Meio Político

Os fios desencapados da política digital

Quem disser que imaginou a dimensão da anarquia que seria instaurada no Twitter com a gestão do bilionário Elon Musk está, possivelmente, mentindo — ao público ou a si mesmo. O que era de se antever é o fato de que a falácia da defesa da liberdade de expressão era nada mais que isso. Uma falácia. Nas poucas semanas em que teve testada sua tolerância à expressão que feria seu ego, Musk falhou miseravelmente.

Os riscos de um governo puro-sangue

O desafio que se apresenta perante o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, não é novo para ele: montar um ministério e, a partir daí, dar uma diretriz para seu governo. Ainda assim, este é também um desafio ao qual, quando apresentado a ele pela primeira vez, Lula errou muito. E, ao errar, abriu espaço para o Mensalão. Não bastasse, o problema que ele tinha de resolver em 2002 era muito menos complexo do que o que encontra em 2022.

O futuro da extrema direita brasileira

Desde a posse de Jair Bolsonaro a questão que mais atormentou a vida dos democratas brasileiros foi a da erosão da República pelos “golpes nossos de cada dia” produzidos por seu governo. Ultimamente, porém, a pergunta mudou: sobreviverá o bolsonarismo? Como será a vida política daqui por diante? Seguirá à direita altamente polarizada, intransigente, golpista, selvagem? Muitos creem que sim. Este artigo flerta com a hipótese contrária: a de que a extrema direita tende a perder relevância nos próximos anos, em razão de fatores específicos da conjuntura brasileira.

A gestação do neonazismo brasileiro

É uma conversa difícil. Dolorosa. Necessária. A imagem de um jovem de 16 anos atirando contra colegas e professores, ostentando uma suástica, no Espírito Santo, nos obriga a encarar sem constrangimento o fato de que o nazismo está em franca ascensão no Brasil. Após a derrota eleitoral de Jair Bolsonaro, mais do que isso, pode estar em estado epidêmico: descontrolado, com origem local, mas sem um ponto originário definido. Esse é o diagnóstico do historiador Michel Gherman, professor de Sociologia e História Social da UFRJ. O caldo que permitiu que o Brasil saltasse de 72 para 1.117 células nazistas entre 2015 e 2022, de acordo com monitoramento da antropóloga Adriana Dias, mistura bolsonarismo, olavismo, racismo, negacionismo histórico, ressentimento. E tudo isso gestado diante de nossos olhos explicitamente desde, pelo menos, 2002.

A lógica populista

Um líder popular, populista e ainda na presidência está fazendo a peculiar escolha de delegar a figuras fisiológicas seu papel de liderança. Tudo jogo combinado, é verdade. Mas chega a ser surpreendente descrever o bolsonarismo assim a essa altura. Na prática, Jair Bolsonaro está calado. E o movimento que criou em torno de si, populista na essência e na linguagem, pode se esfacelar diante dessa desconexão voluntária.

A derrota dos negacionistas eleitorais — nos EUA

Ontem à noite, Donald J. Trump subiu a um palco com dezenas de bandeiras americanas ao fundo e anunciou sua candidatura à presidência do país, em 2024. A expectativa, quando marcou o evento, era de que seu partido Republicano teria imposto uma pesada derrota aos democratas nas eleições de uma semana atrás. Não aconteceu. Os republicanos recuperaram a Câmara dos Deputados, mas por uma margem estreita. Os democratas continuaram no controle do Senado. E Trump, principalmente por seus ataques ao sistema eleitoral, é visto como o principal responsável pelo mau desempenho de seu grupo político.

A democracia venceu uma batalha. Mas a guerra continua

A eleição terminou e Bolsonaro foi derrotado. Mas foi longe de ser um passeio.

A Justiça de pisca-alerta ligado

Foram anos atípicos, de aberto ataque à Constituição de 1988 e ao Estado Democrático de Direito. Nesse espírito, as altas Cortes da Justiça atuaram, especialmente no período eleitoral. E, na visão de Rafael Mafei, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e autor do livro Como Remover um Presidente, foram bem sucedidas. “Teremos um trabalho pela frente de debater e discutir conceitos. Mas conseguimos ter eleições justas e limpas”, defende. Diante do “inequívoco abuso de poder político e econômico” da campanha bolsonarista, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) precisou agir de forma estratégica. Mas o Supremo Tribunal Federal (STF) já demonstrou que não vai tolerar impulsos golpistas com, no mínimo, uma conivência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), e que está disposto a seguir com seu papel de guardião da Carta.

Os perigos do descontentamento

Há um consenso — mais até, uma orientação — na forma como a imprensa deve lidar com notícias de suicídio. Deve-se, por exemplo, evitar a descrição do método e a publicação de eventuais bilhetes deixados pela vítima. Deve-se, ainda, sempre destacar que as causas para o ato são múltiplas, nunca é um “motivo” só. Por fim, é recomendável que a reportagem traga indicações de contatos para o leitor que estiver precisando de ajuda, de acompanhamento. Muito se fala de como as democracias morrem. Não há um manual, porém, que defina como tratar da tendência suicida de democracias contemporâneas. Desse impulso de alguns cidadãos de um país de, por meio do voto, eliminar o próprio processo democrático. Mas cá estamos. Às vésperas da eleição em que o Brasil vai definir o que quer ser, mais de 45% dos eleitores declaram que pretendem votar no algoz da democracia. Essa pulsão de morte freudiana pode parecer incompreensível, mas o movimento de autocratização está acontecendo em todo o planeta. Estamos embebidos nesse espírito do nosso tempo.

Que liberalismo é esse?

O liberalismo brasileiro cindiu, nesta eleição de 2022, de uma maneira como jamais havia ocorrido antes. A maior mostra deste movimento talvez seja a maneira como dirigentes do Partido Novo reagiram à declaração de voto, pelo seu fundador João Amoêdo, no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “A declaração é uma traição aos valores liberais”, escreveu Felipe D’Ávila, candidato à presidência do Novo este ano. “Amoêdo, pega o boné e vai embora.” O presidente da legenda foi no mesmo tom. “Vergonhosa, constrangedora e incoerente a declaração de voto”, afirmou Eduardo Ribeiro. Amoêdo, porém, não está sozinho. Declararam voto em Lula Pérsio Arida, Pedro Malan, Edmar Bacha, Armínio Fraga, Elena Landau, José Roberto Mendonça de Barros, Henrique Meirelles. Ao passo que inúmeros, na Faria Lima, gritam que a dupla Jair Bolsonaro-Paulo Guedes são os únicos capazes de tocar um projeto liberal no Brasil. “Hoje sou um liberal”, declarou à Veja o próprio Bolsonaro faz duas semanas.