econômico ao usar as comemorações do Bicentenário em proveito de sua campanha. (Veja)

Há um clima de tensão. Policiais militares do Rio e de São Paulo, onde haverá um evento sem a presença do presidente, estão usando redes sociais para combinar a presença nos desfiles e ameaçar políticos e militantes de esquerda. “Setembro até morte vai ter, pode esperar”, escreveu um dos usuários. (Poder360)

O que já houve foi um acidente. Paraquedistas, pelo menos um deles da Aeronáutica, faziam ontem um salto em Copacabana, onde devem se apresentar hoje, quando uma rajada de vento os jogou na direção de prédios e árvores. Um deles foi levado em estado grave para o Hospital Miguel Couto, na Zona Sul. Outro, um suboficial da FAB, recusou atendimento dos bombeiros e deixou o local numa ambulância do Exército. (UOL)

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Divulgada na madrugada de hoje, a nova pesquisa Quaest/Genial aponta que a distância entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) caiu para 10 pontos. O petista segue estacionado em 44% das intenções de votos, mas o presidente subiu dois pontos, no limite da margem de erro, indo a 32%. Ciro Gomes (PDT) caiu de 8% para 7%, enquanto Simone Tebet foi de 3% para 4%. Num cada vez mais provável segundo turno, Lula venceria Bolsonaro por 51% a 39%. (UOL)

Com o estreitamento da distância para Bolsonaro, Lula partiu abertamente para a pregação do voto útil. “Não tem por que ter vergonha de tentar ganhar no 1º turno. Se quem tem 5% sonha em ter 40%, porque quem tem mais de 40% não pode sonhar em ter mais um pouquinho e ganhar no primeiro turno?”, questionou Lula, em entrevista a uma rádio. Segundo a pesquisa Ipec divulgada na segunda-feira, mais da metade dos eleitores de Ciro e Tebet admitem mudar o voto. (Meio)

Meio em vídeo. Lula, Simone e Soraya fazem discurso pela democracia, pela recuperação da bandeira e por união nacional na véspera do 7 de Setembro. Enquanto isso, Bolsonaro arranja um jeito de mostrar um assassinato na propaganda eleitoral — para acusar Lula. Ciro tenta explicar que está melhor nas pesquisas do que os outros. E o PTB apresenta seu candidato: um padre fake. Fake mesmo. Veja as reações de Pedro Doria ao horário eleitoral gratuito. (YouTube)

Vera Magalhães: “O Judiciário está isolado na trincheira da tentativa de contenção do presidente, de seus mais radicais apoiadores e do financiamento desses atos que já minaram um grande pedaço do espaço da convivência democrática — uma vez que quem não se coaduna com essa pauta golpista é instado a ficar em casa no feriado para evitar conflitos. Nosso arcabouço legal, a Constituição incluída, não foi erguido com instrumentos rápidos, fortes e seguros para matar no nascedouro conspirações como a que Bolsonaro mais uma vez encabeça. Ferramentas como os inquéritos das fake news e das milícias digitais, além de decisões acertadamente restritivas ao uso de armas e celulares no dia da eleição, tomadas pelo TSE, são os únicos recursos à disposição para enfrentar um plano urdido à luz do dia que, no limite, levará a que as Forças Armadas sejam arrastadas para contestar o resultado das eleições. Os militares já estão sendo levados de tal forma de cambulhada nessa orquestração que aceitaram participar desses atos no limite da institucionalidade numa data que deveria ser para todos os brasileiros. O Brasil assiste entre a perplexidade e a apatia à construção de uma pantomima que pode, seja hoje, seja em 2 ou em 30 de outubro, nos levar a viver um levante inspirado no que apoiadores insuflados por Donald Trump promoveram em 6 de janeiro de 2021 nos Estados Unidos, com a invasão do Capitólio.” (Globo)

Tales Faria: “Os aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL) foram pegos de surpresa com o resultado da última pesquisa Ipec. Esperavam que, a essa altura da disputa eleitoral, ele se aproximasse mais do ex-presidente Lula (PT), e não ficasse 13 pontos percentuais atrás. Com isso os bolsonaristas estão divididos sobre o comportamento nas manifestações programadas para o 7 de Setembro. Os chamados bolsonaristas de raiz defendem que o tempo está se esgotando. Segundo eles, é preciso radicalizar o discurso para encher as ruas amanhã (hoje), mobilizar a militância e provocar um fato novo capaz de mudar o rumo da campanha. Já o comando da campanha e os ministros mais ligados ao presidente avaliam que a radicalização pode ter efeito contrário, afastando os eleitores mais moderados.” (UOL)

