Edição de Sábado: O peso do Brasil no golpe do Chile

Imaginar que um estádio de futebol possa ser usado como prisão e campo de tortura a céu aberto, com execuções sumárias e corpos se amontoando, pode ser difícil para quem nunca viveu os horrores de uma ditadura. Mas é memória fresca e indelével para os chilenos que testemunharam o sanguinário golpe no dia 11 de setembro de 1973 e suas consequências nefastas. Depois da tomada do La Moneda e do suicídio de Salvador Allende, os militares, coordenados pelo general Augusto Pinochet, não se esconderam em porões para esfolar seus adversários. Fizeram isso no Estádio Nacional, lotado com mais de 40 mil presos políticos. E contaram com a ajuda inestimável do Brasil.

O jornalista e analista internacional Roberto Simon se dedicou sete anos a pesquisar, apurar e compilar informações sobre a atuação brasileira na ditadura chilena. Em 2021, publicou o livro O Brasil contra a Democracia — A ditadura, o golpe no Chile e a Guerra Fria na América do Sul. Agora, viaja a Santiago para lançar, neste sábado, a versão da obra editada especialmente para o cinquentenário do golpe. Lá, o livro ganhou novo título: El Brasil de Pinochet. A capa mostra Pinochet cumprimentando Ernesto Geisel, recém-empossado presidente militar do Brasil. Era a primeira viagem internacional do ditador chileno. Ele viera ao Brasil para ver de perto o “modelo brasileiro” em que se inspirara.

Simon desembarca no Chile quase simultaneamente a uma caravana de brasileiros que vão lá rememorar seus tempos de exílio. Ministros de Estado também devem comparecer — Flávio Dino, da Justiça, e Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, confirmaram presença nas cerimônias pelos 50 anos do golpe. "Esta é uma oportunidade única de o Brasil reconhecer sua responsabilidade na destruição da democracia chilena e enfraquecer o revisionismo histórico", diz Simon. Muito mais do que com militares, o Brasil se empenhou no golpe chileno via Itamaraty, empresariado e imprensa. E agiu por seus próprios interesses. Enxergava no experimento de socialismo democrático do Chile uma ameaça comunista. Estava errado. Confira os principais trechos da entrevista de Simon ao Meio.

O que os protagonistas do 11 de Setembro de 1973, Allende e Pinochet, revelam do contexto político daquele momento?
Allende era um animal político interessante. Ao mesmo tempo, era um democrata e um revolucionário socialista. E essa é um pouco a história do Chile e do momento da Unidade Popular (UP): pela primeira vez na história, um presidente socialista foi eleito democraticamente para mudar as bases da economia e transferir os meios de produção da iniciativa privada para o Estado — ou seja, para fazer uma revolução socialista stricto sensu. Ele fez isso ganhando uma eleição em coalizão com o Partido Comunista e numa vitória muito apertada, na qual teve pouco mais de um terço dos votos. O Chile, então, mergulhou nesse experimento inédito de fazer um socialismo democrático. E Allende encarnava as duas partes. Era um político profissional, tinha sido presidente do Senado, ministro, fez carreira dentro da “democracia burguesa”, como se dizia. Mas também era reconhecido como um veterano da luta pelo socialismo na América Latina e no mundo, foi um dos fundadores da Olas (Organização Latino-Americana de Solidariedade), entusiasta da revolução cubana, tinha ido à China, conhecido Mao Tsé-Tung, visitado a então União Soviética. O Chile, ao contrário de outros países, tinha um desenvolvimento institucional que permitia essa revolução democrática, porque tinha organização sindical, partidos de esquerda de massa. Então, poderia se fazer uma revolução “a vinho tinto e empanadas” em vez de fuzis e paredões.

Ele estava conseguindo?
Naquele contexto de Guerra Fria, imediatamente os Estados Unidos e o próprio Brasil viram o Chile como uma ameaça direta. Era a nova “Cuba do Pacífico”, eles falavam. Um país que tinha furado a divisão da Cortina de Ferro. E dentro do Chile a direita se organiza contra Allende. O experimento chileno fracassa, a economia começa a girar fora de controle, com decisões desastrosas, mas também por um boicote brutal do empresariado. Houve ainda grandes greves de caminhoneiros. O Chile chega ali em 1972, 1973 em um estado de convulsão social. E aí entra o Pinochet. Ao contrário de Brasil, Argentina e Uruguai, o Chile tinha uma tradição civil muito forte. Os militares chilenos não tinham presença na política. Havia uma tradição constitucionalista nas Forças Armadas. Tanto que em 1970 os brasileiros questionavam por que os chilenos simplesmente não davam um golpe no Allende ali. A imprensa brasileira publicava a necessidade de uma solução à la 1964 no Chile. Pinochet vinha dessa tradição hiper constitucionalista, se comparada a países da região, e era um militar não muito relevante no começo do governo da UP. Ele cresce embaixo da asa de um general, esse mais importante, que era o chefe das Forças Armadas, o general Prats, um representante da garantia de não politização, de não intervenção das Forças Armadas. Naquele momento de crise, Prats é forçado a sair do comando. E Pinochet foi subindo na hierarquia.

