O Meio utiliza cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar sua experiência. Ao navegar você concorda com tais termos. Saiba mais.
Assine para ter acesso básico ao site e receber a News do Meio.

O que os militares acham do golpe?

Receba as notícias mais importantes no seu e-mail

Assine agora. É grátis.

O julgamento dos golpistas não acabou. Eu sei, eu sei. Todo mundo está mexido com a declaração, pelo governador paulista Tarcísio de Freitas, de que vai conceder a graça presidencial a Bolsonaro, caso seja eleito. Gente, essa aí está muito longe. Até finais de março do ano que vem, ou seja, ainda antes de sabermos se Tarcísio vai ser candidato a presidente ou não, uma decisão muito mais importante será tomada. É o futuro dos generais Walter Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, além do almirante Almir Garnier dos Santos. Quem vai tomar a decisão? O Superior Tribunal Militar.

PUBLICIDADE

Esses caras não são quaisquer caras. Paulo Sérgio foi ministro da Defesa e comandante do Exército. Braga Netto foi ministro da Defesa. Garnier foi comandante da Marinha. E, na sua geração, Augusto Heleno foi possivelmente um dos generais mais respeitados pelos pares. Todos o consideram particularmente inteligente. Pode ser. Só tem um problema: no momento em que ocorreu o trânsito em julgado, em que o Supremo Tribunal Federal condenou estes quatro homens a uma pena superior a dois anos e não há mais recurso, um processo legal é disparado. Um processo que parece bobo, porque afinal cadeia eles todos já vão pegar, mas é um processo que pode terminar com todos, ainda no início do ano que vem, na cadeia comum.

Vamos lá. Supremo disse: condenados. Acabou. Naquele segundo, porque eles são oficiais militares, um documento é imediatamente despachado do STF para o Exército e para a Marinha comunicando que estes militares, que estes oficiais, foram condenados por um crime qualquer a mais de dois anos. Com esta informação nas mãos, as duas Armas são obrigadas por lei a encaminhar ao Superior Tribunal Militar uma representação para julgamento de perda de posto e patente. Então, ainda este ano, o STM é notificado e não tem escolha. Precisa iniciar um julgamento. Possivelmente no início do ano que vem, o tribunal sorteia um relator e, na sequência, o relator notifica os advogados de defesa de cada um dos quatro e notifica a Procuradoria-Geral da Justiça Militar.

Ali por meados de fevereiro, a PGJM deve emitir um parecer. Com este parecer, as Defesas apresentam seus argumentos. É um julgamento como em qualquer outra corte militar. Pois bem. Quais são as penas possíveis? Duas. A primeira, Incompatibilidade com o cargo. Ou seja, aquele oficial fez alguma coisa, cometeu um tipo de crime doloso que o torna impossibilitado de seguir nas Forças Armadas. Aí, acabou. A outra pena, lá dentro das Forças Armadas, é pior. É a pena de Indignidade. Ele se tornou moralmente indigno para vestir um uniforme. Cometeu um crime que demonstra sua baixa moral, um desvio ético profundo. A desonra máxima.

A consequência de ambas as condenações é a mesma. O militar perde a patente e é expulso do Exército ou da Marinha. Ele continua ganhando a aposentadoria, tá? Mas o dinheiro vai para a mulher, para a filha, aquelas coisas que militares têm. Só que, vejam bem, ele não é mais militar. Não é mais oficial. E só quem tem direito a cumprir prisão em organização militar é quem for militar, ou da ativa, ou da reserva, desde que mantendo posto e patente. Se você perde posto e patente, acabou. Perde, junto, todas as prerrogativas de carreira. A partir daí, é cela comum. O benefício que eles têm, hoje, desaparece na hora.

Se a consequência é a mesma, por que é diferente? Porque a Constituição tem uma quantidade de critérios para definir se você pode ser militar, ou não. E um destes critérios é retidão, é uma conduta moral ilibada. Então as Forças Armadas têm de prever a possibilidade de declarar que um militar é indigno da farda que veste. Quando ele é condenado por um crime, uma coisa dolosa, a pena é superior a dois anos, a Arma à qual ele pertence tem de fazer a diferenciação. Vem cá, o que aconteceu aqui? O sujeito fez algo errado, não dá mais para ser militar, mas isso não quer dizer que ele tenha perdido a capacidade moral. É mais prático, mesmo. Ou, então, ele perdeu por completo essa capacidade moral.

Quer dizer, o STM tem um de quatro caminhos. Analisa o caso e, no fim, diz que o Supremo os condenou mas isso não tem nada a ver com suas carreiras militares. Tentou dar um golpe de Estado mas, veja bem, normal isso. O que que tem um sujeito que, Constitucionalmente, tem acesso às mais poderosas armas existentes na República, pensar em usá-las contra a República? Sempre aconteceu, vai ficar de frescurinhas agora? Tudo certo, os civis condenaram porque agora eles acham que podem, mas pra gente, tudo certo.