Hélio Schwartsman: “A situação de Bolsonaro é muito difícil. Apesar de ter recebido do Congresso licença para gastar várias dezenas de bilhões de reais em programas de má qualidade e grande apelo eleitoral, ele não dá sinais de reação nas pesquisas. O risco de derrota iminente e a possibilidade de, fora do cargo, ser processado e encarcerado devem estar deixando Bolsonaro nervoso. Como a atual estratégia não está dando muito certo, ele pode ver-se tentado a fazer algo diferente. E o 7 de Setembro pode ser a ocasião, o que deveria deixar todos os democratas preocupados.” (Folha)

Eliane Cantanhêde: “Bolsonaro usa o Bicentenário da Independência e o 7 de Setembro como seu último lance, ou última ofensiva, para tentar virar o jogo, ou a guerra. Ele já gastou todos os seus lances e seu arsenal sem conseguir mexer no favoritismo do ex-presidente Lula. Assim, Bolsonaro entra no ‘tudo ou nada’ e vai usar as Forças Armadas como se fossem suas e remexer terra, céu e mar para dar uma demonstração de força no 7 de Setembro, criar a sensação de vitória e alavancar uma reviravolta nas pesquisas. O ‘povo’ gosta de votar em quem vai vencer, ensinam os palacianos.” (Estadão)

Míriam Leitão: “Querida Independência. Não a posso comemorar. De novo. Como há 50 anos, no sesquicentenário. Não que eu não queira. Sou impedida pela mesma interdição. Naquele triste 1972, a data foi roubada pelos militares, que a transformaram na apologia da ditadura que nos esmagava. Agora, em plena democracia, as Forças Armadas participam novamente do roubo. Elas se prestam ao inaceitável papel de se acumpliciar com um presidente que usa a pátria e o poder armado como parte da sua propaganda eleitoral e da sua campanha antidemocrática. Assim, completa-se a sina da nossa separação. Na minha vida, terei passado por duas datas redondas, 150 e 200 anos, com o mesmo sentimento de tristeza cívica.” (Globo)

Domenico de Masi (a Jamil Chade): “A democracia não está imune ao perigo da ditadura. Para sobreviver, deve sempre lutar. E lutar pedagogicamente, por meio da formação do cidadão. E isso se faz na família, na escola, na imprensa e nas redes sociais. A imagem do Brasil no mundo era muito boa a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso. Foi ainda mais elevada no primeiro governo Lula. Se manteve elevada no segundo mandato. Começou a ser um pouco mais baixa com Dilma. E depois, com Lava Jato e durante Bolsonaro, a imagem sempre foi muito ruim. Temos de levar em conta que o Brasil, ao contrário dos EUA, sempre gozou de muito amor pelo mundo. Os americanos têm muito inimigos. O Brasil não tem nenhum inimigo. Uma operação contra as Torres Gêmeas exige um profundo ódio contra os americanos. E isso não existe contra o Brasil. O Brasil é amado. Trata-se de um dos países mais pacifistas do mundo. Em 500 anos, fez apenas uma guerra no exterior. A Itália fez um número incontável de guerras neste período. A imagem é ainda boa. Mas a imagem de seu governo é péssima. Bolsonaro é considerado em todo o mundo como um líder medíocre, com intenções ditatoriais.” (UOL)

Neste importante dia para o Brasil, em que celebramos o Bicentenário da Independência, o Conversas com o Meio é especial. Ao vivo, a partir das 19h, os editores Pedro Doria e Flávia Tavares, o cientista político Christian Lynch e a repórter especial Luciana Lima, direto de Brasília, vão comentar como foram as manifestações deste feriado nacional tão importante em ano de eleição. (YouTube)