E se radicalizando?
Enquanto vários militares chilenos já estavam conspirando contra Allende, Pinochet ainda não estava envolvido. Ele faz essa virada logo antes do golpe. Só que é uma virada completa. No momento do golpe, ele é o mais radical entre os golpistas, querendo bombardear o La Moneda logo no começo, propondo a execução do Allende, a rendição incondicional. O momento do golpe em si foi muito violento, com bombardeio a rádios, à própria casa de Allende, ao La Moneda — aquela imagem do palácio sendo bombardeado tem um significado especial no Chile. Pinochet se torna o presidente de uma Junta Militar, formada por ele, como chefe do Exército, pelo chefe da Marinha, pelo chefe da Força Aérea e pelo chefe dos Caranabineros, a polícia nacional. Em princípio, o poder seria revezado na junta. Mas em questão de meses Pinochet consegue se estabelecer como o ditador chileno e fica claro que ele não vai sair de lá. Ele se torna a figura do anticomunismo e um símbolo da violação dos direitos humanos nas ditaduras da América do Sul.

Essa mudança de Pinochet, de legalista a sanguinário, foi inspirada pela ditadura brasileira?
A politização dos militares chilenos começou antes mesmo do Allende. Já havia uma certa mobilização dentro das Forças Armadas, estranhas a essa tradição legalista chilena. Mas quando Allende é eleito, e o livro mostra isso, há contatos de almirantes da Marinha brasileira com gente da Marinha chilena, um ou dois meses depois da posse, já falando em golpe. A Marinha se torna o primeiro foco do esforço para criar um plano para tirar o presidente. Depois, a Força Aérea. O último a entrar é o Exército — e só aí acontece o golpe, porque o Exército era o mais poderoso. Eu dividiria o papel do Brasil em duas partes. Uma delas é o tal “modelo brasileiro”. O Brasil, sob a ditadura desde 1964, estava em pleno milagre econômico em 1973. Era visto como uma “ditadura de sucesso”. Um país que havia acabado com a ameaça comunista que Jango falsamente representava, a esquerda havia sido completamente dizimada, a onda de guerrilha urbana havia acabado. Havia alguns focos guerrilheiros, tipo Araguaia, mas que não eram uma ameaça real ao poder dos militares. O Brasil com crescimento de dois dígitos, Copa do Mundo... O país de Médici representava a defesa do ocidente na América do Sul. Havia uma aliança quase natural da direita golpista chilena com a ditadura brasileira. E, no momento do golpe, na documentação do Chile, do Brasil e americana, você vê essa referência ao “modelo brasileiro”.

Qual é a segunda parte?
A do auxílio direto. O Brasil estabeleceu canais diretos com generais e outros oficiais das Forças Armadas chilenas, apoiou jornais que lançavam uma campanha ferrenha contra Allende. O Brasil coordenou um boicote regional sem precedentes contra Allende, tentando convencer outros países de que o Chile havia se tornado um grande campo de treinamento de guerrilheiros, o que era absolutamente falso. O Brasil apoiou terroristas chilenos como os do Patria y Libertad, grupo neofascista que recebeu abrigo tanto na embaixada brasileira quanto no Brasil, quando fugiram das autoridades chilenas. Quando vem o golpe, o Brasil é o primeiro país a reconhecer o Chile, antes dos Estados Unidos. Um mês e quatro dias depois, agentes da repressão brasileira estavam dentro do Estádio Nacional, com assessores dos militares chilenos que estavam torturando as pessoas — e foram rapidamente reconhecidos por brasileiros presos ali. O Brasil ofereceu auxílio financeiro e se tornou o grande advogado do Chile na ONU, mas bilateralmente também, convencendo outros países como Alemanha e Inglaterra a não isolar Pinochet, mesmo com todas as notícias de execuções sumárias e tortura, que já corriam o mundo. O Brasil se tornou o segundo maior fornecedor de armas para o regime. Dezenas de agentes da Dina, a polícia política do Pinochet, responsável por todos os campos de tortura que existiram no país, receberam treinamento da EsNI, a Escola do Serviço Nacional de Informações brasileira. Vários líderes da Dina estiveram no Brasil, alguns deles lotados na embaixada chilena como adidos culturais ou coisas do tipo, fingindo que eram civis, mas eram na verdade conexões entre as duas repressões. Foi esse apoio material fortíssimo que o Brasil de fato deu. Não foi apenas um conjunto de ideias. Foram ações concretas. O Brasil tem uma responsabilidade na destruição da democracia chilena, que nunca foi reconhecida. O cinquentenário do golpe é uma oportunidade única para isso.