Esta é a primeira possibilidade. Se fizerem isso, é o Superior Tribunal Militar se virando para o Supremo e para todo o Brasil com toda a clareza: a gente não vai aceitar isso. Hoje vocês estão mandando mas aguardem. Aguardem a gente. Se este cenário ocorrer, preparem-se. As Forças Armadas estão dando um recado claro de que o jogo não acabou.

E os outros três cenários?

Eu sou Pedro Doria, editor do Meio.

A partir de janeiro do ano que vem nós vamos ter uma pesquisa eleitoral. A Pesquisa Meio Ideia não vai filmar só a corrida de cavalos, quem está na frente e quem atrás. Ela vai buscar, todos os meses até o final do segundo turno, sentir o pulso do eleitor brasileiro, para onde ele se inclina, o que está buscando quando escolhe candidato x ou y. E você pode ser o primeiríssimo a receber a pesquisa, em PDF, para distribuir como quiser, para quem quiser. Sim. Primeiro mesmo, de madrugada, no segundo em que o TSE liberar. Essa pesquisa não vai primeiro para banqueiro, político ou jornalista. Vai para você. Basta ser assinante do Meio. E, veja só, esta semana, só nesta semana de Black Friday, a assinatura anual está por 120 reais. 120 e pronto, a gente só se fala em novembro do ano que vem. Você recebe tudo que o Meio Premium dá, edições especiais, streaming na TV, e mais a pesquisa eleitoral exclusiva. Não vai ter outra promoção tão cedo. É hora.

E este? Este é o Ponto de Partida.

Calma. O primeiro cenário é, de longe, o mais improvável. Compreendam o seguinte: o alto-comando do Exército, hoje, considera que é preciso o mais rápido possível deixar essa história para trás e demonstrar disciplina. E Almir Garnier dos Santos deve ser o comandante mais impopular da Marinha neste século. O sujeito sequer foi à posse do sucessor. Grosseria pura. Não é benquisto e, independentemente disso, o tom deste julgamento virá do Exército, não da Marinha.

O segundo cenário é o meio termo. Considera que os generais são incompatíveis mas não indignos. Quer dizer, perdem a patente, perdem cela especial, mas não são humilhados dentro da instituição. Essa coisa da indignidade ganha um estigma imenso nas Forças Armadas. Antigamente, tinha até uma cerimônia. O oficial superior ia lá e quebrava a espada do oficial sendo expulso, na frente dele e de todos, aí arrancava as medalhas do uniforme. Uma coisa de humilhar, mesmo.

E, vejam, a decisão é individual. Pode ser, por exemplo, que o Augusto Heleno, que teve uma pena menor, contra quem as provas são menos claras, é querido de muitos lá dentro, seja considerado só incompatível mas, o Braga Netto, que operou inclusive contra outros generais, que ameaçou gente da família de outros generais, pressionou, seja considerado indigno. Isso pode acontecer.

Porque o terceiro cenário é esse. Também o mais improvável. Ser considerado indigno, mas não incompatível. Mas vejam que maluquice seria isso, né? Tentar dar um golpe é coisa de gente de quinta, de gente vil, sem nenhuma moral. Bacana. Mas isso não o torna incompatível com ser militar. Muito, muito difícil alguém ir por aí.

Por fim, o último cenário. As duas condenações. Pelo menos para alguns deles. Incompatível com a patente e indigno. Não muda nada do ponto de vista das consequências, mas é a maior desonra possível para um militar.

Pois bem, como é que estamos. O STM é composto por quinze ministros. A presidente e mais quatro ministros são civis. O presidente da República indica, o Senado aprova. Os outros dez são militares. Quatro generais, três almirantes e três brigadeiros. Esses caras estão incrivelmente desconfortáveis. Nunca, na história do Brasil, a Corte militar expulsou oficiais de patente máxima. Pois é. Se acontecer, e possivelmente vai acontecer, será a primeira vez.

O que a gente ouve é que o alto-comando não quer que o STM salve os condenados. É o melhor para o Exército. É o que tira o Exército da imprensa, não levanta marola. A polêmica dissipa. A eleição corre em normalidade. Agora, muito difícil penetrar no STM e entender o que os ministros estão achando. Os ministros militares são sensíveis às pressões do alto-comando das Forças mas, no fim, são independentes. Votam como querem. Um resultado unânime seria ótimo mas parece quase impossível.

Então, vejam bem, se vocês achavam que esse capítulo do julgamento dos golpistas estava resolvido, não está. Agora que a Justiça comum decidiu que, sim, generais da mais alta patente tentaram derrubar a República, tem mais um capítulo aí. É o das Forças Armadas confirmarem que, sim, aconteceu. E, a partir disso, se eles consideram que tentar dar um golpe é um nojo, é feio ou não é nada demais.

Encontrou algum problema no site? Entre em contato.