O diplomata e ex-ministro da Defesa e das Relações Exteriores Celso Amorim disse, nesta terça-feira, que não acredita em uma tentativa de golpe com apoio das Forças Armadas, em parte pela ausência de outras forças políticas e econômicas presentes na conspiração de 1964. Em entrevista ao #MesaDoMeio, ele avaliou que o impeachment de Dilma Rousseff e a prisão do ex-presidente Lula permitiram que Bolsonaro atraísse os militares para a relação atual de poder. Para o diplomata, o Brasil poderá refazer sua imagem no exterior e reconquistar o protagonismo internacional quando cuidar de suas florestas e rever sua posição no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Por 6 votos a 1, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio de Janeiro negou registro à candidatura ao Senado do deputado Daniel Silveira (PL-RJ), condenado pelo STF por ataques à democracia e indultado pelo presidente Jair Bolsonaro, de quem é apoiador de primeira hora. Para o relator do caso, o desembargador federal Luiz Paulo da Silva Araujo Filho, o indulto presidencial anulou a pena de prisão, mas não a inelegibilidade associada à condenação. O único a divergir foi o juiz substituto Tiago Santos Silva, para quem o decreto de Bolsonaro extinguia todas as formas de punição. Na mesma sessão, mas por unanimidade, o TER-RJ negou registro ao ex-prefeito de Duque de Caxias Washington Reis (MDB), candidato a vice na chapa do governador Cláudio Castro (PL). Ele ficou inelegível ao ser condenado pelo STF por loteamento irregular e crime ambiental. Silveira e Reis ainda pode recorrer ao TSE. (g1)

Para entender como o Brasil chega a esse Bicentenário, com medo de arruaças e atos golpistas, o Meio Político ouviu o formulador de alguns dos pensamentos mais originais da ciência política contemporânea, o escritor Sérgio Abranches. Embora acredite que a ameaça de golpe hoje seja mais retórica que real, Abranches não a subestima. Mas o sociólogo está num exercício intenso de investigar o passado escravista e patriarcal, essencial para a formação da nossa nação, e analisar sua continuidade para explicar o presente. “Essa mentalidade de casa grande persiste e é espinha dorsal do Brasil”, afirma. O Meio Político chega a partir das 11h para assinantes premium. Assine!

Para ler com calma. Mais que a fundação do Brasil, o 7 de Setembro marca a “fundação do racismo brasileiro”, diz a historiadora Ynaê Lopes dos Santos. Segundo ela, a data de 200 anos atrás “diz respeito às escolhas feitas pelas oligarquias, e uma das maiores escolhas políticas foi justamente apostar na escravidão para o futuro”. (Agência Pública)

A conservadora Liz Truss, de 47 anos, assumiu ontem o cargo de primeira-ministra do Reino Unido, sucedendo o polêmico Boris Johnson e tendo de enfrentar uma carestia generalizada provocada pelo aumento no preço da energia. Eu seu primeiro discurso já na residência oficial, ela atribuiu a crise à guerra na Ucrânia. “Vou lidar com a crise de energia forjada pela guerra de Putin. Vou tomar medidas ainda esta semana para reduzir as contas de energia e garantir o abastecimento”, afirmou. “Temos grandes reservas de talento, energia e determinação, e estou confiante de que vamos sair da tempestade”, disse a premiê. (CNN)

Truss começou a montar ontem mesmo seu gabinete, e, até o momento, nenhum dos principais cargos é ocupado por um homem branco. Thérèse Coffey é a vice-premier e ministra da Saúde; Suella Braverman, filha de indianos, é a ministra o Interior; e dois homens negros, Kwasi Kwarteng e James Cleverly, são os ministros da Economia e do Exterior. (BBC)

Em seus mais de 70 anos de reinado, o mais longo na história do país, Elizabeth II nomeou 16 primeiros-ministros, de Winston Churchill, em seu segundo e último mandato, à atual Liz Truss. Na galeria de chefes de governo, uma curiosidade: apenas Thereza May aparece dobrando o joelho diante da monarca. (BBC)

Menos de seis meses depois de tomar posse, o presidente chileno Gabriel Boric promoveu ontem sua primeira reforma ministerial, premido pela derrota em referendo da Constituição elaborada por uma assembleia majoritariamente de esquerda. Cinco pastas vão trocar de mãos: Secretaria Geral da Presidência, Interior, Saúde, Energia e Ciência. A reforma marca uma aproximação com a centro-esquerda. Carolina Tohá, do Partido pela Democracia (PPD), por exemplo, assume a pasta do Interior. “É doloroso, mas seguiremos juntos pelos chilenos e chilenas”, disse o presidente. Mesmo sem estar representada no governo, a coalizão de centro-direita e direita Chile Vamos gostou da mudança e anunciou o início de conversas com Boric para um novo processo constitucional. O chile ainda é regido pela Carta Magna imposta em 1980 pelo ditador Augusto Pinochet. (La Nación)

No Ponto de Partida de segunda-feira, as lições que a derrota da Constituição inclusiva do Chile trazem para a esquerda brasileira. (YouTube)

Auxílio Brasil-sil-sil!

Marcelo Martinez

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