Por que os militares escolheram um violento golpe como “saída” para tirar Allende do poder?
Essa é uma pergunta sem resposta. Especialmente porque hoje se sabe que Allende estava prestes a convocar um referendo sobre seu mandato, que provavelmente ele perderia, e sairia do poder. Mas aí está o ponto central. O golpe não foi contra Allende. Foi contra a democracia. Foi a noção de que, para se extinguir a ameaça comunista, era preciso extinguir a democracia e desarticular toda aquela base de esquerda dos grandes partidos de massa, das grandes centrais sindicais. Já em 1970 o embaixador brasileiro estava convencido de que a solução para o “problema chileno” não eram os partidos de direita, mas os militares. Tinha que acabar com tudo de uma vez, porque essa era a única forma de realmente se arrancar o Chile da órbita do socialismo. A questão não era o Allende, era o processo político pelo qual o Chile passou. A saída era a extinção da democracia.

Aproveitando a menção ao embaixador, qual foi o papel do Itamaraty nessa intervenção brasileira?
Com a redemocratização no Brasil, criou-se um mito, inclusive sobre o golpe no Chile, de que o Itamaraty ficou de certa forma isolado do regime de 1964. Preso aos interesses permanentes do Estado brasileiro, sem se envolver na repressão. E que o que havia acontecido no Chile talvez tivesse sido o caso de um embaixador anticomunista que estava por lá e, no momento mais extremo da ditadura, algumas pessoas da linha dura se envolveram. Mas que era uma questão de indivíduos, “casos isolados”. O que o livro mostra é o oposto. O que aconteceu no Chile foi uma política de Estado. Ia desde o gabinete do ministro das Relações Exteriores, que articulou boa parte das ações diplomáticas do Brasil diretamente com o SNI (Serviço Nacional de Informações) e os centros da repressão brasileira. Essa cadeia de comando descia até os porões do regime, onde pessoas que haviam passado pelo Chile eram torturadas. Mais que isso. O Chile era a capital dos exilados do Brasil na época, com algo entre 3 mil e 5 mil brasileiros. Segundo o embaixador americano no Chile, a comunidade brasileira era a mais organizada, tinha jornais, era muito ativa no movimento político chileno. E o Itamaraty tomou para si um papel duplo.

De que maneira?
De um lado, esse de empurrar o Chile na direção de uma intervenção militar. De outro, o de lutar contra o “inimigo interno” fora das fronteiras nacionais. Para isso, o Itamaraty tinha agências especializadas como o Ciex (Centro de Informações do Exterior) e a DSI (Divisão de Segurança e Informações). Também tinha pessoas como o cônsul chileno, que não tinha o objetivo de prestar auxílio consular. O objetivo dele era espionar exilados brasileiros e enviar essas informações para órgãos de repressão da ditadura. Pelo menos em um caso, isso produziu um morto. Não era um exercício teórico. O Itamaraty foi uma peça chave na repressão contra a oposição brasileira fora do país e no compartilhamento de informações com outros órgãos de repressão do Cone Sul. Também foi chave nessa pressão para que a posição brasileira se radicalizasse contra o Chile. O Brasil poderia ter visto o Chile não como uma ameaça existencial. Esse provavelmente era o diagnóstico mais correto. Mas dentro daquela paranoia do governo Médici, o Chile foi visto, de maneira errônea, como uma nova Cuba, na qual milhares de brasileiros receberiam treinamento de guerrilheiros.

“Casos isolados” são parte da retórica dos militares até hoje. Você acha que, com toda a documentação já levantada, é possível um reconhecimento institucional da culpa do Brasil?
Eu acho absolutamente possível. Deveria ser uma política do governo brasileiro. É fundamental que essas autoridades, tanto o ministro Flávio Dino quanto o Silvio Almeida, que vão estar nos eventos do cinquentenário, afirmem explicitamente que o Estado brasileiro teve esse papel na destruição da democracia chilena. E essa questão não passa pelos militares hoje em dia, não deveria passar. São os fatos, amplamente documentados. Qual é o risco de assumir isso? O Clube Militar no Rio soltar uma nota condenando? O ganho institucional é muito maior do que o risco. Chegou o momento, meio século é tempo demais. Essa sinalização já tem um peso político importante. Mas também, do ponto de vista dos documentos que o Brasil tem, há uma oportunidade grande em publicizar esses arquivos. Eles são públicos, mas não são facilmente acessíveis. Teoricamente, tanto no arquivo do Itamaraty quanto no Arquivo Nacional, não há nada que seja conhecido sobre violação de direitos humanos que esteja sem acesso. Aliás, a Comissão da Verdade digitalizou boa parte dos documentos. Não os documentos militares, que estão entre desaparecidos e boa parte deles nunca foi encontrada. Mas o Brasil poderia fazer uma sinalização no sentido de colocar esses documentos online ou fazer uma custódia conjunta do Arquivo Nacional com o Museu de Direitos Humanos do Chile. Autoridades chilenas ainda investigam casos de desaparecimento ou de pessoas que foram treinadas no Brasil e cometeram crimes no Chile. Reconhecer que nós fomos fundamentais na oposição ao Allende e na consolidação do regime Pinochet, e que são esses os fatos, é instrumento também para enfraquecer o revisionismo histórico, crescente no Brasil e no Chile.

Revisionismo que você testemunhou na produção do livro, não é?
Tem sido algo muito impressionante de ver. Eu comecei a escrever o livro em 2013, no governo Dilma. Era para ser mais um livro de História, protegido pelo presente democrático. Era para olhar para trás e contar aquela história. Demorei sete anos para escrever e o livro foi publicado já no governo Bolsonaro. O livro foi esse lugar de onde eu assisti à quebra de consensos históricos que existiam no Brasil. Em 2013, 2014, ninguém defendia Pinochet publicamente, ninguém falava que torturar era justificável sob algumas circunstâncias. Em 2019, temos um presidente da República brasileiro atacando o pai da presidente Michelle Bachelet, que havia sido torturado até a morte numa prisão. Temos vários políticos falando que o que aconteceu no Chile é justificável. Temos um Chicago boy, ou um Chicago oldie, batendo no peito e falando que é isso mesmo, como se você pudesse separar o experimento econômico chileno da repressão total que havia no país. Dentro desse revisionismo histórico, essa caixa de pandora que se abriu, acho que fortalecer a posição do Estado brasileiro, em defesa da verdade histórica, tem também uma consequência política importante. É uma defesa da nossa democracia também. Não é só a defesa da democracia que foi destruída no passado.

Mas esse revisionismo é possível, em parte, pela dificuldade de algumas democracias latino-americanas de punir seus ditadores. Foi o caso do Chile?
O Chile teve um processo muito diferente do Brasil. Eles montaram uma primeira Comissão da Verdade logo depois da queda do regime para estabelecer o número de mortos e torturados, compilar as informações. E note que o presidente dessa comissão foi o embaixador do Allende no Brasil, o Raúl Rettig. Mas até hoje há militares chilenos indo para cadeia pelo que fizeram na ditadura. Não houve uma anistia “ampla, geral e irrestrita”, que bloqueou a apuração de crimes, como tivemos no Brasil. Isso não quer dizer que o revisionismo chileno não esteja crescendo. Está. Uma reportagem no Globo mostrou como, especialmente entre jovens, há a percepção da ditadura como um momento de progresso econômico, de ordem social. Há outro dado interessante: perguntados quem foi responsável pelo golpe de 1973, mais chilenos dizem hoje que foi Allende do que os que culpam as Forças Armadas chilenas. Pinochet não foi punido, ele era uma figura de muito poder no Chile — tanto que, quando saiu do poder, ele continuou como chefe das Forças Armadas e senador vitalício. Mas botar gente na cadeia ajuda a esclarecer a história, sim. O próprio processo de investigação, de levantamento de informação, o aspecto criminal dos processos e o poder do Estado de investigar passa a História a limpo. Essa onda de revisionismo de extrema direita não é uma questão brasileira, chilena, ou argentina. É uma questão regional. E isso mostra como a democracia é frágil.

Em que medida esse revisionismo, e as próprias ditaduras, são habilitados por outros setores da sociedade?
Há um ecossistema revisionista. Não são só políticos. Há novos canais de comunicação que reproduzem essas ideias, organizações profissionais, empresários. Por que as pessoas embarcam nesse revisionismo? No caso brasileiro, ele é um instrumento de contestação da Nova República. O objetivo do evangelismo político é contestar as bases da Nova República, da democracia que foi construída sobre os escombros da ditadura. Dizer que os militares foram melhores, que o Brasil tinha mais segurança, crescia mais ou qualquer coisa desse tipo, é um esforço de destruir o consenso que havia de que o Brasil precisava superar aquele momento de estado de exceção, de tortura, de censura. O revisionismo é um instrumento para o enfraquecimento do regime, não algo com um fim em si próprio, um debate intelectual ou eleitoral. É uma ação política com o objetivo de colocar um regime político novo, novas bases. Como foi há 50 anos. A imprensa brasileira, o Globo, o Estadão, o Jornal do Brasil, logo no começo já começou a publicar artigos conclamando chilenos a adotarem uma solução militar no Chile. O Estadão e o Globo tinham fortes vínculos com o Mercúrio, principal jornal conservador chileno. Num dado momento, eles criam uma agência de notícias inter-americana para publicar artigos com notícias falsas contra Allende e, depois, favoráveis ao Pinochet. E hoje se sabe que o Mercúrio só se manteve de pé com financiamento da CIA.

E os empresários?
Do lado do empresariado, acontece uma coisa interessante. Logo no começo, quando os empresários chilenos começam a se organizar para fazer frente ao Allende, que estava numa onda de estatização, eles eles vêm ao Brasil e encontram no empresariado brasileiro um grande aliado. Principalmente, via Confederação Nacional de Indústrias. Por meio de sua homóloga chilena, a CNI começa a dar um apoio político fortíssimo a eles. Há uma conferência grande no Chile para ouvir empresários brasileiros sobre como eles se opuseram ao Jango. De acordo com documentos americanos, houve dinheiro de empresários e organizações empresariais brasileiras que financiaram parte desses dessa movimentação dos chilenos. É difícil dizer quanto. Mas em pelo menos um testemunho no Congresso americano um agente da CIA falou que havia esse fluxo de dinheiro e de informações. Então, a ditadura brasileira não agiu sozinha, no vácuo.

E agiu por ordem da CIA e de Richard Nixon?
A resposta é um grande não. Minha apuração contradiz duas narrativas. À direita, de que foi uma coisa de alguns anticomunistas brasileiros, um embaixador ou outro que estavam lá, e não uma política de Estado. À esquerda, confronta essa mitologia de que os “gorilas brasileiros” estavam a serviço de Washington. García Marquez, logo depois do golpe, escreve um texto dizendo que os Estados Unidos não precisavam mais mandar os marines para derrubar governos, porque o governo brasileiro podia fazer esse serviço sujo. O livro mostra que não. As razões pelas quais o Brasil interveio no Chile e passou a ver o Chile como ameaça eram estritamente brasileiras. O Brasil via o Chile como uma cabeça de ponte do comunismo internacional, como a maior ameaça externa ao regime de 1964. Com a revisão de toda a documentação e tudo que se sabe hoje em dia, não encontrei nenhum indício de que houve uma operação coordenada do Brasil com os Estados Unidos no Chile. Houve, sem dúvida nenhuma, está absolutamente documentado, contatos do próprio Médici com o Nixon. Médici informa o que está fazendo e Nixon adora o que escuta, fala algo como “vamos coordenar” e tal. Mas não há nenhum indício de que houve uma operação de inteligência conjunta para instigar um golpe no Chile. Os dois países estavam fazendo paralelamente e trocando algumas informações. O Brasil tinha agência e fez o que fez porque brasileiros tomaram essa decisão.

Apertem os cintos...

Passamos algumas semanas na Califórnia em agosto e uma cena que, apesar de recorrente, nunca deixou de nos espantar era a de carros que andavam sem ninguém dirigindo. Como se o Homem Invisível estivesse sentado no assento do motorista. Invariavelmente com uma traquitana de câmeras e outros sensores no teto, esse carros autônomos fazem parte da frota de driverless taxis que estão em circulação desde o início do ano passado. Volta e meia, víamos um com alguém dirigindo, o que nos contaram que poderia ser treinamento do sistema de navegação do veículo, ou mesmo alguém resgatando um carro que apresentou defeito.

Havíamos alugado carros em dois momentos da viagem, mas, para nos deslocar por São Francisco, optávamos mesmo por andar a pé ou recorríamos ao Uber. Uma tarde, nos alongamos um pouco passeando pelo parque The Presidio — onde ficam o Walt Disney Family Museum e a Industrial Light & Magic — e decidimos chamar um carro após o almoço para retornarmos ao Airbnb. Este ficava bem próximo, a apenas 25 minutos de caminhada, mas tínhamos um compromisso. Quando indagamos ao simpático garçom que nos atendia qual a melhor referência de endereço para informar no aplicativo, ele nos perguntou se já havíamos andando de driverless taxi, e se gostaríamos de experimentar. “Um amigo trabalha em uma das empresas e me presenteou com um pacote de viagens ilimitadas gratuitas. No último mês só tenho andado assim, e ficaria muito feliz em oferecer isso a vocês”, disse ele, e sim, havíamos deixado uma boa gorjeta. Como não era um trajeto complicado ou longo — de carro levaria pouco mais de 5 minutos —, topamos.

Como o aplicativo estava em seu celular, ele nos acompanhou até a saída para poder destrancar o carro, informando que nós três — minha esposa, Luciana, nosso filho de 13 anos e eu — teríamos de sentar no banco de trás, que o carro só daria partida se estivéssemos todos de cinto, e outras recomendações do gênero. O carro era da Cruise (leia-se General Motors), uma das duas maiores empresas de veículos autônomos atuantes na cidade. A outra é a Waymo, de propriedade da mesma holding da Google e da DeepMind, empresa britânica de pesquisas em inteligência artificial comprada pelo Google em 2014. Desde agosto, elas estão autorizadas a atuar como empresas de táxi comum, cobrando por viagens em toda a cidade, apesar da resistência de alguns setores. As frotas de ambas as empresas são inteiramente elétricas.

O carro chegou mas não estacionou exatamente em frente ao restaurante, só um pouco mais à frente, onde o sensor provavelmente indicou que havia mais espaço para encostar. Sentamos e nos cintamos. O carro era como um Chevrolet compacto, não exatamente muito confortável para três pessoas. Acoplados nas costas dos bancos da frente, dois grandes monitores touch screen — o que limitava um pouquinho mais nossos movimentos — mostravam o mapa do trajeto a ser percorrido e o botão para começar a viagem. Havia também controles de temperatura, de rádio e um botão de emergência que pararia o carro caso houvesse algum problema. “Help is just a tap away”, informava. Desde o minuto zero, a intenção parecia ser a de criar no passageiro uma sensação de controle e segurança.

Segundo a Sociedade de Engenheiros Automotivos (SAE), os níveis de automação de veículos variam de 0 (totalmente manual) a 5 (totalmente autônomo). Tanto o Waymo como o Cruise estão no nível 4, o máximo existente. Os modelos com piloto automático do tipo limited hands-free system que se encontram à venda nos Estados Unidos como carros particulares — fabricados pela Ford, General Motors e Tesla, por exemplo — estão no nível 2. (Elon Musk andou prometendo que o carro autônomo da Tesla sai esse ano, mas parece só mais uma previsão otimista do bilionário.) Nós já havíamos andado em carros neste nível e a direção automática não era nem novidade nem motivo de apreensão, mas ainda assim era um tanto fantasmagórico não haver ninguém ao volante, que girava normalmente a cada manobra. A voz que enunciou o início da viagem era feminina e tranquila. A condução do carro era suave, fazia curvas graciosamente e mal sentíamos a freada quando parava nos cruzamentos. O Cruiser obedecia a velocidade da pista, dentro do The Presidio, de 15 milhas por hora (24 km/h). O parque estava relativamente vazio, e muito provavelmente um motorista humano não seguiria isso à risca.

Ainda estávamos na área do parque, com menos de dois minutos de viagem, quando o carro pareceu perder o controle, o volante rodando rapidamente para um lado e para o outro. Aparentemente, havia um pequeno cone próximo a uma faixa de pedestres que os sensores só perceberam em cima da hora. A manobra brusca foi justamente para não bater no cone, mas nos surpreendeu. De tão rápido que foi, ficamos nos perguntando o que teria acontecido (bom, meu filho caiu na gargalhada). “Não vai ganhar cinco estrelas, motorista!”, ameaçou Luciana em direção ao volante.

“Tenho certeza que alguém está dirigindo o carro na central”, brincou ela, tentando dissipar o nervosismo. A barbeiragem teria sido o café que caiu no colo da pessoa que estava controlando o console, emendei. O resto da viagem prosseguiu sem incidentes — incluindo quando saímos do parque e entramos na cidade em si, com velocidade de 25 mph (40 km/h). Mas, uma vez que o Cruise cometeu aquele erro, foi difícil nos sentirmos inteiramente seguros novamente. Tentei ligar o rádio — havia disponíveis opções para as emissoras públicas local e nacional e playlists musicais classificadas por gênero —, mas não me acertei com o ajuste de volume antes da “voz da motorista” avisar que estávamos próximos ao nosso destino, e que deveríamos ficar de cinto até a parada total do veículo. Fomos deixados bem em frente ao endereço que havíamos fornecido.

Em retrospecto, apesar de não ter sido perfeita, a experiência foi positiva. Acredito que um motorista humano pudesse cometer o mesmo deslize diante do cone e, embora o tempo de resposta pudesse ser diferente, ele não contaria com a visão 360° simultânea de um carro autônomo. Eu não teria problemas em usar o serviço novamente para um trajeto que não fosse complicado, mesmo mais longo, mas pensaria duas vezes se soubesse que enfrentaria algum tipo de trânsito intenso e com muitas variáveis. Ou próximo a um precipício.

Coincidentemente, poucos dias depois, foi ao ar o episódio “The Future of Self Driving Car Is Here” do podcast The Journal, do Wall Street Journal, abordando justamente a situação dos carros autônomos em São Francisco. Evitando a discussão sobre perda de empregos — semelhante a que surgiu com o surgimento de empresas como Uber e Lyft (ou quando do desenvolvimento de qualquer tecnologia que ameaça um campo de trabalho existente) — ou questionando a real necessidade de mais carros nas ruas, as jornalistas Jessica Mendoza e Meghan Bobrowsky focaram o programa nas opiniões conflitantes sobre o uso de veículos autônomos no espaço urbano.

Entre os principais problemas já existentes, segundo o podcast, está o fato de os veículos autônomos não obedecerem instruções dos guardas de trânsito — por exemplo, quando há uma via interditada e estes orientam os carros a seguirem por outro caminho — ou não se afastarem a passagem de caminhões de bombeiros com a sirene ligada. Um grupo de ativistas anticarros, que são a favor do uso do transporte público e bicicletas como forma de transporte, tem colocado cones nos capôs dos carros autônomos para confundir seus sensores, obrigando-os a ficar parados. Esses sensores são responsáveis por escanear o ambiente ao redor do veículo e, não raro, têm dificuldades técnicas em distinguir pontos de luz de objetos brancos, por exemplo.

Por outro lado, há relatos de mulheres que preferem, principalmente à noite, usar um driverless taxi onde não podem ser julgadas, discriminadas ou ameaçadas.

Lembrando que a iniciativa foi estimulada pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos com uma promessa, em 2004, de US$ 1 milhão para quem construísse um veículo que atravessasse sem motorista o deserto de Nevada, Mendoza e Bobrowsky informam que outras cidades devem começar a receber o serviço em breve. O Cruise já está sendo testado em Miami, em Nashville, capital do estado do Tennessee, e em Charlotte, cidade mais populosa da Carolina do Norte. O Waymo começa a mapear as cidades texanas de Houston e Dallas. Ambas as empresas já atuam, em pequena escala ou em fase de mapeamento, em Los Angeles, em Phoenix, capital do Arizona, e em Austin, capital do Texas. São Francisco teria sido um dos principais campos de teste da tecnologia justamente pela dificuldade de se dirigir nela, que possui muitas ladeiras, ruas apertadas e tráfego em demasiado. E alguns cones.

*Bruno Porto é designer gráfico, professor e pesquisador de Histórias em Quadrinhos. Doutorando pela Tilburg University, vive em Toronto

O Carnaval dos leitores

Ao contrário do que diz o folclore, nem todos os cariocas são obcecados com Carnaval, futebol e praia. Para nós dessa ínfima minoria, um dos pontos altos do calendário é a Bienal do Livro, oficialmente patrimônio cultural da cidade e que termina amanhã com a expectativa de quebrar recordes de vendas e público. Claro, milhares de boleiros, passistas e praianos também passeiam felizes pelos pavilhões do Riocentro durante esses dez dias, mas aquilo é a Disneylândia para quem tem mais livros do que tempo para lê-los. A questão é que nada no universo é perfeito — na própria Disney é vendida uma abominação chamada corn dog, apenas como exemplo —, e a Bienal no Livro tem seus altos e baixos que não passam despercebidos ao frequentador contumaz, mas que, em sua maioria, são antes contingências do mercado editorial.

Diversidade é a palavra chave...

Uma das primeiras coisas (positivas) que saltam aos olhos do visitante é a preocupação com a diversidade, especialmente na extensa lista de autores que participam de palestras nos espaços da Bienal e nos estantes e de maratonas de autógrafos. Talvez em nenhuma edição do evento tenha havido tantas vozes não brancas e não heteronormativas contando suas histórias. O que é ainda mais relevante se lembrarmos que, em 2019, a Bienal do Livro foi alvo de censura homofóbica por parte do bispo-alcaide Marcelo Crivella, numa ação que provocou repúdio generalizado e acabou abatida no ar pela Justiça.

“O incidente de 2019 foi muito emblemático, até porque a Bienal sempre prezou pela diversidade”, disse ao Meio Bruno Henrique, gerente de marketing institucional da GL Events, que organiza a feira em parceria com o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL). Para este ano, ele conta que a organização usou um conceito de “representatividade na origem”, montando um conselho curador geral o mais amplo possível. “Tivemos a preocupação de fugir do ‘lugar de fala’. Na Bienal todos os palestrantes são livres para falar de todos os assuntos”, completa.

... mas não nos gêneros literários

A questão é que diversidade não se restringe aos aspectos sociais, especialmente num evento literário. Um primeiro olhar por vitrines e estandes nos dá a impressão de que a Bienal está dividida em três categorias: mangás (os onipresentes quadrinhos japoneses), livros religiosos e, principalmente, romances, tanto os apenas açucarados, quanto os que levam uma dose de pimenta. Há os afrorromances, os romances LGBTQIA+, os romances de fantasia, os de terror, os de época. Em comum, a glicose generosa.

A dominação geek também é ampla, muito além dos suspeitos de sempre, Comix e Panini — nos quais eu e minha filha sempre deixamos boa parcela do orçamento para a Bienal. Há estandes exclusivos para mangás, outros que incluem ainda RPGs, fantasia, terror, ficção etc. Para se ter uma ideia, identificamos pelo menos cinco estandes só de acessórios para cosplay, toy art, placas, ímãs etc. O que é preocupante se levarmos em conta que há apenas um estande, o da Luminatti, voltado exclusivamente para o outrora popular filão dos livros de fotografia.

“É comum as editoras valorizarem os fenômenos do momento”, reconhece Bruno Henrique, embora afirme que há um preocupação de oferecer um cardápio de participantes o mais variado possível. “Não temos, porém, como escolher o expositor. Várias editoras já passaram pela Bienal antes, mas não conseguiram se planejar para estar no evento, ou ainda enfrentam consequências da crise econômica.”

We só speak brasileiro

Quem também se vê pobre de opções é o leitor que gosta dos textos na língua original. A Penguin Books, que em edições anteriores já ocupou estandes monumentais abarrotados de pockets, hoje é uma estante tímida no “bairro” da Companhia das Letras. Rocco e HarperCollins querem vender suas diversas edições de Harry Potter e O Senhor dos Anéis, não badalar os livros que vêm do Reino Unido. Você também tem arrepios ao ler “Sonserina” ou “Valfenda”? Paciência.

A experiência monoglota é resultado em parte de uma ausência notável: as livrarias ou redes de varejo, que sempre ofereciam um leque maior que o das editoras. Grande expositora do passado, a Saraiva tenta a duras penas voltar ao mercado, enquanto Americanas/Submarino enfrenta a crise que é de conhecimento público. Maior vendedora de livros do Brasil, a Amazon tem um belo estande com palestras de autores, mas sem um único livro físico à venda. Tanto que, para garantir que haveria obras disponíveis de todos os palestrantes, a organização da Bienal conta com postos da Livraria Janela em frente ao Café Literário.

Sabem o que seria muito bem-vindo a uma próxima Bienal? Sebos. Não aqueles estandes de “um livro por R$ 10, três por R$ 20”, autênticos palheiros onde se busca uma agulha legível, mas livrarias oferecendo livros usados, quase sempre fora de circulação ou mesmo raros. Fica a sugestão de um “espaço vintage” para 2025.

Mas e o livro?

A Bienal, afinal de contas, é do livro, mas há poucas experiências lúdicas envolvendo essa mídia, fora o gênero infantil. Em edição anterior, a Biblioteca Nacional (outra ausência notável este ano) montou um sistema de impressão in loco para que o visitante levasse para casa algum livro raro já digitalizado de seu acervo. Nas últimas três edições vem sendo trabalhada a ideia de “transversalidade da obra literária”, espalhada por outros meios como podcasts, filmes etc. Mas o resultado ainda está mais para atrações a serem vistas, como o baile de época para Julia Bridgerton Quinn, que para experiências imersivas no objeto literário.

Minha mesa, minha vida

Uma ótima ideia foi o Beco dos Artistas (“Artists Alley”? Francamente...), uma espécie de feirinha na qual quadrinistas independente, ilustradores e artistas gráficos sem condições de bancar um estande podem expor e vender seus trabalhos. E o caso de Carlos Ruas, criador do ótimo Um Sábado Qualquer. “Nas outras edições da Bienal eu sempre pegava carona no estande de algum amigo”, ele contou ao Meio, ressaltando que a “mesa própria” lhe permitiu um contato mais direto com o público. O que, no fim das contas, é um dos aspectos mais importantes da Bienal do Livro.

O simples fato de milhares de pessoas se desabarem até o Riocentro — cujo “centro” do nome só pode ser atribuído a ironia — ao longo de uma semana para ouvir autores e comprar livros traz sempre esperança. Especialmente pela quantidade de crianças entrando e saindo dos estandes ou formando filas quilométricas para pegar um autógrafo de Thalita Rebouças, nossa principal “autora de entrada”, ou Mauricio de Souza. Estão aprendendo que ler é um prazer, e essa lição raramente é esquecida. Mas também pelos leitores de grupos marginalizados que cada vez mais se veem refletidos em títulos e escritores. Afinal, livros, todos eles, são cultura, e cultura é algo de que precisamos desesperadamente nesses tempos.

Nosso canal do YouTube já tem mais de 250 mil inscritos e o conteúdo que a gente produz lá foi o que mais atraiu os leitores esta semana:

1. YouTube: De tédio a gente não morre — E o relógio do Lula?

2. YouTube: Ponto de Partida — E se o PIB for outro?

3. Panelinha: Uma saborosa omelete recheado de cogumelos.

4. YouTube: Meio Explica — Qual é a cara do Centrão no governo Lula?

5. CNN: A lama no Burning Man.

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O liberalismo ausente

15/05/24 • 11:09

Nas primeiras semanas de 2009, o cientista político inglês Timothy Garton Ash publicou no New York Times um artigo sobre o discurso de posse de Barack Obama como presidente dos Estados Unidos. “Faltava apenas”, ele escreveu, “o nome adequado para a filosofia política que ele descrevia: liberalismo.” A palavra liberalismo, sob pesado ataque do governo Ronald Reagan duas décadas antes, passou a representar para boa parte dos americanos uma ideia de governo inchado e incapaz de operar. Na Europa continental e América Latina, segue Ash, a palavra tomou o caminho contrário, representando a ideia de um mercado desregulado em que o poder do dinheiro se impõe a um Estado fraco. Não basta, sequer, chamar a coisa só de liberal. É preciso chamá-la neoliberal. Desde final dos anos 1970, já são quarenta anos de um trabalho de redefinição forçada do que é liberalismo, uma filosofia política de três séculos e meio pela qual transitaram algumas dezenas de filósofos e economistas de primeiro time. O sentido do termo se perdeu de tal forma no debate público, que mesmo muitos dos que se dizem liberais não parecem entender que conjunto de ideias representam.

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